Quando um observatório astronômico detectou a colisão de dois buracos negros no espaço profundo os cientistas comemoraram a confirmação da previsão feita por ninguém menos que Albert Einstein, no século passado, a respeito das chamadas ondas gravitacionais. Uma equipe de astrofísicos, no entanto, se perguntava outra coisa: o experimento poderia também encontrar a chamada “matéria escura”, a substância que comporia a maior parte da massa do Universo?

Ondasgravitacionais

A imagem acima mostra dois buracos negros apenas momentos antes de colidirem e se fundirem um ao outro, liberando energia na forma de ondas gravitacionais. Após viajar por cerca de 1,4 bilhões de anos essas ondas gravitacionais finalmente chegaram à Terra, sendo detectadas pela dupla de sensores LIGO, no dia 26 de dezembro de 2015. O evento marcou a segunda vez que os sensores LIGO – dois sistemas de detecção em formato de L, um no estado de Louisiana e outro no estado de Washington – detectaram as tais ondas, o que proporcionou mais uma confirmação da Teoria Geral da Relatividade, garantindo, assim, uma nova maneira de enxergarmos o Universo.

Oito cientistas do Departamento de Física e Astronomia Johns Hopkins Henry A. Rowland começaram a fazer cálculos já quando o Observatory Laser Interferometer (LIGO) anunciou a descoberta, em fevereiro deste ano. Seus resultados, publicados recentemente na revista Physical Review Letters, representam uma hipótese que sugere uma solução para um mistério permanente da Astrofísica.

“Nós consideramos a possibilidade de que o buraco negro binário detectado pelo LIGO pode ser uma assinatura de matéria escura”, escreveram os cientistas em seu resumo, referindo-se ao par de buracos negros como “binário”. O que se segue no resumo são cinco páginas de equações matemáticas que mostram como os pesquisadores consideraram a massa dos dois objetos detectados pelo LIGO como pontos de partida, o que sugere que estes objetos podem fazer parte da substância misteriosa especulada para compensar cerca de 85% da massa do Universo.

Uma questão de especulação científica desde os anos 1930, a matéria escura foi recentemente estudada com maior precisão, já que mais evidências que corroboram a existência da misteriosa substância foram encontradas desde a década de 1970, embora sempre de maneira indireta. Mas, enquanto a própria matéria escura ainda não foi detectada, os seus efeitos gravitacionais podem ser. Por exemplo, acredita-se na influência da matéria escura para explicar inconsistências na rotação de matéria invisível em galáxias.

A equipe do Departamento Johns Hopkins, liderada pelo pós-doutor Simeon Bird, ficou impressionada com a massa dos buracos negros detectados pelo LIGO. Suas massas são medidas em termos de múltiplos do nosso Sol. Os buracos negros que colidiram tinham respectivamente cerca de 36 e 29 massas solares.

Essas são quantias demasiadamente grandes para serem comparadas com o tamanho da maioria dos outros buracos negros estelares, as estruturas superdensas que se formam quando as estrelas colapsam. Entretanto, ao mesmo tempo, eles também são muito pequenos para serem comparados com os buracos negros supermassivos encontrados nos centros de galáxias. Os dois objetos detectados pelo LIGO, no entanto, se encaixam perfeitamente dentro do intervalo previsto para a massa dos chamados buracos negros “primordiais”.

Buraco negro estelar

Acredita-se que os buracos negros primordiais tenham se formado não de estrelas, mas a partir do colapso de grandes extensões de matéria e gás durante o nascimento do Universo. Embora sua existência ainda não tenha entrado em um consenso, buracos negros primordiais foram sugeridos no passado como possíveis soluções para o mistério da matéria escura. No entanto, como existem tão poucas evidências de sua existência, a hipótese não ganhou um grande número de seguidores entre os cientistas.

Buraco negro primordial, em concepção artística da NASA

Porém, os resultados do LIGO levantam essa perspectiva de novo, especialmente porque os objetos detectados na experiência condizem com a massa prevista para a matéria escura. Previsões feitas por cientistas no passado consideraram que as condições no nascimento do Universo teriam produzido muitos buracos negros primordiais, distribuídos de forma aproximadamente uniforme pelo Universo. Tudo isso torna esses buracos negros ótimos candidatos para a matéria escura.

A equipe do departamento Johns Hopkins calculou a frequência com que estes buracos negros primordiais iriam criar pares binários e, eventualmente, colidir. Levando em consideração o tamanho e a forma dos buracos negros binários primordiais, a equipe estimou uma taxa de colisão, que, para feliz surpresa de todos, entrou em conformidade com as conclusões do LIGO.

“Não estamos propondo que esta é a matéria escura”, diz um dos autores, Marc Kamionkowski, professor do Departamento de Física e Astronomia William Kenan Jr. “Nós não apostamos tudo nisso, apenas é um argumento plausível. Tem um grande potencial”.

Mais observações do LIGO e outras evidências seriam necessárias para apoiar a hipótese, incluindo novas detecções como a anunciada em fevereiro. Esperemos, então, boas notícias no futuro.