No texto anterior (O que você sabe sobre química do solo? – parte 1) eu expliquei o papel da água no intemperismo químico do solo e prometi que voltaria para explicar o que esse intemperismo gera e qual a importância desses produtos gerados, você se lembra?
Antes de começarmos eu vou dar uma resumida no que já foi discutido nos outros textos dessa nossa saga sobre o solo. Pedaços da rocha-mãe são quebrados por ação dos ventos, chuvas e mudanças bruscas de temperatura até ficarem menores, quando passam, então, a ser chamados de minerais primários. Esses minerais são transformados em outros bem diferentes e de tamanho extremamente reduzido, os minerais secundários, com auxílio da água que está ao redor desses minerais e que atua de duas maneiras: servindo como meio reacional e/ou participando ativamente das reações químicas.
Dentre as substâncias formadas no intemperismo químico, as mais importantes são os filossilicatos e é por isso que vamos focar neles nessa segunda parte do nosso textinho. Esses minerais compõem a fração argila do solo, que é aquela com partículas não visíveis a olho nu (menores que 0,002 mm) e que possuem o formato de lâminas sobrepostas feitas de camadas de tetraedros de silício (SiO4) e octaedros de alumínio (AlO6). Os nomes são complicados, mas são importantes, então vamos tentar entendê-los. Como pode ser visto na figura abaixo, o tetraedro de silício é feito de um átomo de silício (Si) rodeado por quatro átomos de oxigênio (O), já o octaedro de alumínio é formado por um átomo de alumínio (Al) cercado por seis átomos de oxigênio. Cada tetraedro “dá a mão” para outro tetraedro formando uma fileira de tetraedros de silício. O mesmo acontece com os octaedros de maneira que haverá camadas específicas de SiO4 e AlO6 no mineral. E é daí que se formam as lâminas, estrutura característica dos filossilicatos.
Mas e aí, todos os filossilicatos são iguais? Todos possuem essas camadas de silício e alumínio? Bem, não são todos iguais, mas todos são variações do que eu citei ali em cima. A principal diferença entre esses minerais se dá pela quantidade de camadas de SiO4 que eles possuem. Os argilominerais chamados 2:1 apresentam duas camadas contendo silício e uma contendo alumínio no meio, já as argilas conhecidas como 1:1 possuem apenas uma camada de cada tipo, como mostrado na figura a seguir. Essa conformação divide os filossilicatos em dois tipos e, obviamente, dentro de cada divisão nós podemos encontrar vários minerais que diferem entre si na maneira em que cada uma dessas camadas se comporta (se todos os tetraedros e octaedros vão estar bem juntinhos ou mais espaçados, por exemplo).
Os minerais 1:1 costumam ter suas camadas ligadas com mais força que os 2:1 e, por conta dessas ligações mais fracas, esses últimos podem ser expansíveis, ou seja, eles permitem que átomos e até mesmo moléculas (como a de água) entrem do meio de suas camadas, fazendo com que elas fiquem mais espaçadinhas. Sabe aquele solo que parece estar todo rachado quando está seco? Então, se as moléculas de água ficam entre as camadas dentro da argila, as partículas ficam mais gordinhas, mas quando a água vai embora, as partículas ficam mais magrinhas e mais distantes uma da outra, dando a impressão que o solo rachou todo. Você pode reparar que, quando vemos uma foto do deserto do Saara, por mais seco que ele seja não há rachaduras, pois o solo é arenoso, já no nordeste do Brasil existem algumas áreas que possuem esses solos rachados. É sinal que temos solos argilosos nessas regiões, que são muito famosas pelas fotos que são bastante populares, embora sejam regiões pequenas em comparação com a área total do nordeste, onde isso não ocorre.
Outro evento muito importante que acontece com os argilominerais 2:1 é a substituição isomórfica, que é a troca do alumínio nos octaedros por ferro e magnésio ou ainda do silício por alumínio nos tetraedros. Tais substituições são muito importantes porque originam as chamadas cargas permanentes. Você se lembra quando eu disse no texto anterior que o H+ poderia ser substituído por K+ ou Na+ dentro dos minerais, transformando-os em minerais diferentes? No caso das substituições isomórficas, a estrutura dos minerais continua a mesma devido ao tamanho dos átomos não ser muito diferente. Entretanto o íon Al3+, quando substituído pelos íons de ferro (Fe2+) ou magnésio (Mg2+), deixa uma carga negativa na partícula do argilomineral. O mesmo ocorre quando o íon Si4+ é substituído pelo Al3+.
A figura abaixo ilustra uma substituição isomórfica de um átomo de alumínio por um de magnésio. Note que, antes da substituição, a molécula não possuía cargas, ou seja, havia um equilíbrio entre a quantidade de cargas positivas e negativas. Tal equilíbrio deixa de existir quando a carga 3+, do alumínio, é substituída pela carga 2+, do magnésio, deixando a molécula com uma carga negativa sobrando.
O resultado dessas cargas negativas é que elas atraem diversos cátions que estão no solo. Esses cátions podem ficar alojados entre as camadas de tetraedros e octaedros (argila expansível, se lembra?) ou ao redor da partícula de argila. E esse é um dos mecanismos do solo para estocar nutrientes para as plantas! Legal, né? Pena que as cargas permanentes são formadas somente nos argilominerais do tipo 2:1 mesmo, para as demais partículas temos as cargas dependentes de pH (mas isso vai ficar para o próximo texto). Se somarmos todas as cargas, permanentes e dependentes de pH, temos a chamada CTC – capacidade de troca de cátions – que indica, basicamente, quantos nutrientes o solo consegue reter (aqui vai um parênteses para uma informação útil: a maioria dos nutrientes que as plantas precisam para viver são absorvidas na forma de cátions, ou seja, esses íons positivos que se ligam nas cargas negativas do solo).
E aí, está gostando de aprender química do solo? Quer entender como se formam as cargas dependentes de pH e como funciona a CTC? Aguarde o próximo texto! Em breve eu explico isso e muito mais. Até a próxima!