Quando a gente diz “nossa, daqui de cima a paisagem é tão bonita”, normalmente estamos falando daquela visada, do ponto de vista, de perspectiva. Mas e para a Geografia, o que é Paisagem?

Dessa vez queria começar por um caminho diferente. Vamos falar de música.

Temos músicas contando que, da janela lateral do quarto de dormir, vemos igrejas, sinais de glória. Outras nos dizem que tudo cheira a pólvora, frio de mármore, que a paisagem condecora os seus raptores. Tem a que diz que é filho de um chão descampado,  do cerrado maltratado “arrudiado” de serra e que pra todo lado é mato baixo torcido quando quer todo florido formosura que conquista.

Trouxe nesse parágrafo três músicas completamente diferentes que, nesses trechos, tem uma coisa em comum: paisagem. Mas percebam, além de serem paisagens diferentes, a maneira de descrever e o que é percebido delas também é diferente.

Na música de Lô Borges e Fernando Brant, Paisagem na Janela, o que é descrito é uma paisagem antropizada, onde houve interferência do homem. Estamos falando de igrejas, de grades, de uma história que pode ser observada e interpretada olhando a paisagem.

Já o Emicida traz uma paisagem política, tênue, de sentimentos e sentidos. Nos mostra uma paisagem triste, cinza, violenta. Por fim, Well Figueiredo nos traz o cerrado. Uma paisagem bucólica, natural, de árvores, flores e serras.

Assim como as maneiras de descrever e analisar uma paisagem podem ser infinitas, o conceito de Paisagem também é bastante variado. É importante dizer que se diferentes profissionais se propuserem a analisar uma paisagem, diferentes resultados existirão. Nesse texto vamos falar da visão da Geografia.

Para Holzer (1999):

“A paisagem [é associada] a porções do espaço relativamente amplas que se destacavam visualmente por possuírem características físicas e culturais suficientemente homogêneas para assumirem uma individualidade” 

Muito lindo né? Mas o que isso significa na vida real?

Bom, a paisagem para Holzer pode ser entendida como uma área relativamente grande que se destaca visualmente por ter características físicas (relevo, vegetação, solo, clima, geologia, hidrografia) e culturais (grupo de pessoas, tipo, tradições e costumes…) suficientemente homogêneas para serem uma coisa só.

A paisagem será, então, um resultado do encontro entre um aspecto social e cultural e o meio físico. Mas ainda não falei de um elemento super ultra mega importante na análise da paisagem: O tempo.

A paisagem muda com o tempo, e o que observamos hoje é um retrato que é fruto das ações do passado. Como disse Milton Santos (2002):

“A paisagem é história congelada, mas participa da história viva. São suas formas que realizam, no espaço, as funções sociais.”

Ou seja, o que vimos quando olhamos da janela lateral do quarto de dormir é o resultado da história. Tudo o que vimos atua ativamente na construção do que serão as futuras paisagens. É como se a história fosse somada, cada vez mais. Cada vez em uma nova construção física e social.

Mas tem um detalhezinho importante aqui. Cada um de nós vê e interpreta a paisagem de maneira diferente. Só pensar no Emicida, falando do cheiro da paisagem. Com o tempo,  o positivismo, o pragmatismo na hora de fazer ciência, a leveza e o romantismo foram completamente abandonados. Acho que é hora da gente exercitar isso para o novo ano. Vamos romantizar paisagens.

O que você vê pela janela lateral do quarto de dormir?

Nesse texto citei:

HOLZER, Werther. Paisagem Imaginário e Identidade: alternativas para o estudo geográfico. In: ROSENDAHL, Zeny & CORRÊA, Roberto Lobato (orgs). Manifestações da Cultura no Espaço. Rio de Janeiro: Eduerj, 1999. 248p. p.149-168 (Série Geografia Cultural)

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo – razão e emoção. São Paulo: Edusp, 2002. 384p.