Hoje vou falar um pouquinho sobre sonhos, essa espécie de série que assistimos no Dormirflix (hahaha desculpa, gente). É engraçado perceber que sempre buscamos explicações ou reviews para saber o que exatamente o “roteirista” – eu e você – quisemos dizer nessa obra. Então dê aquele bocejo e vamos entrar nesse lindo mundo da imaginação!

Pois bem, essas explicações existem das formas mais variadas possíveis e há muito tempo. As primeiras estavam ligadas a questões religiosas, em que o sonho era uma forma de comunicação com as divindades ou ainda, algum tipo de premonição.

Com o advento de novos conhecimentos, principalmente oriundos da Psicanálise (aquela lá do tio Freud), os sonhos passaram a ser entendidos como manifestações de desejos reprimidos de forma inconsciente, tornando-se um elemento muito importante para entender conflitos dos clientes em análise.

Neurocientistas também tem se dedicado bastante ao estudo dessas obras ficcionais que produzimos enquanto dormimos, correlacionando isso ao estado de sono profundo conhecido como REM – Rapid Eye Moviment, movimento rápido dos olhos em tradução livre. Segundo eles, o sonhar seria importante por favorecer a permanência nesse estado profundo de sono, o que é fundamental para que reprocessemos as informações adquiridas durante o dia.

Mas aí é que está, vou acrescentar mais uma informação que, juntamente com essa última, servirá de base para conhecermos mais um pouquinho sobre o assunto. Para a Análise do Comportamento – uma das vertentes teóricas dentro da Psicologia – sonhar é um comportamento, é ver na ausência do que está sendo visto. Calma, você não tem alucinações quando dorme!

E aí, o que você tem visto quando não está vendo?

Na perspectiva da AC, o sonho é um comportamento encoberto, o que significa dizer que ele só é acessível a quem se comporta, ou seja, eu só tenho como saber o que outra pessoa sonhou caso ela me conte. E vejam só, isto é aprendido! Todos os comportamentos encobertos são adquiridos de forma pública e depois passam a se manifestar privadamente. Nós aprendemos a lidar com o mundo e conhece-lo para que depois esses elementos estejam presentes nos nossos sonhos.

Esse processo é influenciado por 3 níveis de seleção: Filogenético, ontogenético e sociogenético. O primeiro diz respeito à herança genética da espécie humana; o segundo trata de questões relativas à história de vida de cada organismo e seus processos de reforçamento; e o terceiro é a influência de fatores culturais. Sendo assim, não existem dois sonhos iguais, pois a ontogênese sempre vai ser diferente entre duas pessoas, mesmo que sejam irmãos gêmeos.

Como vocês já puderam perceber, sonhar é uma vantagem evolutiva! E atualmente as pesquisas apontam que os sonhos são vantajosos porque, como já falei anteriormente, favorecem a permanência no sono REM, quando quase não nos movemos – e isso de alguma forma nos protegeu de predadores ao longo da evolução – e também porque nesse mesmo estágio do sono há o reprocessamento de informações, então, estarmos quase parados facilita que o fluxo sanguíneo se direcione mais efetivamente para a região cerebral e o gasto energético seja otimizado.

E por que a gente sonha com umas coisas e outras não? Basicamente, sonhamos em decorrência de nossa história pessoal – a primeira vez que correu depois que quebrou a perna, por exemplo –; de coisas que você pode estar privado, e isso explica por que muita gente sonha com comida quando está fazendo dieta; e não podemos esquecer que vivenciar emoções fortes também influencia no conteúdo dos sonhos.

Além do mais, enquanto estamos dormindo ativamos as mesmas áreas do cérebro em situação de vigília, ou seja, se você sonha que está sentindo dor, a área do seu cérebro que é ativada nesse momento é a mesma que seria ativada numa situação de dor “real”. Um funcionamento semelhante ao mecanismo da memória.

E por falar em lembrar, por que temos tanta dificuldade em memorizar aquilo que sonhamos? Falta motoboy. Como assim? Imagine que seu sonho é uma pizza que precisa ir da pizzaria até sua casa. Se não tiver motoboy, a comida não chega. Nessa analogia, a pizzaria é o hipocampo, responsável pela memória de curto prazo; sua casa seria o neocórtex, onde se consolidam as memórias de longo prazo; e o motoboy seriam os neurotransmissores, principalmente serotonina e dopamina.

Falei um pouco antes que no sono REM estamos meio que em modo de economia de energia, certo? Então, por isso estar acontecendo, há pouca produção de neurotransmissores e aí temos dificuldade em lembrar dos sonhos por muito tempo… Uma pena, não é? Poderíamos ter excelentes roteiristas e obras ficcionais!

 

 

REFERÊNCIAS:

MILHORIM, Thaís Kristine; CASARINI, Karin A.; SCORSOLINI-COMIN, Fabio. Os sonhos nas diferentes abordagens psicológicas: apontamentos para a prática psicoterápica. SPAGESP – Sociedade de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo: Revista da SPAGESP, v. 14, p. 79 – 95.

SILVA, Francynete Melo e. Uma análise behaviorista radical dos sonhos. Psicologia: reflexão e crítica, 2000, v. 13, p. 435 – 449.

MACHADO, A; HAERTEL, L. M. Neuroanatomia Funcional. 3ª ed. São Paulo: Atheneu, 2013.

PINEL, J. P. J. Biopsicologia. Tradução de Ronaldo Cataldo Costa. 5ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2005.

Skinner, B. F. (1979/2003). Ciência e Comportamento Humano. São Paulo: Martins Fontes.