Parece óbvio que decisões políticas têm implicações econômicas; afinal de contas, os governos são os maiores agentes da economia, a nível nacional e global. Mas a dinâmica entre as decisões governamentais, inflação e o impacto nos seus investimentos não é tão óbvia.

Neste texto, vou responder às dúvidas mais frequentes que recebo dos meus clientes e pelo Instagram, e tentar te explicar de forma simples tudo que está acontecendo hoje (e sempre) nesse relacionamento conturbado entre política e economia.

Prontos?

O que está acontecendo agora, em dezembro de 2024?

O relacionamento entre o governo federal e o mercado já não é dos melhores desde a última eleição. Mas a situação ficou mais delicada nos últimos três meses por conta do aumento de gastos. O governo prometeu um corte no orçamento para colocar as contas em ordem, mas o mercado não ficou satisfeito com a proposta e continua vendo risco de médio prazo na inflação.

Por que as contas do governo implicam na inflação?

A inflação é o aumento de preços e pode ser causada por diversos motivos, mas um dos principais é o excesso de dinheiro circulando na economia. A dinâmica é que, se há mais dinheiro circulando, mais pessoas estão dispostas a gastar, aumentando a demanda e os preços. Como o governo federal é a entidade mais “gastadora” (simplesmente por seu tamanho), um governo que gasta demais e se endivida empurra excesso de dinheiro na economia e causa inflação.

E como faz para controlar esse aumento de preços?

O Banco Central tem a principal ferramenta de controle da inflação: a taxa de juros. Quanto maior a taxa, menos dinheiro circula. Pensa assim: com juros mais altos, as empresas e os indivíduos pegam menos dinheiro emprestado. E quem tem dinheiro em conta prefere investir (e lucrar bem) do que gastar. Mas não adianta só apertar os juros se o dinheiro continua jorrando do lado dos gastos. É Por isso, o mercado insiste tanto na redução do orçamento do governo, mesmo com o BC aumentando os juros.

Por que o mercado está tão mal-humorado com esse governo?

Por princípio e filosofia, governos de esquerda tendem a gastar mais com políticas sociais e obras. E a filosofia do mercado é sempre reduzir gastos federais. Mas, neste governo em especial, o desgaste começou antes, especificamente quando Lula prometeu acabar com o teto de gastos e implementou um sistema mais frouxo de controle da dívida pública. O fim do teto de gastos dá ao governo mais espaço de manobra (o que é bom para gastos nas áreas sociais), mas abre também espaço para o descontrole e o endividamento nacional. Recentemente, na tentativa de acalmar os ânimos, o governo anunciou um pacote de cortes nos gastos, mas isso não só não acalmou o mercado como piorou as coisas.

E por que esse pacote de gastos foi tão mal recebido?

Esse pacote foi muito antecipado, e Haddad falava em cortes substanciais, mas a proposta desidratou na fase de negociações ainda dentro do governo. Ministros pressionaram para que projetos sociais não fossem afetados, e Lula cedeu. Para piorar, o anúncio do corte de gastos veio junto com um corte de receitas: a isenção do IR para quem ganha abaixo de R$ 5 mil por mês. O mercado tinha esperança de que esse pacote tivesse um impacto considerável sobre os gastos, mas a proposta fraca foi decepcionante.

E como essa dinâmica afeta meus investimentos?

As taxas de juros e de inflação ancoram a maior parte das decisões econômicas. Todos os investimentos estão ligados, de uma forma ou de outra, a essas taxas. Conforme as expectativas flutuam com as notícias de Brasília, a marcação a mercado dos investimentos impacta seu bolso.

O que raios é essa marcação a mercado?

Marcação a mercado é atualizar o valor de um investimento com base no preço atual do mercado, refletindo quanto ele realmente vale se fosse vendido hoje. E isso muda com as notícias. Se o preço do dia for maior do que o que você pagou quando investiu, a marcação é positiva. Se for menor, o extrato acusa prejuízo. Mas essa flutuação no preço diário só vale para venda antecipada de renda fixa. Se você ficar com o CDB, LCI, LCA ou Tesouro até o vencimento, vai receber a marcação na curva, que é a taxa de juros do dia em que você comprou a renda fixa, e essa é sempre positiva.

Por que as taxas do Tesouro Direto flutuam tanto?

É reflexo dessa marcação a mercado. As taxas do Tesouro Pré e do IPCA+ refletem dois fatores: a taxa de juros futura esperada e o risco do investimento. Por isso, conforme o cenário econômico vai mudando, as taxas vão se ajustando de forma dinâmica. Quanto maior o risco e os juros, mais altas as taxas no Tesouro para compra e resultados negativos nos extratos.

E o que eu devo fazer?

Da mesma forma que esse atrito causa alguns prejuízos, outras oportunidades surgem (em especial na renda fixa). O que eu recomendaria é que você aproveite esse momento para revisar seus investimentos e avaliar quais oportunidades estão surgindo com essas mudanças e quais delas fazem sentido na sua carteira de investimentos.

Eu sei muito bem que economia não é um tema simples, muito menos quando se mistura com a política. Se eu não respondi sua dúvida (ou causei outra), deixe seu comentário aqui no post ou fale direto comigo pelo Instagram .

E não se esqueçam de apertar os cintos, porque essa montanha-russa está só começando.