Você conhece o SUS? Mas tipo, conhece mesmo ou ele é só aquele colega distante que você dá um oi de vez em quando? Se você leu meu texto anterior aqui sabe que quero transformar você e o Sistema Único de Saúde em grandes amigos. Para isso, no penúltimo capítulo dessa série mais longa e cheia de reviravoltas que Grey’s Anatomy, vamos conversar sobre os meninos dos computadores e sua importância no SUS, na linguagem técnica: o DATASUS e seus sistemas de informação em saúde.
Como já vimos nos textos anteriores, o SUS é um sistema enorme e com serviços interligados. Então imaginem a quantidade de informações que são coletadas e precisam ser processadas e disseminadas! Para isso, em 2011, o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde, DATASUS, é incorporado a Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa através do decreto nº 7.530, de julho de 2011.E porque essa informação é importante? Em teoria, o nascimento do DATASUS iria ajudar a descentralizar as atividades, promover um melhor controle social – pela facilidade de acesso a informação – e um uso mais racional dos recursos financeiros e humanos disponíveis. Mas nem tudo são flores, então o que vemos na prática é uma quantidade absurda de dados coletada, porém ainda pouco integrada entre si, o que dificulta a realização de análises mais profundas sobre a situação de saúde no Brasil.
Ok, falei um monte e não falei o que tanto dá para encontrar por lá. Então, de modo básico, o que achamos são informações de saúde, financeiras, sistemas e aplicativos. Além disso, é o DATASUS que define e media programas de cooperação, prospecção e transferência tecnológica em saúde com instituições de pesquisa e ensino.
Nesse texto, vamos conhecer mais um pouquinho sobre os sistemas e aplicativos do DATASUS. Eles são agrupados em 11 tipos diferentes, mas calma, não vou detalhar tudo – a intenção é que vocês conheçam os serviços:
1. Cadastros Nacionais
É como se fosse a central, porque todos os programas que operacionalizam os atendimentos no SUS usam suas informações. Nele estão 3 sistemas:
– Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES): agrupa os dados de todas as instituições de saúde, sua capacidade e serviços disponíveis. Além dos estabelecimentos de saúde, os profissionais também possuem seu número de identificação.
– Sistema de Cadastramento de Usuários do SUS (CADSUS): como o próprio nome já diz, é onde os nossos dados ficam guardadinhos. Ah e através dele é emitido o Cartão Nacional de Saúde, nosso cartãozinho do SUS.
– Classificação Internacional de Doenças (CID 10): o sistema de padronização de diagnósticos criado pela Organização Mundial de Saúde, OMS, foi informatizado e pode ser consultado pelos profissionais na hora de codificar os eventos em saúde.
2. Sistemas epidemiológicos:
É um conjuntinho de aplicativos onde é possível avaliar riscos de surtos ou epidemias, controlando e prevenindo doenças.
– Estratégia SUS (e-SUS): é o antigo Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB). Nele os profissionais das equipes de Saúde da Família (eSF), Atenção Básica, Núcleo Ampliado de Saúde da Família (NASF), Consultório na Rua, Programa Saúde na Escola (PSE) e Academia da Saúde registram suas ações de trabalho, como atendimentos individuais, domiciliares e palestras, por exemplo. É a principal forma de coleta de dados do Sistema de Informação para a Atenção Básica, o SISAB.
– Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (HIPERDIA): como o nome já é bem óbvio, melhor falarmos da função, não é? Através dele eram adquiridos e distribuídos os medicamentos de uso contínuo aos usuários cadastrados. Esse foi mais um sistema integrado ao e-SUS.
– Sistema de Acompanhamento da Gestante (SISPRENATAL): possuía uma lista mínima de procedimentos necessários para um pré-natal adequado e que reduzisse os riscos de morbi-mortalidade. Com ele, era possível registrar diariamente os atendimentos às gestantes. No entanto, a partir de 2017, ele foi integrado ao e-SUS.
– Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI – PNI): com ele era possível saber como estava a situação vacinal da população por faixa etária e região; indicações, aplicações e efeitos adversos de vacinas especiais; e controle de estoque.
Falei no passado, não é? Isso porque no dia 23/09/2019, o Ministério da Saúde, através da portaria nº 2.499 extinguiu o SI-PNI. Seus dados são coletados por sistemas próprios, como o e-SUS AB, ou de terceiros, integrados ao SISAB.
– Sistema de Informações do Câncer (SISCAN): começou lá em 1999, apenas com dados sobre câncer de colo de útero (SISCOLO), e posteriormente, de mama (SISMAMA). A partir de 2011, os sistemas foram integrados no SISCAN, que agrupa, monitora e emite laudos de exames cito e histopatológicos, com cadastramento de pacientes e ainda fiscaliza a produção dos laboratórios.
3. Sistemas Ambulatoriais:
Registram os dados relativos aos atendimentos ambulatoriais e são necessários para o repasse adequado dos recursos financeiros, bem como para avaliação dos serviços prestados. Nessa categoria, só existe até agora o Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA-SUS).
4. Sistemas de Regulação em Saúde:
Os nomes ajudam bastante a entender o que cada coisa faz, não é? Aqui não vai ser diferente. O funcionamento deles é voltado a regular, otimizar e avaliar o uso dos recursos voltados a hospitais e procedimentos de alta complexidade.
– e-SUS SAMU: funciona de um jeito bem parecido com o e-SUS AB, com a diferença de ser voltado para o uso do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).
– Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (RedomeNet): recebe dados dos doadores, incluindo os exames preliminares feitos pelos laboratórios credenciados e agrupa os resultados das análises de compatibilidade para futuros transplantes.
– Sistema Nacional de Transplantes (SNT): gerencia todo o processo de transplantes, desde a lista de espera, passando pelo cadastro dos doadores (vivos ou falecidos) e distribuição dos órgãos nas Centrais Estaduais de Transplantes.
– Sistema do Programa Nacional de Avaliação de Serviços de Saúde (SIPNASS): já sabemos que ele coleta e guarda avaliações, mas de quais tipos? Auto avaliações, avaliações técnicas dos gestores, pesquisas de satisfação dos usuários, pesquisas sobre o ambiente – técnico e relacional – de trabalho, além de indicadores de saúde. Esses dados podem ser consultados pelos gestores municipais e estaduais para o planejamento de ações e distribuição de recursos.
– Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC): com esse sistema é possível verificar a disponibilidade de serviços de alta complexidade e, quando necessário, promover a migração interestadual de pacientes cujos estados não consigam prover adequadamente os serviços.
– Sistema de Centrais de Regulação (SISREG): controla e regula recursos especializados de hospitais e ambulatórios nos níveis municipais, estaduais e regionais. É integrado ao Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA) e ao Sistema Informações Hospitalares (SIH).
5. Sistemas Sociais:
São um conjunto de aplicativos utilizados na assistência a beneficiários de programas sociais do Governo Federal. Uma curiosidade desse grupo é que além dos aplicativos próprios, eles utilizam dados específicos de outros sistemas – como o SIAB, SISVAN, SI-PNI, SISPRENATAL – para monitoramento de sua efetividade.
– Programa de Volta para Casa (PVC): não sei se vocês conhecem, mas essa iniciativa busca reintegrar ao convívio social pessoas com transtornos mentais que passaram por internações de longa duração (2 anos ou mais) em hospitais psiquiátricos. Daí entra o papel desse sistema, de cadastrar os indivíduos egressos desses hospitais do SUS, gerar a folha de pagamento dos auxílios e fazer o acompanhamento desses pacientes. Existem uma série de critérios para participação, e se você ficou curioso para saber mais, comenta aí embaixo.
– Bolsa Família: acompanha as famílias beneficiárias, armazena dados sobre o cumprimento das condições para permanência no programa e acompanhamento nutricional – nesse caso, usando o Sistema de Vigilância Nutricional, SISVAN.
6. Sistemas Financeiros:
O nome já diz, não é? São eles que controlam e regulam o dinheiro que circula no SUS.
– Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Saúde (SIOPS): faz o “livro-caixa” do SUS. Lá os gestores declaram quanto entrou e saiu de dinheiro, precisando estar tudo conforme a codificação prevista pela Secretaria do Tesouro Nacional.
– Sistema de Gestão de Informações Financeiras do SUS (SGIF): diferente do anterior, que registrava entradas e saídas de verba, esse sistema controla apenas os gastos com ações e serviços de saúde, emitindo relatórios financeiros como demonstrativos de imposto de renda e envio de informações à Previdência Social, por exemplo.
– Sistema de Gerenciamento Financeiro (SISGERF): consolida os dados sobre os repasses de verba da União para os estados e municípios, aos hospitais universitários e para pagamento de ações judiciais.
7. Sistemas de Gestão:
São fundamentais para formular o relatório de gestão do SUS, que além de comprovar o investimento dos recursos recebidos, exibe os resultados e auxilia na elaboração do planejamento do ano seguinte.
– Sistema de Apoio à Construção do Relatório de Gestão (SARGSUS): o relatório é a principal forma de acompanhar como está a gestão do SUS nos municípios, estados, Distrito Federal e União.
– Sistema de Gestão de Projetos do DATASUS (REDMINE): gerencia demandas, projetos e contratos do DATASUS.
8. Sistemas Hospitalares:
Como o nome já diz, são aplicativos relativos a prestação de serviços hospitalares diversos.
– e-SUS Hospitalar: funciona de modo semelhante ao e-SUS AB e o e-SUS SAMU. É um passo para implantação de prontuários eletrônicos.
– Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIHSUS): foi o primeiro sistema do DATASUS com captação de dados por computador. Ele registra todos os atendimentos relacionados a internações para que a os gestores façam o pagamento dos estabelecimentos de saúde.
– Sistema de Gerenciamento em Serviços de Hemoterapia (HEMOVIDA): lembram do SNT? Então, esse funciona de um jeito bem parecido, mas coordenando os serviços dos bancos de sangue.
– Sistema de Informações Hospitalares Descentralizado (SIHD): voltado às Secretarias Municipais e Estaduais de saúde, foi pensado para facilitar a captação de recursos e o controle dos gastos com os procedimentos hospitalares.
– Sistema de Gerenciamento e Produção de Bancos de Leite Humano (BLHWeb): coordena o cadastro dos usuários, gerencia a produção, armazenamento, distribuição e processamento de leite humano.
– Sistema de Comunicação de Informação Hospitalar e Ambulatorial (CIHA): é compartilhado pelo Ministério da Saúde e pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Com ele é possível ter informações sobre as internações em todos os hospitais do país, sejam eles públicos ou privados, o que torna essa ferramenta bem útil para fiscalizar as operadoras dos planos de saúde.
9. Sistemas Estruturantes:
Possuem serviços voltados a estruturar as informações de todos os sistemas, transmitindo-as entre si, o que permite que sistemas diferentes consigam utilizar os mesmos dados. Atualmente é composto apenas pelo Sistema de Controle de Envio de Lotes (SISNET) e outros serviços que não chegam a configurar um sistema próprio, como o FormSUS.
10. Sistemas de Eventos Vitais:
Nesse caso o nome já nos ajuda bastante, não é? Basicamente esse grupo é composto por dois sistemas que registram informações relativas aos nascimentos e falecimentos.
-Sistema de Informações de Mortalidade (SIM): a partir dele é possível produzir análises diversas, incluindo as causas de morte, indicadores de saúde e estatísticas epidemiológicas, auxiliar no planejamento das ações no âmbito do SUS, além de emitir documentos – como a Declaração de Óbito informatizada.
– Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC): além da Declaração de Nascimento informatizada, através desse sistema é possível saber as principais ocorrências relacionadas aos nascimentos, o que permite um melhor planejamento e avaliação das ações voltadas à saúde da mulher e da criança.
11. Sistema de Apoio às Conferências (Sisconferência):
Não se enquadra em nenhuma das outras categorias, mas basicamente é um aplicativo desenvolvido pelo DATASUS para consolidar e agilizar a votação de propostas debatidas nas Conferências de Saúde nos âmbitos estaduais e federal, bem como a produção dos relatórios finais das reuniões. Ele foi pensado em 3 módulos, cujo acesso é restrito e depende de cadastro prévio: administrativo, credenciamento e relatoria.
Porque eu preciso saber disso?
A resposta é mais simples do que você imagina. Lembram do controle social da saúde, que falei lá no primeiro texto dessa série? Então, para conseguir fiscalizar e avaliar o SUS, a gente precisa conhecer suas funcionalidades e obter estatísticas sobre seu funcionamento.
Vale o recado: você financia isso tudo, seu suado dinheirinho paga por todos esses serviços e nada mais justo do que você opinar sobre eles, não é? Mais que isso, você pode expor as dificuldades e demandas da sua região, ajudar no planejamento da saúde – através dos Conselhos e Conferências –, ou fazer elogios, críticas e sugestões na Ouvidoria do SUS – no confortinho da sua casa, olha que moleza!
E aí, você já pode dizer que conhece o SUS? É isso que vamos descobrir no próximo – e último – texto dessa série. Espero vocês lá!
REFERÊNCIAS (para ler, é só clicar no link):