Você já parou para pensar no quanto que a sua intuição pode estar errada? Já parou para pensar que quando você analisa algumas situações, como se fossem experimentos, suas inferências podem ser equivocadas? Será que quando você grita com um funcionário e vê uma melhora, você sabe realmente qual a causa da melhora? E quando um atleta vai mal em uma competição logo depois de ganhar uma medalha, o famoso “salto alto”? O que será que a estatística pode nos ensinar que vai ajudar a melhorar nossos julgamentos?

Vamos começar nosso texto acompanhando a história de um trabalhador comum. João trabalha numa fábrica de sapatos e tem um desempenho regular. Apesar de não se destacar, também não deixa a desejar. Chefe satisfeito. Produção razoável. Aparentemente, nada mal. Sua produção diária gira em torno de 15 sapatos. Porém, certa vez, João iniciou a semana produzindo 8 sapatos, depois 7, e depois 9. Seu chefe, incomodado com a baixa produtividade, o chamou aos berros e exigiu uma melhora no trabalho. No dia seguinte a produção foi para 11 sapatos, seguido de 13 e depois 15. Seu chefe, então, atribuiu a melhora aos gritos que deu. Estava ele certo?

Não, provavelmente não. O que aconteceu com o João foi simplesmente um fenômeno chamado de ‘regressão à média’. Este é o nome que damos para eventos em que há muitas variáveis explicativas envolvidas, com influência inclusive do acaso (i.e. probabilidade) e que, quando temos valores extremos em determinadas observações, esperamos valores mais próximos da média na sequência. Isso quer dizer que, quando tivermos uma série de acontecimentos de um mesmo evento, embora os resultados variem ao longo do tempo, eles acabam oscilando ao redor da média.

No exemplo do nosso funcionário João, sua produtividade média era de 15 sapatos por dia. Sendo assim, o fato dele ter produzido 8 sapatos num certo dia, não significa que ele, de fato, fosse passar a produzir essa quantidade dali em diante. Da mesma forma, não foram os berros que fizeram sua produtividade retornar ao normal. Foi um dia ruim. Normal. O que a estatística nos diz é que, nos dias subsequentes, sua produtividade retornará a valores próximos de sua média. Isso supondo que o cenário permaneça o mesmo. Obviamente, se tivermos novas máquinas ou técnicas, aí sim seria normal a produção média mudar.

Para o outro lado, a mesma coisa. Imagine que João tenha produzido 22 sapatos. Ótimo resultado. Acima da média. Imagine que seu chefe o elogiasse nessa situação. Ao ver a produtividade caindo nos dias seguintes, retornando ao nível anterior ao elogio, seu chefe poderia acreditar que o elogio fez a produtividade cair. Ele pegou leve demais com João. Ao menos essa poderia ser sua crença. Novamente equivocada. Na verdade, seria só outro exemplo de regressão à media.

Outro exemplo clássico do fenômeno ocorre nos grandes eventos esportivos. Pense nos medalhistas olímpicos que conquistam o ouro. Eles tendem a ter uma queda no desempenho após os jogos. Do ponto de vista da regressão à média, o que ocorre é que eles atingiram o seu pico de performance nos jogos olímpicos. Após isso, eles retornam as suas atuações médias. Perceba que este exemplo pode ser utilizado também no futebol. É comum jornalistas utilizarem uma amostra pequena de jogos para tirarem conclusões sobre o nível de um jogador ou treinador. Se empolgam com um jogador depois de alguns jogos bons. E se o jogador não mantiver o bom nível exibido, assumimos que a fama subiu a cabeça, sendo que a queda é algo natural. Novamente, desconsiderando alterações em outros fatores (e.g.: melhor condição física).

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Note, então, a importância deste fenômeno no nosso dia-a-dia. É importante observarmos um espaço de tempo razoável para julgarmos algum evento. Intervenções como o feedback não podem ser avaliadas apenas com exemplos pontuais. Adicionalmente, como já explicado em vários outros posts aqui mesmo, é preciso ter cuidado para não confundir correlação com causalidade.  Note também como é importante termos evidências empíricas para avaliar técnicas e intervenções em diferentes áreas. Por fim, mais uma vez, a estatística nos mostra que nossa intuição falha muito mais do que imaginamos. 

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