O cenário alimentício nunca esteve tão aquecido. Novidades surgem o tempo todo, atendendo à necessidade de consumidores cada vez mais diversificados em suas preferências. Para o consumidor voltado aos alimentos com processos sustentáveis, por exemplo, selos e indicações eco-friendly e de gestão ambiental (ISO 14.001) tornaram-se oportunidades reais no mercado.

Porém, existem empresas que vendem sua marca como amigável à natureza, mas que na verdade mascaram processos que são danosos ao meio ambiente de diferentes formas. No texto de hoje, iremos entender o conceito de greenwashing, bem como seus impactos na indústria de alimentos.

O Greenwashing pode ser traduzido apropriadamente como “pincelado verde”, ou seja, toda estratégia de marketing que tente vender a responsabilidade ambiental da empresa atrelada a algum produto, porém sem comprovação dos reais efeitos positivos ao meio ambiente ou à sustentabilidade empresarial [1]. Ocorre tanto por ignorância e confusão aos termos ambientalistas ou para ludibriar consumidores desatentos.

Geralmente essa prática ocorre quando uma companhia possui elevada assimetria de informação com relação ao seu processo de suprimentos, de produção ou distribuição em relação aos compradores. Ou seja, é improvável que os compradores consigam rastrear processos, fornecedores ou canais de pós-venda estáveis. Quando esta assimetria informacional ocorre, uma empresa possui controle superior para ditar como seu produto pode ser visto pelo consumidor.

Como a questão ambiental se tornou um importante fator para a competitividade empresarial, muitas empresas e companhias agroextrativistas — principalmente aquelas com visão estratégica de longo alcance — apropriaram-se inadequadamente de termos que denotam apreço aos valores e responsabilidade socioambiental e cultural. Desta forma, a empresa faz a absorção de recursos e funções ecológicas como uma espécie de ativo intangível para formação de sua marca, mesmo não tratando o tema como prioridade dentro da logística produtiva da corporação.

Entende-se por ativo intangível tudo aquilo que, apesar de não ter existência material, possui valor dentro da empresa ou pode ser usado à criação de valores [2].

É um recurso simbólico que denota efeitos materiais na medida em que atrai linhas de crédito especiais, fornecedores e colaboradores seletos, pacotes de inovação e subsídios governamentais, além, é claro, de consumidores dispostos a pagar mais caro pelos produtos da companhia. Para que estes efeitos sejam consolidados, porém, é necessário que a empresa invista na evidenciação de seus ativos intangíveis em demonstrações financeiras públicas e em transparência dos mesmos aos seus stakeholders: fornecedores, acionistas, colaboradores e consumidores [1].

Tanto a evidenciação quanto a transparência não ocorrem em empresas que praticam greenwashing.

 

Imagem 1: Redação do site Opcions destaca o greenwashing que empresas de fast food passam aos seus produtos, com mudança de cores de embalagens ou indicações “verdes” em alimentos. Os valores socioambientais são incompatíveis com a insustentável maximização de benefícios oriunda das grandes companhias. Na foto, porção de fritas sendo posta encima de uma embalagem com folha de alface [3].

No setor alimentício, o greenwashing ocorre quando não existe uma comunicação clara e consistente da empresa para com seus consumidores, principalmente em excessos de retórica nas práticas de marketing ou rotulagem verde. Desde quando o conceito de marketing verde surgiu (1960-70) ocorreu a divisão de consumidores clássicos e verdes, sendo estes últimos o objeto de interesse das práticas de “maquiagem verde” nas companhias alimentícias.

Empresas que realizam a manipulação, processamento e comercialização de produtos naturais, ecológicos, minimamente processados e orgânicos possuem mais propensão na utilização de símbolos consolidados de saudabilidade, estética, eco-friendly e consumo consciente [4]. Apesar de muitos destas companhias possuírem selos referentes à legitimidade de suas atividades, a confusão na montagem da embalagem e nos termos científicos pode salientar benefícios superiores a quem esteja lendo.

O supermercado inicialmente era o canal de compra ideal para consumidores verdes. Porém, com a divulgação de produtos duvidosos quanto à prática consciente, lojas especializadas: empórios, lojas da terra e feiras orgânicas largaram na frente na formação do canal primário de alimentos conscientes [4]. Apesar disso, a legitimidade da venda de grãos, castanhas (a granel) e produtos oriundos de multinacionais ainda não é totalmente confiáveis ao consumidor consciente. Nem mesmo a venda de peixes em canais primários, como peixarias — principalmente de ambientes contaminados — passa muita segurança a quem conhece os danos ecológicos.

O portal americano The Green Dandelion ajuda a identificar práticas mais invisíveis de greenwashing no cotidiano [5]. Sucos 100% naturais, por exemplo, podem conter taxas maiores de flavorizantes e açúcares, atribuindo adição aos produtos que eram vendidos como “integrais”, dependendo do local e fonte.

Outra prática comercial — investigada no Canadá e Nos EUA — é a venda de produtos naturais em mercados agrícolas e feiras como se fossem DNA free (não transgênico) ou orgânico (sem agroquímicos), porém comprados de fontes que não detinham tais práticas [5]. Estes produtores (certificados como ecológicos) financiavam possíveis aumentos na previsão de demanda comprando e estocando produtos que estavam longe de terem práticas ambientalmente seguras, mas vendendo como se eles tivessem produzido. A matéria em específico teve por base países com grau superior de rastreabilidade e comunicação em canais de venda.

Os malefícios da prática comercial incluem no curto prazo perda de credibilidade da empresa, invisibilização de práticas ambientais corretas e assunção de riscos ambientais. No longo prazo, observa-se a degradação dos sistemas de selos ambientais e de consciência das práticas ambientalmente corretas. Os efeitos do greenwashing podem minar tudo que veio de bom com o marketing verde e a gestão ambiental empresarial.

 

O que fazer para evitar o greenwashing?

Muitas práticas estão associadas com a responsabilidade de denominação e uso de termos sustentáveis dentro das organizações. Um exemplo é a cobrança da evidenciação nos demonstrativos financeiros ou relatórios socioambientais públicos de produtos que se denominam conscientes [1]. Para empresas listadas na bolsa de valores, o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) é uma ótima fonte de evidenciação sobre empresas que dizem preocupar-se com dimensões ambientais e sociais.

Outro exemplo é a cobrança de transparência de empresas que atribuem atividades ambientalmente corretas no setor produtivo. Se uma empresa diz replantar X árvores a cada Y unidades vendidas, por exemplo, cobre nos canais de pós-venda para saber índices de reflorestamento e locais do replantio. Busque saber por órgãos ambientais se as informações são condizentes, ou se a empresa mantém recursos financeiros adequados para terceirizar a atividade ecológica.

Sobre empresas que possuem longo histórico de desrespeito socioambiental, não caia na ideia de confiar nelas novamente. Vale mais a pena abrir espaço para empresas novas e que, principalmente, possuam linhas inteiras de produtos voltados à temática, ao invés de uma multinacional que está fazendo uma campanha pontual.

Busque fontes mais seguras de fornecimento e produção, de preferência que possuam selos correspondentes aos níveis de atividades que dizem fazer, com auditoria de órgãos certificadores sérios. Em resumo, não confie somente no rótulo ou nos dizeres “das entrelinhas”. De vez em quando, uma embalagem bonitinha e bem desenhada pode esconder muita atividade errada!

O texto de hoje pretendeu mostrar que existem muitas atividades lesivas ao meio ambiente, e saber reconhecer aquelas que se dizem “ambientalmente corretas” será importante para nos tornarmos consumidores de alimentos conscientes! Alguma dica, comentário ou crítica? Obrigado pela leitura e até a próxima!

 

Referências
[1]: LINS, Luiz dos Santos; SILVA, Raimundo Nonato Sousa. Responsabilidade Sócio-Ambiental ou Greenwash: uma avaliação com base nos relatórios de sustentabilidade ambiental. Sociedade, Contabilidade e Gestão, v. 4, n. 1, 2010.
[2]: KAYO, Eduardo Kazuo et al. Ativos intangíveis, ciclo de vida e criação de valor. Revista de administração contemporânea, v. 10, p. 73-90, 2006.
 [3]: CHAVÉZ, Brenda. Comida rápida y greenwashing. Portal Opcions, 30 nov. 2017. Disponível aqui.
[4]: MORAES, Cristine; PRADO, Nágela. Perfil dos consumidores de alimentos orgânicos e naturais: greenwashing ou consumo consciente?. Caderno Técnico de Administração Contemporânea, v. 2, n. 2, 2020.
[5]: BEAUMONT, Patricia. Greenwashing in the food industry. Portal The Green Dandelion. 30 Jan. 2019. Disponível aqui.