Em uma perspectiva artística, no mundo das artes existem inúmeras manifestações culturais que unidas enriquecem os seres humanos com obras que podem suscitar discussões ou revolta. Há ainda as mais belas, que exaltam o amor e as relações interpessoais. Porém, poucas pessoas conseguem construir uma obra que seja atemporal, que resista a força do tempo, e que continue relevante décadas depois da morte de seu autor.
O carioca Vinicius de Moraes nasceu no bairro da Gávea no Rio de Janeiro, mesmo bairro onde, muitos anos depois, veio a perecer. Depois de um banho de banheira, encerrou sua existência física no nosso mundo, para ser colocado no panteão dos grandes nomes que foram verdadeiros gênios em suas áreas de conhecimento.
No ano de 2020 completaram-se 40 anos da morte de Vinicius de Moares, que ainda segue sendo uma das pessoas mais importantes para a literatura brasileira, com seus poemas, sonetos e músicas que embalaram inúmeras paixões e também, porque não, desilusões amorosas e existenciais. Porém ele ainda é lembrado e exaltado, com sua obra sendo editada e publicada até os dias atuais, o que culmina na leitura e breve análise que passarei a apresentar agora.
É necessário antes confessar que, quando solicitado que eu fizesse a leitura e a resenha desse livro, me vi um pouco aflito, pois para mim é uma grande responsabilidade ler e emitir opiniões sobre a obra de um gigante, mas, por já ser um leitor assíduo das palavras do nosso querido boêmio diplomata, aceitei o desafio e sigo com as minhas impressões sobre o volume.
Escolho as palavras com cuidado para escrever essa resenha, e, ao ler as linhas dessa bela edição, que foi cedida pela Companhia das Letras para o Portal Deviante, em mais um ano de parceria, sinto que tenho acesso não apenas a um livro, mas sim a uma experiência literária completa. Os sonetos de Vinicius têm uma qualidade curiosa, pois, ao mesmo tempo que respeitam uma rigorosa estrutura, se aventuram em conceitos e a ressignificação de temas já muito explorados pela literatura.
Quase posso ouvir, quando pulo de soneto a soneto, a voz de Vinícius lendo cada texto para mim, com a cadência e o carisma pelo qual ficou conhecido na história, onde ocupa um lugar permanente. Eternamente nosso “poetinha camarada”, o diminutivo era usado apenas no modo carinhoso pelo qual as pessoas se referiam a ele, mas nunca relacionado à sua grandiosa obra, que apenas se engrandece conforme o tempo passa.
É preciso ainda necessariamente ressaltar que a Companhia das Letras editou diversos livros de Vinicius, os quais particularmente eu mesmo possuo a maioria, com um cuidado impecável. Suas edições são belas, convidativas e certamente elevam o conjunto da obra, enchendo os olhos não apenas de quem faz a leitura, mas de quem olha para as artes e designs cuidadosamente planejados.
Nesse sentido o Livro de Sonetos, que, importante lembrar, tem a organização e apresentação do poeta brasileiro Eucanaâ Ferraz, é uma obra para se navegar a lugares distantes, sem a pressa e a loucura dos nossos dias apressados. É um livro para ser deixado na mesa da sala e ser explorado, com seu sumário organizado em uma perspectiva de tempo que remonta décadas de produção literária, mostrando como o mundo e também as pessoas mudaram, no decorrer do tempo.
Pode-se dizer também que essa edição conta com os sonetos mais marcantes de Vinicius, como o Soneto de Despedida, o Soneto do Amor Maior e muitos outros que fazem parte da vasta obra do autor. Eles representam com exatidão o porquê da importância de Vinicius a nossa literatura, pois além de belos têm um conteúdo impressionante.
Também é importante ressaltar a presença do soneto de fidelidade, uma das maiores obras literárias que podem ser lidas na atualidade, em que Vinicius nos deleita com a marcante frase “que não seja imortal, porque é chama, mas que seja infinito enquanto dure”. Esses sonetos foram destacados para dar um gosto do que o leitor irá encontrar, mas certamente é impossível fazer escolhas no meio de tantos trabalhos extraordinários.
Esse é um livro para ser saboreado e com isso deixo aqui um desafio ao leitor dessa humilde resenha: abra qualquer página e leia o soneto que for sorteado. Certamente terá alguma mensagem e tocará cada pessoa de uma maneira diferente.
Por fim, depois de todos os sonetos serem apresentados, o jornalista Otto Lara Resende faz uma interessante análise da obra de Vinicius. Análise essa que foi publicada no lançamento da versão antiga desta obra, no ano de 1967.
Ainda, para brindar o leitor com informações relevantes sobre o autor, na parte final do livro, temos uma interessante cronologia com um resumo muito competente de toda vida do autor, desde o seu nascimento até o seu derradeiro dia de morte. Isso se apresenta como um bônus esclarecedor para conhecermos ainda mais o autor dos belos sonetos que foram lidos anteriormente.
O livro de sonetos é um convite para se perder nesse turbilhão de beleza, se perder em grandes leituras que engrandecem a alma e nos fazem ter a esperança de um mundo melhor. Um se perder para se encontrar, com a escrita fluida que representa tanta emoção, toda concentrada nesse volume tão especial e que deve ser lido com atenção, pois nos sonetos podemos ver um pouco de nós mesmos expressados por uma grande pessoa, que entendia sobretudo da alma humana.
Com isso podemos concluir, Vinicius, que “se todos fossem iguais a você” respiraríamos mais sonetos e a vida seria mais lúdica e poética, porém, isso não é possível, então temos obras como essa que podem nos dar o vislumbre do pensamento de um gênio. O pensamento de alguém que amou, sofreu, cantou e bebeu por inúmeros bares da vida, mas nunca deixou de encantar toda uma geração com sua capacidade de transformar letras em belos sonetos, músicas e poesia.