E finalmente chegamos ao final de mais um ano! 2021 foi marcado por intensas batalhas no campo político e ideológico ao redor do mundo, mas no Brasil em especial também com políticas governamentais discutíveis em diversos setores.
Algumas palavras que podem ser utilizadas para definir 2021 com certeza envolverão “recuperação”, “vacinação”, “crise” e “ambiente”. Estes termos simbolizam o espírito com o qual adentramos 2021, e que esperamos de legado ao ano vindouro.
De toda forma, o campo alimentar, sem dúvida nenhuma, sofreu alguns dos impactos relativos aos eventos que se desdobraram ao longo do ano. Sejam por pressões político-econômicas, ou por pressão social; as notícias da alimentação refletiram os principais eventos científicos da recuperação pós Covid-19. Sabendo disso, permitam-me apresentá-los a cinco eventos alimentares do ano de 2021!
Como no gigantesco texto de 2020 (link aqui) pretendo detalhar os eventos por ordem cronológica! Sintam-se a vontade para informar com mais detalhes, ou mesmo passar notícias que possam ser mais interessantes. Dizem que o campo de comentários adora uma conversação bem longa! Sem mais delongas, vamos aos eventos:
1. A promessa da carne cultivada
No polêmico mercado cárneo, o mês de abril “abriu” o ano com uma notícia controversa. Um grande conglomerado do ramo bovino espera iniciar a distribuição de produtos do tipo “carne cultivada” em 2024. Dita por alguns como “carne de laboratório”, a alternativa tem sido buscada como um recurso à alimentação no futuro próximo.
O tema esbarra no ceticismo de algumas entidades, bem como na falta de regulamentação e em riscos de segurança alimentar. As células do músculo desejado são extraídas do animal, e passam por meios de cultura com promotores de crescimento e nutrientes [1]. Logo em seguida, o componente é posto em reatores biológicos que ajudarão na formação de filamentos, responsáveis pela estruturação dos tecidos. Mais detalhes podem ser bem encontrados no texto da Michelle aqui!
O produto possui o apego do baixo impacto ambiental, reforçando tendências consolidadas no mundo de buscar fontes alternativas e sustentáveis para o futuro da alimentação. Os prováveis desdobramentos são matéria de especulações bem interessantes. Como o mercado naturalista observará o consumo deste produto? Os produtores de bovinos e suínos terão que realocar a produção para outros alimentos? Sem dúvida será um tema importante para os anos vindouros!
2. A carne que vem da terra
Também em abril nós tivemos a notícia da regularização da já distribuída nas prateleiras carne vegetal. Os produtos plant-based (como salientei neste texto aqui) possuem paradigmas nutracêuticos e ambientais que prometem mexer com o mercado nos próximos meses.
O princípio da regularização é evitar que a definição e o uso do nome se torne uma terra sem lei, como por um tempo ocorreu com o pão integral. Conglomerados e ativistas naturalistas travaram debates sobre as características e princípios deste tipo de alimento.
Pelo produto ser ultraprocessado na esfera industrial, muitas pessoas consideram o impacto da carne vegetal tão grave quanto a carne suína, acarretando em críticas que merecem ser levadas para frente. Parte do problema é derivado do marketing destes produtos, que salienta o aspecto ambientalmente correto e “bom para saúde” (Evento que, como lemos no texto linkado, chamamos de greenwashing).
3. O mal estar do malware
Com o perdão pelo trocadilho no título, em junho tivemos um acontecimento inesperado. A maior distribuidora de cárneos do mundo, a JBS, fora vítima de um vírus que bloqueia o sistema até o pagamento de resgate (vírus este categorizado como ransomware), sujeitando aos gestores o pagamento de 11 milhões de dólares para a normalização das atividades [2].
Pagamentos em dinheiro do sequestro de informações fizeram parte das manchetes ao longo do ano. Apesar de a empresa pagar rapidamente para evitar vazamentos mercadológicos na internet, ataques assim revitalizam a necessidade do investimento em sistemas de tecnologia de informação nesta segunda década do século XXI.
Um dos estigmas que deverão envolver as empresas alimentícias nesta industrialização 4.0 – inclusive aquelas de alcance regional – deverá ser a cibersegurança dos sistemas informatizados. O tema deverá ser priorizado por diferentes entidades da cadeia, assim como a segurança alimentar e a biossegurança dos alimentos.
4. A volta da vaca louca
A doença da vaca louca (cientificamente conhecida como encefalopatia espongiforme bovina) causou grande apreensão em setembro. Produtores rurais de Minas Gerais e Mato Grosso relataram a presença dos sinais do príon em seus animais, acarretando em paralisação de exportações para o mercado chinês naquela época.
Existe a versão problemática da doença EEB, que causa surtos em diferentes localidades e pode levar à neurodegeneração e ao óbito; bem como a versão mais controlada, conhecida como EEB atípica. Os dois casos relatados foram exemplos da versão atípica, em que a provável causa é a idade avançada dos bovinos.
A rapidez da resposta da fiscalização agropecuária indica o temor que ainda está presente no imaginário coletivo ao redor do mundo, sendo que os riscos de reputação são extremamente impactantes na decisão de novos acordos comerciais. Eu pretendo escrever (novamente) mais sobre o assunto em breve!
5. A consolidação política do Brasil no mapa da fome
Ao longo do ano acompanhamos a cena da fome ficando cada vez mais em voga nas terras tupiniquins. Seja por meio das fileiras de pessoas para conseguir comprar osso no açougue – mais barato do que carne -; seja através da reduflação se consolidando nos produtos alimentícios (diminuição do peso, volume ou qualidade nutricional para disfarçar a inflação).
De fato a crise energética, das cadeias de suprimentos e climática são responsáveis por frear a margem de crescimento econômico mundial; porém no Brasil o problema é endossado por setores políticos, que perpetuam discursos anticlimáticos e até mesmo antidesenvolvimentistas, jogando aos votos sobre quem é o culpado pelos principais problemas, mas nunca buscando uma solução real para a crise.
Com uma margem de 19 milhões de brasileiros passando fome (9% da população), e 116 milhões em estado de insegurança alimentar, críticas aos atos do governo federal estão ganhando cada vez mais força.
Entender este cenário e a relação do brasileiro com a fome será a base para compreendermos os principais fenômenos do ano vindouro, que será marcado por pulsantes disputas eleitorais…
Considerações finais
Como pudemos acompanhar ao longo do texto, o ano de 2021 fora definido pela contradição de inovações processuais e tecnológicas no segmento de alimentos de alto valor comercial (carne), enquanto observamos o crescimento da insegurança e de problemas sanitários na população do mesmo país.
O ano que vem será importante para que tomemos de volta o papel do povo brasileiro como protagonista no cenário alimentício mundial, mas não será uma retomada fácil. Mudanças estruturais precisam ser levantadas e discutidas sobre nossos princípios agroextrativistas, bem como o papel dos agentes público-privados neste novo cenário alimentício pós-moderno.
2022 não será um ano fácil, mas estaremos aqui com vocês, fazendo a ciência ser cada vez mais divertida! Espero que todos(as) tenham um descanso bem merecido, assim como festas muito proveitosas. Em janeiro estarei de volta com vocês, já prometendo um ano bem quente nos textos aqui no portal! Até a próxima!