Na hora de apresentar qualquer investimento para o cliente, eu faço questão de enfatizar o prazo esperado dos resultados. A renda fixa é mais estável e serve para prazos mais curtos, os fundo multimercado precisam da sua paciência por uns 3 ou 4 anos e qualquer investimento em bolsa é para lá dos 5 anos.
Isso é coerente com a teoria econômica de que investimentos de mais longo prazo compensam os riscos. E investir em ações é investir em empresas — são ciclos de mercado, erros e acertos que precisam de tempo para maturar. É uma das (poucas) coisas com as quais eu concordo com o “Mercado Financeiro”.
E como meus clientes sabem disso, me mandaram esse print:
A prova cabal de que eu estou fundamentalmente equivocada — certo? Afinal de contas, o índice Ibovespa não ganha do CDI em 10, 14, 23 nem 30 anos. Se considerar somente a partir de 2000, quando as taxas de juro se estabilizaram, o melhor investimento é (de longe) a renda fixa indexada à inflação. A bolsa brasileira mostra recuperação nos últimos 10 anos, mas mesmo assim não justifica todo o risco e o estresse.
Então isso significa que nunca deveríamos investir em ações?
Não, e o motivo é simples: o índice Ibovespa é “burro”. O número total de empresas listadas na B3 passa de 400, mas só 88 estão no índice e 5 delas representam mais de 35% do índice Ibovespa — Vale (cerca de 12,5%), Petrobrás PN (cerca de 8%), Itaú Unibanco (7%), Petrobras ON (4,3%) e Banco do Brasil (3,7%). Ao contrário do que muita gente acha, o índice da bolsa não representa a bolsa como um todo.
Levando isso em consideração, resolvi fazer minha própria pesquisa, e ao invés de usar o Ibovespa, eu selecionei quatro fundos de ações escolhidos especificamente pela quantidade de anos ativos, já que são poucos com 20 anos de histórico. E então a conversa muda bastante, como vocês podem ver na figura abaixo.
E como vocês podem ver, em todas as janelas, pelo menos um dos fundos de ações ganha do CDI, da inflação e do Ibovespa ao mesmo tempo. Em cada período acima de 10 anos, pelo menos 3 dos 4 fundos ganham do IPCA+6% (que já é um retorno excelente). E no recorte entre 2014 e 2019 — quando observamos queda acentuada dos juros e picos de inflação — é quando temos os maiores ganhos proporcionais dos fundos de ações sobre as outras categorias.
Esses resultados nos levam a algumas conclusões bastante relevantes na hora de selecionarmos nossos investimentos.
Primeiro, é muito fácil fazer recortes de tempo e produtos que comprovem seu ponto de vista. É bem fácil manipular os resultados e taxar investimentos como “bons” ou “ruins” olhando só a média ou sua experiência pessoal.
Depois, precisamos derrubar o mito de que investimentos passivos (como índices e ETFs) são sempre melhores que fundos de investimento de gestão ativa. Essa é uma ideia importada dos Estados Unidos onde a maioria esmagadora dos fundos perde para a média do mercado. Aqui no Brasil, por diversos fatores, há dezenas de bons fundos que consistentemente batem o mercado.
E por último, os números que mostrei acima reforçam que, mais importante do que escolher a categoria de investimentos, é saber selecionar os produtos dentro dela. Seria bem fácil eu montar outra tabela com quatro outros fundos de ação que perdem para todos os índices em todas as janelas temporais. A chave está em saber quais fundos usar.
E aqui está o valor de uma boa consultora financeira: conhecer e saber diferenciar os bons investimentos. A pesquisa de produtos que eu faço envolve olhar para além dos resultados do último ano e observar a estratégia de gestão, os controles de risco, o comportamento em momentos de crise. Eu converso diretamente com quem toma das decisões e procuro entender a fundo como cada um funciona.
Economia não é uma ciência exata e requer aprendizado constante — sobre os investimentos, o mercado e os clientes. Tem psicologia, vieses comportamentais e muito termo técnico bonito que não quer dizer nada. E ao contrário do que pensa a maioria das pessoas, o valor de uma boa consultoria financeira não está em entregar só mais lucro, mas também uma carteira mais alinhada com o perfil e objetivos de cliente.