Apesar de acusar um pouco da idade (não sou tão velho :-)), a Internet dos anos 2000 trouxe várias novidades como o MySpace, Orkut, entre outros que nos deixaram cada vez mais viciados na internet. Lembro de um que me deixou especialmente vidrado por alguns dias quando meus amigos de faculdade mostraram: Google Earth. Era impressionante aquele lance de ver com grande riqueza de detalhe diferentes lugares do mundo.
Até aquela época as imagens de satélite pareciam servir apenas para aplicações militares e talvez o Google Earth fosse algo isolado para entreter os curiosos como eu. No entanto, mal eu sabia que naquela época esse era apenas um pequeno passo na grande área de sistemas de informações geográficas que vai em linha com o desenvolvimento da grande área de sistemas de informação.
O que são, onde vivem e o que comem Sistemas de Informações Geográficas?
Talvez caiba tentar responder a pergunta sem colocar o “geográficas” no meio. De forma simples, sistemas de informações são formas estruturadas de armazenar dados para que possam ser processados, analisados e distribuídos posteriormente. O exemplo caricato é o armazenamento de dados de compra. Toda vez que vamos ao supermercado nossos dados como idade, nome, CPF (que talvez possa ser possível linkar dados de renda, etc posteriormente) e nossos itens de compra são armazenados (isto é, “armazenagem de dados”) e depois um estatístico (cientista de dados) pode utilizar esses dados para descobrir com que frequência homens de classe média vão ao supermercado comprar pipoca (isto é, processamento e análise posterior), por exemplo.
Os sistemas de informações geográficas seguem todas as premissas mas com um componente determinado: as informações são sempre associadas a informações espaciais. Esse componente espacial pode ser utilizado na análise, mas também na visualização de informações. Por exemplo, um caso clássico seria um banco de dados de pontos comerciais em uma cidade. Um sistema de informação tradicional teria essas informações em tabelas como a figura da esquerda abaixo. Um sistema de informação geográfica teria as mesmas informações porém cada loja também teriamos a coordenada geométrica da localização de cada loja que pode gerar a figura da direita.
Esse exemplo parece simples, agora imagina a infinidade de coisas que é interessante relacionar a uma localização específica. Bom, os mapas são casos clássicos mas como será que esses mapas são “criados”? Por exemplo, abaixo está o mapa de renda da cidade de São Paulo em 2000. Quem construiu esse mapa? com que dados? Como estes dados são armazenados? Como a visualização é criada? Basicamente, todas as essas perguntas estão relacionados aos tais sistemas de informações geográficas.
E quem inventou os Sistemas de Informações Geográficas?
O termo “Sistema de Informação Geográfica” (Geographic Information System) foi batizado por Roger Tomlinson em 1968 no contexto do trabalho de criação de um Sistema de Informação Geográfica do Canadá. Como o Canadá tem uma grande extensão territorial, o governo Canadense tinha por objetivo construir um inventário de seus recursos naturais. A figura abaixo é a capa do relatório escrito por ele disponível neste link.
Basicamente, foi uma “atualização” dos mapeamentos que estavam começando a ser construídos a época. Lembram da classificação do nosso relevo por Aroldo de Azevedo de Azevedo (década de 40) e Aziz Nacib Ab’Saber (década de 70) que aprendemos no Ensino Médio? Pois é, nessa época estava começando a estender estes mapas para criar visualizações e classificações com maior nível de detalhe.
E como você está colaborando (voluntariamente ou involuntariamente)?
Outra vez denunciando a idade, lembra quando existiam os aparelhos de GPS que tínhamos que pagar para ter acesso ao mapa? Não havia nada errado em comprar, afinal era um trabalho manual de “mapear” e catalogar informações geográficas. Parece óbvio, saber onde está cada rua na cidade não é uma tarefa fácil. Antigamente era necessário que tivesse equipes com instrumentos necessários para coletar informações da malha viária. No mesmo artigo que linkei acima tem uma foto caricata de como essas coisas eram feitas na década de 60, como você pode ver na figura abaixo. Neste caso é uma mesa digitalizadora em que a responsável pelo trabalho estava criando segmentos individuais (“linhas”) para ser armazenado e processado (no caso, ela poderia estar delimitando áreas de uma certa vegetação ou relevo e não necessariamente vias urbanas). Estas linhas contíguas eventualmente podem constituir regiões fechadas (polígonos) e possivelmente essas regiões fechadas podem ser combinadas e etc. O componente de “sistema de informações” eram imputada manualmente (por exemplo, a região X tem tipo de vegetação do tipo Y e o subsolo é rico no metal Z).
Como podemos ver, requeria uma grande equipe para coletar e processar os dados. A tarefa acabou ficando mais fácil quando o Sistema de Posicionamento Global (GPS) ficou acessível para uso civil. Isto facilitou o georreferenciamento de qualquer tipo de informação.
Com a combinação do GPS e o celular isso ficou ainda mais fácil. Basicamente nos “seguindo” podemos prover diferentes informações. O projeto do OpenStreetMap é um caso interessante. Trata-se de um mapa cooperativo que tem por objetivo catalogar a malha viária para poder ser usado por aplicativos de navegação e ele é basicamente construído com base em pedaços de informações enviados por diferentes usuários. Quanto mais você é “rastreado”, mais informações estão disponíveis para construir o mapa viário com maior nível de detalhe. Porém, isso não é tudo e por vezes outros usuários tem que colocar informações manuais como por exemplo o limite de velocidade ou se é permitido determinada conversão ou se há um semáforo naquele local. Neste caso é uma coleta de dados voluntária.
Rastreando nossos celulares estamos ajudando empresas criarem sistemas de informações geográficas de forma involuntária por vezes. Às vezes não está relacionado a criação do “mapa” em si, mas, por exemplo, a informação de quando um determinado estabelecimento está aberto ou em que horário ele está mais cheio pode ser inferido com informações anônimas de usuários. Certamente você sabia disso, mas me parece mais bonito dizer que nossos dados estão sendo usados para “alimentar sofisticados sistemas de informações geográficas” em vez de um mísero “banco de dados” :-).
Referências:
Figura com restaurantes de Nova York adaptado deste site
Artigo inicial descrevendo os primeiros sistemas de informação pode ser visto neste link (segunda e terceira figura também retirado deste artigo).
Projeto OpenStreetMap
Imagem destacada retirada deste post.