A chegada de Reagan ao Poder (1981) marca o início de um novo momento da Guerra Fria. Após mais de dez anos de arrefecimento nas relações com a União Soviética (URSS), os EUA voltaram a desempenhar uma função ativa no globo.

Neste realinhamento, a rivalidade com os soviéticos possuía papel central. Como observa Cristina Pecequilo (2005), a Doutrina Reagan era composta pelos seguintes elementos: a superação do sentimento de culpa em relação ao poderio dos EUA (síndrome do Vietnã); a retomada do Mito da Excepcionalidade (promoção da paz e liberdade global); e a contenção do avanço da URSS.

Este período de retomada de um posicionamento mais ativo dos americanos no mundo recebe o nome de Segunda Guerra Fria (1981 – 1985) e, diferentemente da Primeira Guerra Fria (1947 – 1969), que teve a Ásia como principal palco dos eventos bélicos, agora a disputa se voltava para o dito “Terceiro Mundo”. Os exemplos mais evidentes desses novos tempos foram a Guerra Afegã-Soviética (1979 – 1989) e a Guerra Irã-Iraque (1980 – 1988).

Além de questões próprias da guerra fria, como a Doutrina Brezhnev (1969), de maior atuação da URSS em sua zona de influência, e questões próprias da política regional, esses dois eventos foram reflexos imediatos da Revolução Iraniana (1979) e a instauração de uma República Islâmica Teocrática sob o comando do Aiatolá Khomeini, de orientação xiita.

Aiatolá Khomeini (1979)

O temor de que a revolução se expandisse pela região e provocasse novos levantes golpistas provocou uma reação das nações vizinhas e das superpotências internacionais. No caso da Guerra Afegã-Soviética, a URSS temia que uma revolução aos moldes da iraniana atingisse o Afeganistão e depusesse o governo de seu aliado, Daud Kahn, trazendo consequências para sua influência na localidade.

Já a participação dos EUA neste conflito começou oficialmente em 1979, ainda durante o governo de Jimmy Carter (1977 – 1981), com o envio de suporte militar aos rebeldes afegãos (Mujahideen) antissoviéticos, por intermédio do Paquistão.

Com a posse de Reagan, as relações entre os Mujahideen e a Casa Branca estreitaram e o apoio passou a contar com treinamento americano, o financiamento de operações militares e o envio direto de armas, veículos e mísseis aos rebeldes. O desfecho da guerra foi marcado pela derrota fragorosa da URSS, contribuindo significativamente para o fim do regime comunista.

A Guerra Irã-Iraque, por sua vez, também foi uma reação de governos locais à Revolução Iraniana e o temor de que ela se expandisse pela região, provocando novas insurreições populares em suas localidades. Naquele mesmo momento, Saddam Hussein chegava ao poder no Iraque, com um projeto nacionalista e expansionista que visava a anexação de territórios na Costa do Golfo Pérsico, ponto estratégico para a distribuição de petróleo.

Golfo Pérsico

Sob a alegação de que o Irã fomentava a instauração de um governo religioso radical xiita transnacional, incorporando a maioria da população iraquiana, Saddam Hussein comandou uma invasão ao país vizinho, dando início ao conflito.

Assim, durante toda a década de 1980 e, principalmente, após o enfraquecimento da URSS em 1985, o foco da Guerra Fria se deslocou para o Oriente Médio, fazendo com que os grupos étnicos e nações daquela região fossem imagens cada vez mais presentes no imaginário americano, na imprensa, mas, principalmente, na indústria cinematográfica da época.

Ao mesmo tempo, como aponta Douglas Kellner (2001), a filmografia da década de 1980, com Rambo, Top Gun e seus análogos, não apenas contribuiu para a construção de um novo inimigo junto aos americanos, como, aos poucos, tornaram palatável a ideia de invasão daquela região e o retorno de uma política externa intervencionista.

No campo político, os anos Reagan pavimentaram o caminho para que o seu sucessor, George H. W. Bush, tivesse apoio para impor a vontade americana no mundo, principalmente em um cenário onde não haveria mais um rival a sua altura. A primeira oportunidade para a exercer sua hegemonia veio no final do segundo ano de seu mandato, em resposta às ações de um antigo aliado nas guerras financiadas por Reagan: Saddam Hussein.

George H. W. Bush (esquerda) e Saddam Hussein (direita)

Durante a Guerra Irã-Iraque, para empreender seus planos, Saddam recebeu o apoio dos EUA e das monarquias árabes do Kuwait, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita. Após oito anos de conflitos e aproximadamente um milhão de mortos, a guerra terminou sem que o Iraque atingisse seu objetivo, deixando um alto custo econômico ao país, com uma dívida que somava US$ 80 bilhões e mais de US$ 100 bilhões de custos para a reconstrução física dos estragos causados pelos confrontos.

O endividamento iraquiano colocava um sério empecilho para a realização do projeto nacionalista de Saddam Hussein. Por conta disso, alegando que aquela fora uma guerra do interesse de todos os seus apoiadores, o presidente do Iraque negou-se a pagar suas dívidas, causando atrito com a Arábia Saudita. Concomitantemente, visando aumentar suas receitas, Saddam tentou interferir na produção de petróleo da região, acusando o Kuwait de produzir mais petróleo e derivados do que era estabelecido como teto pela OPEP.

Sem obter sucesso em suas apelações, Saddam decidiu invadir o Kuwait, visando a incorporação do país vizinho a seus territórios, sob o pretexto de que toda aquela região pertencia historicamente ao Iraque, desde os tempos da Babilônia. A ideia, por trás da alegação, era aumentar a produção de petróleo e possuir um ponto de distribuição da matéria prima no Golfo Pérsico, objetivo almejado desde o confronto com o Irã.

Assim, no dia 02 de agosto de 1990, Saddam Hussein invadiu o Kuwait e, em pouco mais de dois dias, assumiu o controle do país. Entretanto, ao contrário do que o presidente iraquiano imaginou, esta ação provocou uma rápida resposta da comunidade internacional que, capitaneada pelos EUA, classificou os ataques como uma guerra de agressão, impondo sanções ao Iraque e abrindo negociações para que um acordo de paz fosse firmado.

Diante da impossibilidade de se encontrar uma saída diplomática para o imbróglio, o Conselho de Segurança da ONU aprovou o uso de ações bélicas para forçar a retirada dos invasores do Kuwait. A coalizão responsável pela intervenção foi liderada pelos EUA e contou com a participação de franceses, ingleses, o apoio da Síria e o financiamento direto dos países sauditas, especialmente a Arábia Saudita.

Foi então que no dia 16 de janeiro de 1991 a guerra começou com uma campanha de bombardeios aéreos contra alvos iraquianos, visando a destruição de aeronaves e de suas defesas antiaéreas. Por conta do número alto de baterias antiaéreas concentradas na cidade, Bagdá foi o alvo preferencial dos ataques.

Ataque a Bagdá, 1991.

A reação do Iraque se deu por meio do uso de mísseis balísticos contra a Arábia Saudita e Israel. O plano de Saddam era trazer o governo israelense para os conflitos, despertando a simpatia de outras nações islâmicas à sua causa. Porém, os EUA trabalhou para proteger o território de Israel em troca de sua “neutralidade” no conflito.

Quase um mês depois das primeiras ofensivas, em 24 de fevereiro, teve início às operações em solo (apelidada de Tempestade no Deserto), para forçar a retirada das tropas de Saddam Hussein do Kuwait. Em menos de cinco dias um cessar-fogo foi declarado e os soldados iraquianos deixaram o território antes ocupado.

A guerra chegou ao fim com um número pequeno de baixas do lado da coalizão (menos de 300 soldados), enquanto o Iraque viu quase 50 mil de seus soldados serem mortos. Além disso, o alto número de vítimas fatais entre os civis (entre 100 mil e 200 mil) e ataques a prédios de finalidade humanitária, como hospitais, por parte da coalizão, bem como a perseguição de minorias étnicas (curdos), por parte dos iraquianos, apontam para uma série de violações dos direitos humanos durante os meses de conflito.

Em 10 de março de 1991, 540 mil soldados americanos voltaram para casa. Porém, para o que nos importa, um dos resultados diretos causados pelo fim da guerra, foi o envio de tropas permanentes americanas a territórios na Arábia Saudita.

Bill Clinton, 1986.

Apesar da vitória bélica ter trazido popularidade ao governo de George H. W. Bush e encaminhar sua reeleição para o ano seguinte, o modelo econômico neoconservador, baseado no aumento do consumo por meio do corte de tarifas começou a demonstrar cansaço. Já em 1992, Bush teve que aumentar impostos, o que desagradou boa parte de seu eleitorado. Ao mesmo tempo, um candidato carismático vindo do Sul abalaria o nicho sulista dos republicanos. O resultado seria a derrota do então presidente para o jovem governador do Arkansas, o Democrata Bill Clinton.

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Referências:

KELLNER, Douglas. A Cultura da Mídia.  Bauru: Edusc, 2001.

PECEQUILO, Cristina Soreanu. A política externa dos Estados Unidos. 2 ed. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2005.

Guerra do Golfo e Saddam Hussein | Nerdologia

https://www.youtube.com/watch?v=0vciV4p9tFk&t=487s

George HW Bush and the End of the Cold War: Crash Course US History #44

https://www.youtube.com/watch?v=L-K19rVDxoM