Se você é millenial que nem eu, já deve ter ouvido (ou lido) alguma frase sobre os terríveis efeitos de colocar expectativas em algo. Uma clássica falava sobre criar galinhas em vez de expectativas, porque, se tudo desse errado, ainda era possível ter ovos. Mas por que toda uma geração (ou parte considerável dela) tem tanto medo da expectativa?

Talvez você esteja achando exagero falar de medo, mas esse é o termo exato, carregando ainda uma certa repulsa e desdém com relação a quem se comporta de modo a criar expectativas. Basta gastar alguns minutinhos na timeline de alguma rede social que verá o quanto alguém pode ser achincalhado simplesmente por ter esperado algo de outros.

Para entender um fenômeno, geralmente partimos do significado de seu nome, então vamos lá. De acordo com o dicionário Michaelis, expectativa é a

  1. Situação de quem espera um acontecimento em tempo anunciado ou conhecido.

  2. Esperança baseada em supostos direitos, probabilidades ou promessas.

  3. Estado de quem espera um bem que se deseja e cuja realização se julga provável.

Todos os significados tem em comum um fator: a espera. Ter expectativa nada mais é do que esperar e para algumas pessoas isso pode ser bastante angustiante pela incerteza do resultado. Isso te lembrou alguma coisa?

A expectativa é irmã da ansiedade

Calma, não precisa sair correndo da página. Me deixa explicar melhor! Assim como irmãos podem ter comportamento parecido, mas não igual, com a ansiedade e expectativa é do mesmo jeito: tem suas semelhanças, mas não são idênticas.

Quando estamos falando de expectativas, muitas vezes nos referimos a algo concreto ou conhecido (pelo menos em partes). A gente costuma ter pelo menos uma ideia vaga do que queremos ou esperamos que aconteça baseados em situações anteriores em que tivemos um resultado parecido.

Mas o negócio pode ir além, e quando já tivemos muitas experiências positivas com expectativas que se transformaram em realidade, podemos até fantasiar com o assunto, criar todo um roteiro mental e geralmente é daí que vem a frustração: de quando a vida não segue o script que a gente preparou.

Já no caso da ansiedade a coisa é um pouquinho mais nebulosa e o conceito é apresentado como “a expectativa do medo”. Basicamente, quando relatamos ansiedade estamos nos referindo a um conjunto de respostas psicológicas e fisiológicas perante a possibilidade de algo desconhecido que pode ser ameaçador (mas que você ainda não sabe, porque é desconhecido, dã!)

E quanto mais diferente das suas vivências anteriores seja essa situação, maior a ansiedade que ela desperta, porque você não faz a menor ideia do resultado que aquilo pode ter e muito menos de como poderá lidar com isso.

Assim, percebemos então que na expectativa a gente espera por algo conhecido (e geralmente positivo), enquanto na ansiedade a gente espera por algo desconhecido e incerto, potencialmente ameaçador.

Isso significa que a ansiedade é a vilã (ou a gêmea má), enquanto a expectativa é a mocinha? Não mesmo! Tudo tem sua função…

Por que ficamos ansiosos?

Para responder à pergunta que dá o título dessa sessão, é importante entender o que é a ansiedade e como ela se mantém no nosso comportamento mesmo sendo (aparentemente) tão desadaptativa.

Lembram que um pouquinho antes eu falei que ansiedade era uma espécie de expectativa do medo? Pois é. Ela é um conjunto de respostas fisiológicas e comportamentais que servem para sinalizar cenários de incerteza e te deixar pronto para qualquer possível ameaça ambiental.

Perceba que quando estamos ansiosos nos tornamos mais vigilantes e atentos a detalhes, o coração fica disparado quase pronto para correr uma maratona, as mãos ficam geladas e o sangue “foge” para nossas vísceras, além de traçarmos milhões de planos diferentes para as mais variadas situações imagináveis.

Falando dessa forma, é possível até hipotetizar que pessoas dos tempos das cavernas que eram mais ansiosas tinham maiores chances de sobreviver a predadores por estarem mais atentas e possivelmente mais preparadas em caso de ataques. E vocês sabem que quem se adapta ao ambiente gera mais descendentes e acabam passando certos comportamentos adiante porque estes foram úteis para a sobrevivência.

Mas se engana quem acha que as vantagens da ansiedade acabaram quando entramos na Idade Moderna. Apesar de hoje em dia nossas ameaças serem diferentes, elas continuam sendo ameaças à sobrevivência de maneira direta ou indireta, por exemplo, quando alguém perde um processo seletivo porque não se preparou o suficiente (mesmo tendo perfil para a vaga).

Aqui vemos a principal funcionalidade da ansiedade: apontar a nossa necessidade de preparação. E essa necessidade vai ser maior de acordo com a relevância que aquele objetivo tem para cada um. Quanto mais importante, mais ansiedade e a redução disso – em cenários não patológicos – vem perante o quão bem você se preparou.

Já ouviu falar que “quem sabe o que planta não teme a colheita”? Apesar da frase clichê, nesse caso ela se aplica bem a quem evita criar expectativas. Não querer esperar por algo nada mais é do que um comportamento de fuga da ansiedade, e a ansiedade aparece quando há um cenário de incertezas, então…

A pessoa que foge das expectativas evita o sofrimento e a frustração de não conseguir algo ao mesmo tempo que não aprende a observar seu contexto de forma realista, saber se preparar e, pasme, atingir suas expectativas.

Viver um estilo de vida baseado na evitação de um possível sofrimento impede a frustração, mas impede também o aprendizado de estratégias, prendendo o indivíduo em um ciclo de medo de novas experiências.

Por que criar expectativas?

Se você chegou até aqui, provavelmente está mais aberto à ideia de que expectativas não são tão vilãs assim… A questão é que elas podem se tornar bem prejudiciais quando mal dosadas ou completamente fora da realidade.

Não é que você não possa sonhar, mas talvez cultivar expectativas mais realistas ajude a trazer mais satisfação emocional e ainda sirva de pontapé para modificar seu ambiente de modo a fazê-lo mais propício para alcançar suas expectativas.

Toda vez que criamos uma expectativa alta e sem observar realisticamente nosso contexto, estamos fazendo uma armadilha de frustração. Quanto mais essa cena se repete, mais vamos achando que o problema é CRIAR as expectativas e não a FALTA DE OBSERVAÇÃO do contexto.

Com o passar do tempo, as expectativas vão se tornando vilãs, a gente vai ficando mais cínico e muitas vezes conformado, confundindo isso com aceitação e desistindo de esperar – e correr atrás – de algumas realizações por puro medo de se frustrar novamente.

No final das contas, a aceitação tem a ver com olhar o seu contexto, vendo o que de real há nele e o que pode ser feito com os recursos – materiais e emocionais – que se tem. É olhar para uma prova concorrida e pensar em formas de otimizar os estudos, é olhar para um cenário de solidão e pensar quais locais podem ajudar a fazer amizades com os mesmos interesses que os seus, é entender que expectativas nos ajudam a manter não apenas a esperança como também a persistência por saber que se está no caminho certo para a realização de algo que é importante para você. Criar expectativas te ajuda a não desistir no caminho por mais longo que ele seja.

 

REFERÊNCIAS

ALVES, Larissa Carvalho; SILVA, Adriano Victor Lopes da; OLIVEIRA, Erika Maria Jamir de. Motivação e Recompensas: uma investigação com base nas Teorias da Hierarquia das Necessidades e da Expectativa. ID on line. Revista de psicologia, [S.l.], v. 11, n. 35, p. 325-340, maio 2017. ISSN 1981-1179. Disponível aqui.

BUENO, JOSÉ LINO OLIVEIRA; JUDICE-DAHER, DANIELLE MARCILIO; TAVARES, TATIANE FERREIRA. Neurobiologia dos efeitos de expectativa e omissão de reforço sobre o comportamento. Av. Psicol. Latinoam.,  Bogotá ,  v. 31, n. 1, p. 181-191,  abril.  2013 .Disponível aqui

PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. 12ª ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2013.