Nesses últimos meses, estamos vivendo uma situação inusitada em nosso país. Basta navegar pela internet, ligar o rádio ou a TV, que o tema principal é a eleição de 2018. Isso não seria um problema se não estivéssemos vivendo um momento de extrema polarização. Desde 2015, quando o país se movimentou para o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, que não acontecia uma radicalização tão grande, tanto para a direita, quanto para a esquerda.
Descobri, com bastante pesar, que, no meu círculo de amizades, existem pessoas extremas para ambos os lados. Cada vez que eu abro meu Facebook, fico desanimado em presenciar discussões de amigos de longa data, defendendo um, ou outro, candidato como se fosse da sua própria família. Grupos de amigos do WhatsApp sendo desfeitos porque alguns não conseguem tolerar a opinião divergente do outro e meu Twitter já não é mais atraente, porque há muito pouco conteúdo realmente relevante para ser consumido.
Tenho tentado entender os motivos dessa polarização mas, ao contrário do que muitos dizem, não foram os partidos políticos que dividiram o Brasil. Essa polarização é inevitável e é uma consequência do nosso passado escravocrata. A colonização impôs uma ambiguidade à política brasileira. Ao mesmo tempo em que nós dependemos dos países mais ricos para obter recursos, investimentos, dólares, tecnologia, bens de produção e exportações, nós os vemos como os causadores de muito do nosso atraso.
A escravidão, ao longo de quase quatro séculos, conformou uma sociedade estratificada. Tanto liberais quanto fascistas tinham uma visão de mundo aristocrática, contudo a democracia, de acordo com Aristóteles, é o único sistema político em que o poder soberano está com os mais pobres, porque são maioria. A tendência é que, em uma sociedade democrática e desigual, as diferenças convirjam para o centro. Mas será que, com este cenário de polarização extrema, estamos caminhando para o centro?
“Não é nossa culpa, nascemos já com uma benção.
Mas isso não é desculpa pela má distribuição.
Com tanta riqueza por aí, onde é que está, cadê sua fração?
Até quando esperar?”
Até Quando Esperar – Plebe Rude
Vamos analisar os fatos, focando nos acontecimentos da história mais recente do país.
No início da década de 80, entre 1983 e 1984, ainda muito pequeno, lembro de grandes manifestações que eram transmitidas nos Jornal Nacional. Essas manifestações ficaram conhecidas como Diretas Já. Um movimento civil de reivindicação por eleições presidenciais diretas. Entre as lideranças deste movimento, temos duas figuras que ocuparam a cadeira de Presidente da República: Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Esse movimento foi bastante emblemático e foi um dos responsáveis pela volta da democracia no nosso país. Apesar da efetividade do movimento, o presidente que fora eleito, Tancredo Neves, chegou ao cargo por eleição indireta, tendo sua aprovação em uma Assembléia Constituinte.
Apesar de eleito, Tancredo Neves nunca assumiu o poder, pois morreu antes que pudesse governar, assumindo, assim seu vice José Sarney. Após um período muito conturbado de governo, em 1989 elegemos seu sucessor, Fernando Collor de Mello. Ele governou por apenas 2 anos e sofreu impeachment e, apesar de todos os problemas de seu governo, foi ele quem deu início à abertura do mercado brasileiro para o mundo. Itamar Franco então assume e, em 1994 inicia-se uma nova era da economia brasileira, com o Plano Real. Com o sucesso do Plano Real, que acabou com as inflações de mais de mil porcento ao mês, elegemos Fernando Henrique Cardoso, que era ministro da fazenda no governo de Itamar Franco. Após 8 anos de governo, o povo estava com sede de mudança e elegemos uma liderança que prometeu olhar pelas camadas mais pobres da sociedade: Luiz Inácio Lula da Silva. Dois mandatos depois, elegemos Dilma Rousseff, que sofreu impeachment eu seu segundo mandato e estamos às vésperas do fim do mandato de Michel Temer.
Todas essas pessoas que foram eleitas de 1984 até agora, traziam um discurso de mudança. Hora com viés de direita, hora com viés de esquerda. Mas todos eles só conseguiram governar por um único motivo: caminharam sentido o centro! Sim! Em um país onde temos 513 deputados federais e 81 senadores de múltiplos partidos, a única forma de governar é ter um discurso mais amenizado para poder agradar a maioria e aprovar os projetos. Muitas vezes, as formas como esses projetos são votados e aprovados podem ser questionadas, porém, para se ter coalisão, não há como estar na extrema direita ou na extrema esquerda.
“E cadê a esmola, que nós damos ser perceber?
Que aquele abençoado, poderia ter sido você.
Com tanta riqueza por aí, onde é que está, cadê sua fração?
Até quando esperar, a plebe ajoelhar, esperando a ajuda de Deus?”
Até Quando Esperar – Plebe Rude
Estamos às vésperas do segundo turno e vamos analisar, rapidamente, como a corrida presidencial ocorreu até o momento. Iniciamos com discursos bastante enfáticos das duas figuras que representam esses extremos. De um lado Jair Bolsonaro e de outro Lula, que foi substituído por Fernando Haddad, devido à sua inelegibilidade.
Durante a campanha do primeiro turno, as declarações eram bastante díspares de ambos os lados, sempre buscando discursos mais próximos do que é a ideologia de cada partido que representam:
Jair Bolsonaro construiu uma imagem de perseguidor da corrupção, trazendo, como discurso principal, sua honestidade e o fato de não estar envolvido em nenhum escândalo. Também estão ligadas a ele as frases de maior controvérsia, pois, da boca dele, saíram declarações de homofobia, racismo e simpatia à violência ou à tortura em casos extremos, mesmo se declarando temente a Deus.
Fernando Haddad construiu uma imagem de fantoche do Lula, iniciando sua jornada apenas como porta-voz do ex-presidente presidiário. Também fez declarações de que a imprensa deveria ser regulamentada e, por fim, caso eleito, iria governar de acordo com as vontades do Lula.
Na semana em que começou a campanha do segundo turno, os discursos começaram a se amenizar. Jair Bolsonaro parou de dar declarações tão controversas e já começou a rever a política de privatizações, dizendo que nada deve ser privatizado sem critério. Já Fernando Haddad retirou toda a imagem de Lula de sua campanha, tirou a cor vermelha da sua identidade visual e começou a buscar apoio de candidatos mais ao centro.
Eu costumo dizer que não gosto de falar sobre política na internet ou com meus amigos e o motivo é simples: minha opinião não é extremada, e sim uma ponderação do que é bom, ou ruim, de ambos os lados. Costumo excluir o que é ruim e avalio o que sobra para decidir se concordo ou não com um determinado ponto de vista e para poder fazer minha escolha.
Juntamente com a polarização, é inevitável criar um ambiente de medo onde cada um dos lados pinta um cenário de apocalipse caso o outro venha a ganhar. Analisando o atual ambiente do Brasil, onde as instituições funcionam, a imprensa tem sua liberdade, temos uma democracia bem instalada e um sistema político bem sólido, não consigo acreditar que haverá a volta do militarismo e muito menos a implantação de uma ditadura bolivariana. Todo esse cenário foi construído para angariar “fiéis” de ambos os lados, porém a democracia é maior do que os dois candidatos juntos.
Em um país onde temos cerca de 14 milhões de desempregados, a violência em crescimento, nossa saúde em frangalhos, sem contar o sucateamento da educação e a falta de apoio para a pesquisa científica no país, é fato que o povo está em busca de mudança, independente do resultado nas urnas. Se esta mudança será boa ou não, apenas o tempo dirá.