As mulheres ocupam espaços importantes para a manutenção da nossa sociedade, apesar de serem pouco reconhecidas por isso. Com a segurança alimentar não poderia ser diferente. Por toda a cadeia produtiva, as mulheres ocupam papéis importantes na manutenção da alimentação saudável.
O mês de maio representa uma ótima época para textos sobre o trabalho, uma vez que seu primeiro dia é especial para o trabalhador. Aliás, já leu as redações temáticas sobre o trabalho no ramo alimentício aqui e aqui? Não deixe de conferir esses materiais especiais!
No assunto de hoje, iremos observar o papel do trabalho da mulher como promotora da segurança alimentar em seus diversos meios simbólicos e produtivos. Afinal, qual a interseccionalidade presente entre gênero e segurança alimentar? O que podemos fazer para proporcionar um meio de trabalho mais socialmente responsável às mulheres? Iremos ver tudo isso agora!
Do campo à mesa, as mulheres ocupam os mais diversos papéis, apesar de, algumas vezes, serem desconhecidos ou invisibilizados. Em produções agrícolas, por exemplo, elas representam cerca de 43% do contingente total de trabalhadores camponeses no mundo [1]. Elas realizam trabalhos como preparação da lavoura, limpeza, cultivo, armazenagem, etc.
Porém, o destaque de suas atividades ocorre principalmente com a sustentabilidade ambiental, item essencial à garantia da segurança alimentar (como explicado neste texto aqui). Geralmente, as agricultoras empregam conhecimentos tradicionais transmitidos geracionalmente, como domesticação, preservação de espécimes, conservação de sementes crioulas e até mesmo cultivo de plantas medicinais [1]. A manutenção de cultivos agroecológicos é bem evidente em produções mantidas por agricultoras.
Como mantenedoras das relações familiares, as agricultoras tendem a se preocupar mais com a saúde e a alimentação dos seus entes geracionais, bem como a passagem do conhecimento intrafamiliar [2]. Dessa forma, ela é uma figura importante para reprodução física e simbólica da maneira de ser e agir na agricultura.
Não somente no campo ocorre a importância da mulher à sustentabilidade ambiental, social e econômica. Elas também são cruciais na cadeia agroalimentar em fases que envolvem o processamento, a comercialização e o preparo [1]. A presença massiva de mulheres em feiras, sacolões, mercados públicos, mercearias, supermercados, comércios de rua, etc. apenas reforça o impacto da força feminina na transformação de alimentos.
No setor informal de alimentos, por exemplo, há o desenvolvimento de diversos serviços alimentícios que são protagonizados por mulheres, como no comércio ambulante de alimentos. Nestes trabalhos, não há garantia de direitos trabalhistas, como férias, 13º ou previdência [4]. Por garantir a oferta de alimentos a baixo custo, esses serviços (comidas de rua, marmitas, alimentos frescos, etc.), em algumas localidades, podem ser críticos para manter um grau mínimo de segurança alimentar.
Dentro dos lares não poderia ser diferente. No trabalho doméstico, muitas vezes com jornadas exaustivas e invisibilizadas, as mulheres ocupam protagonismo em seus lares [1]. O feminino preserva os “modos de saber fazer” de grande parte das receitas culturalmente significativas em muitas regiões. O saber relacionado com alimentos, tempos, utensílios e técnicas é passado geracionalmente de mãe para filha. Nesse contexto, também é articulada estratégia de provisão, preparo e consumo de refeições saudáveis, seguras e sustentáveis. Mesmo aqui ainda observamos a invisibilização social do trabalho da mulher.
Algumas atividades são tão representativas de cuidados que rapidamente já pensamos em mulheres as exercendo. Trabalhos como cozinheira doméstica, popular, comunitária, merendeira, etc. são capazes de sanar necessidades alimentares específicas e manter a saúde comunitária geral [1]. Apesar disso, muitas dessas práticas podem ser articuladas em contextos complexos e problemáticos que perpassam o racismo, o sexismo e até o assédio moral e sexual das trabalhadoras.
Apesar de todos os benefícios à prática culinária e a seguridade alimentar, nem sempre os benefícios são colhidos de maneira adequada. Na verdade, relações de poder patriarcais, políticas agrícolas androcêntricas e a divisão sexual do trabalho garantem que as mulheres fiquem cerceadas de seus poderes nas relações com a alimentação [1]. A capacidade plena da contribuição feminina, nesse caso, fica abaixo do esperado pela dificuldade do acesso à terra, às tecnologias e aos incentivos financeiros.
Quando relacionamos com a questão étnica, a situação fica até pior! Mulheres negras e de baixa renda dificilmente conseguem suporte social. Além das dificuldades de gênero, ainda há a possibilidade de sofrerem com sobrecarga de trabalho, cobranças excessivas, dificuldade de acesso a recursos, baixo grau de mobilidade social e invisibilidade do trabalho doméstico.
Saber reconhecer essas dificuldades é crucial para promovermos ambientes de trabalho sustentáveis e melhores graus de segurança alimentar e nutricional. Afinal, mulheres estão no perfil dos mais impactados pela insegurança alimentar, apesar de todos seus esforços contra esse estigma.
Políticas como incentivo à terra e recursos agrícolas, apoio de acesso ao mercado de trabalho formal, proteção social, aumento do número de creches comunitárias e campanhas contra o trabalho doméstico unilateral são incentivos para melhorar a situação do gênero feminino. Porém, essa ainda é uma grande caminhada e, como as mulheres sabem, não será um trabalho fácil de realizar…
Esse texto é inspirado no capítulo 5 do livro “Segurança Alimentar e Nutricional”, lançado pela Academia Brasileira de Ciências. Você consegue acompanhar mais sobre essa discussão nesse ensaio, bem como diversos outros temas quentes sobre segurança alimentar! Basta clicar no link presente nas referências.
O que acharam desse texto? Já ouviu sobre toda essa importância do trabalho feminino à segurança alimentar? Você faz parte desse processo? Não deixe de comentar sua experiência. Até a próxima!