Estou perto de acabar a primeira temporada de Perdidos no Espaço (Lost in Space) da Netflix. Estou amando. Lembrei da primeira série de TV (sim, eu sou velho) e do longa metragem (bem mais parecido com a série atual). Vale a pena conversar sobre esta ideia que deu tão certo e que valeu dois remakes.
A série original tem clara inspiração na novela Família Robinson Suíça (Johann David Wyss, 1812) que, por sua vez, tem influência óbvia de Robinson Crusoé (Daniel Defoe, 1719). Com o advento da era espacial, a histórias de náufragos em ilhas desertas e distantes tomaram cores de planetas em sistema estelares longínquos. Os perigos e necessidades que uma família enfrenta num ambiente hostil para sobreviver ganha dimensões planetárias. Essa fórmula de sucesso rendeu sempre boas histórias.
A série de TV de 1965 foi obra do famoso Irwin Allen (1916-91) criador de séries icónicas como Viagem ao Fundo do Mar (1964-1968), O Túnel do Tempo (1966-1967), Terra de Gigantes (1968-1970) e A Família Robinson (1975-1976). Lost in Space teve influência do filme O Planeta Proibido (1956) e teve 3 temporadas até 1968, a primeira em P&B. A ideia inicial era fazer um drama de aventura de ficção científica mas acabou virando algo mais pra uma comédia; graças ao ator Jonathan Harris e seu Dr. Smith preguiçoso e choramingão.
“Oh, dor!… Oh, dor!” (Dr. Smith de Jonathan Harris em 1968)
Ainda antes do remake da Netflix, o cinema retratou a família Robinson em 1998 . Aquele Perdidos no Espaço tinha uma pegada mais próxima do nosso dias sombrios e mais distantes da de uma família bem comportada dos anos sessenta. Era inevitável trazer a série original em uma linguagem mais próxima da atual: problemas de família, atentados e muito mais maldade por conta de um Dr. Smith de tirar o fôlego.
“O mal conhece o mal” (Dr. Smith de Gary Oldman em 1998)
A Nave: uma Jupiter 2 entre dezenas
Numa época em que disco voador é sinônimo de nave espacial, a Jupiter 2 da série de TV era um bom exemplo de layout liso e limpo da NASA. A nave toma contornos mais arrojados no filme de 2004. A Netflix traz agora uma versão em que perde o lugar de única nave para fazer parte de um conjunto de naves auxiliares acopladas a uma nave-mãe chamada Resolute. Pelo que parece, só a Resolute permite viagens a distâncias de anos-luz.
A tripulação: Os Robinsons
A família Robinson da Netflix (e do filme de 2004) tem problemas sérios de convivência: muito mais parecida com as famílias pós-modernas. Por outro lado, personagens antes secundários ganham relevo e nuances. Um destaque muito especial ao papel de liderança marcante para as mulheres da família. A Judy, médica do grupo, é uma jovem negra numa família de ruivos. Mais um ponto para a representatividade que a antiga série de TV ficou devendo a Star Trek.
Com menos ciência fictícia (teletransporte, phasers e mágicas tecnológicas) e muita ciência de verdade (impressoras 3D, mecânica celeste, hidrostática, química orgânica e inorgânica), as histórias se tornam mais interessantes. Exemplos: usar balões de hélio como sonda e formas de escape (estou me segurando para não dar spoilers). Ou usar minerais para solucionar problemas variados de formas inusitadas. A ciência de Perdidos no Espaço não me decepcionou.
Dr. ou Dra. Smith, Tanto faz
Eu nem acredito que em pleno século 21 tem fã xarope reclamando porque trocaram o sexo do personagem vilão da história. Da mesma maneira que o filme não repetiu a fórmula da antiga série, a nova série fez do(a) Smith um vilão ainda mais perigoso e odioso. Mas uma coisa é comum nas três versões: Smith faz um jogo com Wil e o Robô manipulando o garoto para tirar vantagens da máquina inteligente. O vilão sensacional do premiado Gary Oldman está em boas mãos com a psicopata interpretada por Parker Posey. Ambos dão medo, parecem cobras venenosas ou animais enjaulados no meio de um bando de cordeirinhos. Excelente espaço pra conflitos e suspense.
“Não tema. Com Smith, não há problema”
O Robô e O Menino
Outra fórmula constante nas três versões da história é a relação de Will Robinson (menino prodígio e filho carente) e o Robô (máquina inteligente e poderosa). Meu filho de três anos viu e já queria ter um amigo robô. Quem não queria? Mais ainda, SER um robô (vide animes variados com Astro Boy e Robô Gigante). A distância entre o menino e o pai é ocupada ora pelo Robô (anjinho sobre o ombro direito), ora pelo Smith (diabinho sobre o ombro esquerdo). Numa mistura de Grilo Falante com super herói japonês, o robô é um personagem vital. Ao mesmo tempo que ele é fiel ao Will, é usado por Smith para ferrar com os planos da família mais perdida do Universo.
“Perigo, Will Robinson! Perigo!”