Bom dia, boa tarde ou boa noite, Deviantes. Hoje meu texto vem de certa forma expressar uma minúscula homenagem a um dos grandes cantores, compositores e multi-instrumentistas brasileiros, Milton Nascimento que está fazendo uma despedida aos palcos com uma turnê em palcos brazucas, além de EUA e Europa. Milton com certeza é dos expoentes mais importantes da música popular brasileira, carioca nascido na Tijuca, mas mineiro de coração por ter ido ainda pequeno para Três Pontas – MG, fez grandes obras e parcerias ao longo do tempo.
Milton é dono de uma voz poderosa e cativante, que acabou sendo minada com alguns problemas de saúde, mas que nada impactou em seu carisma ímpar. A despedida será conhecida como a “Última cessão de música” que terá o estádio do Mineirão como “apito final” dos palcos. (Lembrando que ele disse que não abandonará a música e sim os palcos).
“O mais mineiro de todos os cariocas” por definição do próprio Milton, que também gosta de ser chamado de Bituca, deixa uma discografia belíssima. Essa foi construída em décadas de “turbulências”, em que existiam muitos “inimigos” na cultura, tentaram censurá-lo naqueles anos nefastos da história do Brasil.
Bituca teve vários períodos que devem ser destacados, um interessantíssimo, que gosto muito, é o período “carioca”, talvez regado a boemia e praia, em 1972. Nesse período, ele elaborou, com Lô Borges e outros parceiros históricos, como Márcio Borges, Ronaldo Bastos, Fernando Brant, Tavinho Moura, Beto Guedes, Flávio Venturini e Toninho Horta, um dos discos mais aclamados da música Brasileira, que é o Clube da Esquina.
Um ponto que é fundamental para entender a música brasileira é observar como esses artistas, e Milton não é exceção, tinham parceiros ou cantores que levavam a sua arte para outro patamar. Lembro de uma frase de Tom Jobim no álbum “Antônio Carlos Jobim em Minas Ao Vivo – Piano e voz”, em que o maestro se refere aos amigos como parte fundamental para um show ou gravações de excelência.
As palavras de Tom na gravação:
“Ontem eu estava muito nervoso, porque eu não sou muito de fazer show, e quem me levou para fazer show foi o Vinicius (de Moraes), Toquinho, Miucha… e é fácil fazer aquele show escorado cheio de amigos e orquestra grande”.
Em alguns momentos Milton teve o que vou me atrever a chamar de “ajuda” para construir essa belíssima carreira, e a pequena notável teve um papel importantíssimo nisso. Para quem não sabe, a pequena a que me refiro é Elis Regina (que terá um texto futuro sobre o disco Elis & Tom). Ela foi a primeira artista de renome que regravou uma música de Milton. Outro ponto interessante dessa época é que muitos cantores/compositores enviavam suas músicas ou acabavam fazendo as mesmas para outros artistas a interpretarem.
Mas não é só de Brasil que vive a carreira de Milton, que realmente tem uma carreira internacional como poucos. Exemplo disso é o álbum de 1975 do saxofonista Waine Shorter, chamado “Native Dance featuring Milton Nascimento”.
Herbie Hancock, uma lenda do jazz, já declarou que: “Não há ninguém como Milton Nascimento”, e podemos destacar a veracidade da frase, pois o americano, junto com seu compatriota Waine Shorter, participaram do álbum intitulado Milton (1976), em que foram lançadas duas músicas inéditas, “Raça” e a instrumental “Francisco”, o restante das faixas acabam sendo trabalhos anteriores de Milton com uma roupagem jazzística. Esse álbum ainda contém a participação de Toninho Horta, Roberto Silva, Novelli, Raul de Souza e Laudir de Oliveira.
Hancock também tem participação do disco Courage (1968) de Milton, que foi o seu primeiro trabalho internacional. E para deixar registrado, não posso esquecer do álbum Angelus, que o próprio Bituca destaca como álbum favorito. Esse conta com as participações de Pat Metheny, Jon Anderson, Wayne Shorter, Herbie Hancock, James Taylor e Peter Gabriel.
Mesmo celebrando essa bela história musical, podemos olhar como a vida de Milton e sua história mostram como o acaso fez com que ele se tornasse o Milton Nascimento. Filho de mãe solteira que era empregada doméstica, Milton ficou órfão aos dois anos de idade com a morte de sua mãe por tuberculose e acabou sendo adotado por uma das filhas da patroa com consentimento de sua avó. Sua “mãe” era professora de música e isso foi fundamental para a construção de sua base musical e sua habilidade que o tornou multi-instrumentista.
Um dos primeiros trabalhos foi de baixista (acústico) do Berimbau Trio, tocando nas noites de Belo Horizonte. Sua vida começa a mudar quando uma de suas músicas com parceria de Fernando Brant foi inscrita no Festival Internacional da Canção Popular e acabou sendo segunda colocada. Essa canção é nada mais nada menos que Travessia (que também foi regravada por Elis), que dá o nome do primeiro álbum do Bituca.
Se você que está lendo esse texto e tiver a oportunidade de ir nessa despedida, não pense duas vezes. Não é só uma celebração de uma pessoa, mas de um ícone da música brasileira. Viva a cultura e a arte.
Tiago Dias – Professor, pai, apaixonado por ciência, quadrinhos, música e esportes americanos. Torcedor do Green Bay Packers (os verdadeiros Reis do norte) e torcendo para que o planeta Terra não vire Krypton.
Saiba mais:
Clube da Esquina: https://www.youtube.com/watch?v=SACaczm6gA4
Altas Horas: https://www.youtube.com/watch?v=kQoQxqy5wXc
Pat Metheny Vera Cruz: https://www.youtube.com/watch?v=g4iowRRVe2M
Milton Nascimento Vera Cruz: https://www.youtube.com/watch?v=mgFuxrZljvE
Elis Regina: https://www.youtube.com/watch?v=GLWZusigAWc
Fotos:
https://www.letras.mus.br/milton-nascimento/discografia/milton-1976/
https://veja.abril.com.br/coluna/matheus-leitao/frase-do-dia-1644/