Não são de hoje as reclamações contra os algoritmos que norteiam nossa vida: eles controlam o que você encontra na internet e nas redes sociais, limitando nosso mundo a seu bel-prazer. Mas e se você pudesse usar a mesma tecnologia de aprendizagem e afunilamento a seu favor – para multiplicar seus investimentos? Esta é a proposta dos fundos quantitativos, (ou quant, como carinhosamente são chamados): unir tecnologia e economia para rentabilizar o seu dinheiro.
E ao contrário do que possa imaginar, este produto financeiro não é tão diferente de outros que você já pode até ter na sua carteira. Ele é um fundo de investimento com qualquer outro, que funciona em um sistema de condomínio: há uma reunião de investidores (chamados de cotistas) que depositam seu dinheiro em um fundo. Cada fundo tem um regulamento que limita o tipo de investimento que pode ser feito e o nível de risco. Estas regras devem ser seguidas pelo gestor – que é o responsável pela escolha dos investimentos que entrarão no fundo.
Qual a diferença de um fundo tradicional para um quantitativo?
Um dos principais fatores que diferencia os bons fundos (independente do tipo) é a qualidade e experiência do gestor e sua equipe, a forma como observam os movimentos da economia, se são capazes de analisar as condições de mercado e se posicionar corretamente nos investimentos. Mas em um fundo quant, o trabalho do gestor é diferente: ele traça teses de investimento mais amplas – como uma enorme previsão do que pode acontecer no mercado, mas quem efetivamente seleciona os ativos para serem comprados são modelos computacionais treinados para detectar as oportunidades.
Mas é preciso esclarecer que não é como se esses modelos e algoritmos fossem suplantar tudo que o humano faz, porque os gestores quantitativos continuam sendo responsáveis por formular as principais teses de investimento. Em todos os fundos, a equipe analisa os cenários econômicos e determina as linhas gerais, que serão detalhadas em cada investimento específico.
Nos fundos quantitativos, a construção das teses continua na mão dos seres humanos, mas antes de aplicá-las no mercado há uma testagem histórica contra extensas bases de dados (o chamado back testing). Nesse momento, o algoritmo analisa cenários econômicos passados comparáveis com o atual e verifica se a proposta de investimentos teria sido lucrativa. Caso a viabilidade da tese seja confirmada, os algoritmos são programados para reconhecer os padrões lucrativos. Para cada tese o algoritmo também recebe limitações, como preço, volatilidade, risco e outros. Caso o back testing não se mostre satisfatório, o debate volta à mesa dos gestores e o processo é repetido.
Então isso significa que um computador escolhe quais investimentos estarão na carteira?
Sim e não. Por mais que o gestor seja responsável pelo cenário amplo e pela tese de investimento, é o algoritmo que lê o mercado a cada segundo e decide qual a melhor movimento a ser feito. Ao mesmo tempo não podemos dizer que o processo todo é automatizado porque as linhas mestras e seus limites são determinados pelo gestor.
O fundo quant nada mais é do que uma sinergia entre homem e máquina, tirando o melhor dos dois mundos, e não substituindo nenhum.
Isso é positivo, porque todos nós humanos temos os chamados vieses comportamentais (para saber mais sobre isso ouça o SciCast #299) que afetam nossa tomada de decisão, e que os algoritmos não têm. Ao automatizar a compra e venda de ativos, o fundo fica imune a estes erros humanos. Outra consequência é que os fundos quant acabam ficando bem diferentes de outros produtos do mercado, criando descorrelação, o que é ótimo para uma carteira de investimentos balanceada. Já dizia sua avó para não colocar todos os ovos no mesmo cesto, não é mesmo?
Mas como qualquer investimento, eles também têm seu lado negativo: como o computador faz compras e vendas muito rápidas, é comum que percam arcos maiores de crescimento de determinado ativo em favor de movimentos mais rápidos do mercado. Os algoritmos também podem ser usados para fazer leituras de grandes bases de dados e ajudar na previsão de lucro de determinados setores ou empresas.
E por que eu deveria incluir os fundos quant?
Aqui no Brasil, os fundos multimercado e de ações tradicionais são muito lucrativos (desde que escolhamos bons gestores) e por isso não devem ser ignorados ou substituídos pelos fundos quantitativos. A solução é fazer um combo, incluindo ambos os produtos para uma carteira mais equilibrada. Quando eu preparo sugestão de investimentos para os meus clientes, normalmente incluo os dois produtos para gerar descorrelação com as tendências amplas de mercado e reduzir o risco global do portfolio. Acertar o mix de produtos é essencial para mitigação de riscos de qualquer carteira, por isso deixe o “ou” de lado e deixe os fundos quantitativos fazerem companhia aos produtos mais tradicionais na sua carteira de investimentos.