Em 30/03/2020 em meio à crise pandêmica mundial do coronavírus e de 2 semanas confusas no Brasil sobre como nossa liderança entende e vai combater o problema, o tradicional programa de entrevistas Roda Viva entrevistou Atila Iamarino (toca a musiquinha do Nerdologia DJ!), um Biólogo, pesquisador, virologista com sólido currículo acadêmico e figura já bem conhecida na internet pelo canal Nerdologia e suas participações em podcasts.
A entrevista do Atila em rede aberta nacional empolgou as pessoas e atingiu um público maior que o esperado, tanto que o programa estendeu sua duração por 10 minutos.
Muitas observações sobre esse evento e a pessoa do entrevistado são dignas de nota além da serventia pública de um especialista preparado e coerente falando sobre um assunto relevante no momento.
Atila tem uma didática impecável para alguém com uma formação tão específica e fez questão de se atentar a todo momento a fatos e dados. Seu conhecimento bem lapidado e encapsulado em uma pílula de fácil absorção trouxe até as pessoas menos crédulas uma luz de esclarecimento.
Mas algo especialmente importante sobre ciência aconteceu ontem que eu gostaria de chamar atenção e pelo qual eu gostaria de convocar todos os envolvidos, amantes da ciência e pessoas de bom senso a lutar:
Atila falou do que sabe.
Em tempos de obscurantismo, de pseudociência e meias verdades, Atila vem como o atleta que porta a tocha na abertura dos jogos olímpicos, mas nessa analogia a tocha é o método cientifico.
Falar do que se sabe é uma forma popularesca que estou me apropriando para dizer que a ciência fala sobre o que pode ser medido, testado e verificado, que aliás é como todo governo deveria tratar as suas políticas públicas.
Quando Atila diz que um determinado tipo de ação de isolamento não deveria ser discutido pois não existem testes que comprovem a eficácia do método, ou quando ele diz que a cloroquina/ hidroxicloroquina não tem eficácia comprovada até que seja publicado um estudo amplo e revisado por pares, ele pratica esse método como uma filosofia de vida.
É polêmico o que vou dizer agora, e quero que fique registrado como premissa que eu realmente acredito que as pessoas possam ter opiniões das mais diversas como qual time torcer, qual partido votar, qual ideologia seguir ou se Capitu realmente traiu Bentinho.
Mas existem assuntos que não cabem opinião que não seja construída em fatos, dados e reprodutibilidade dos resultados.
Não menos importante é a humildade intelectual de estar sempre disposto a encarar um novo fato que muda completamente o anterior, uma vez que novos resultados e novas informações chegam a cada dia. Afinal a ciência é isso, não?
É difícil?
Com certeza! Ser confrontando diariamente e ter que repensar seus aprendizados é uma dor constante.
Nós, como espécie, temos um desejo de respostas, preferencialmente as que tragam explicações confortáveis e que não sejam uma ruptura completa na nossa homeostase social e intelectual, bem como temos uma necessidade de personificar em alguém a nossa busca por respostas mais simples e menos doloridas.
Isso na verdade é uma estratégia evolutiva, mitos e alegorias são parte do contrato social que permitiu a cooperação em grande escala da humanidade. Entretanto, a ciência não existe para confrontar os mitos e alegorias, mas sim para atuar em uma outra via, a da razão pura.
Atila não se apresentou como um portador de ideias definitivas, e sim como um cientista comprometido com a objetividade dos fatos e com o que conhecemos que funciona.
Ele não se colocou em nenhum momento como um Guru que vai guiar a humanidade a partir de um conhecimento superior, mas sim como um veículo de comunicação de uma mensagem escrita e revisada por tantos outros cientistas que permanecem imersos nas suas pesquisas.
É aí que vemos a importância da divulgação científica! Pesquisas que são feitas só para os pares lerem são muito técnicas, cheias de jargões que as pessoas leigas não alcançam. Isso, em todas as áreas. O Átila mostrou que, quando conseguimos traduzir essa informação técnica, específica, de forma simples e clara as pessoas se interessam!
É com divulgação científica que as pessoas vão se aproximar da ciência, entender que não é algo de outro mundo, que faz parte do dia a dia delas. Só assim, elas vão comprar a briga para que não sejam tiradas verbas de pesquisa, ouvindo, por exemplo, o Atila dizer que o cara que estava estudando o coronavírus teve sua bolsa de doutorado suspensa.
Cabe a jornalistas que se especializam em divulgação científica fazer essas informações chegarem de maneira clara ao público, mas cabe também aos cientistas entenderem a importância de tornar a ciência acessível a todos. Que o Atila seja um exemplo de novos tempos.
Vamos comemorar essa pequena vitória da ciência em alcançar mais pessoas com uma mensagem tão concreta, mas quase mística:
Quando você estiver sem esperança, confie em mim, nem sempre a mensagem vai ser fácil de digerir, mas ela te libertará
Lutem pela ciência, só o conhecimento liberta.
Rodolpho Freire. Formado em ciências da computação, mestre em inteligência artificial e doutor em inteligência artificial, possui mais de 15 anos de experiência em TI na área de finanças, telecomunicações, consultoria e mídia em posições de arquitetura, infraestrutura e sistemas e dados. Na área acadêmica, foi professor e coordenador das disciplinas de IA e lógica da UMC e professor convidado da USC. Membro do board de revisores do IGI Global.
Texto feito em parceria com Debbie Cabral