Maceió, a encantadora capital do estado de Alagoas, passa por um momento de grande preocupação geotécnica, com riscos de desabamento e destruição de estruturas de construção civil, como já comentamos anteriormente.
Enfrentando, há no mínimo 5 anos, desafios estruturais e, por que não, econômicos, relacionados à extração de salgema, uma atividade que tem profundas ramificações geológicas, a região é conhecida por suas vastas reservas desse bem mineral, que são exploradas desde a década de 70 para a produção de insumos da indústria química, como cloro, bicarbonato e soda cáustica.
Para compreender os riscos geológicos associados à extração de salgema, é essencial examinar os processos geológicos que levaram à formação dessas reservas.
O salgema, uma rocha sedimentar composta principalmente por minerais formados em ambientes de altas taxas de evaporação, é formada ao longo de períodos geológicos extensos. Em regiões onde essa rocha sedimentar é abundante, a extração mineral se torna uma atividade economicamente significativa. No entanto, a natureza das camadas de salgema e as características geológicas específicas podem tornar a mineração deste recurso uma empreitada complexa. Ou seja, embora tenha proporcionado benefícios econômicos, também levanta preocupações ambientais e sociais que precisam ser cuidadosamente consideradas.
A estabilidade de cavas subterrâneas, uma preocupação primordial em operações de mineração, é um conceito fundamental ao analisar os riscos geológicos em Maceió. A extração de grandes volumes de salgema pode comprometer a estabilidade desses grandes volumes abertos em porções subterrâneas, levando a movimentos de massas que serão refletivos na superfície ao “remover” toda a base se sustentação.
A retirada excessiva desse material resulta em subsidência, um afundamento da superfície, afetando tanto áreas urbanas quanto rurais, sendo o primeiro o problema observado na capital alagoana. No caso específico, essa subsidência foi registrada inicialmente a taxas pequenas inicialmente, em torno de milímetros por anos, porém nas últimas semanas a velocidade de subsidência aumentou, chegando a dezenas de centímetros por dia no seu auge, levando a hipótese do colapso da mina 18, o que levaria a repentina abertura de uma cratera na superfície.
As cavidades deixadas pela extração podem comprometer a estabilidade do solo, resultando em colapsos que têm potencial para danificar estruturas e ecossistemas locais.
Entretanto, os riscos geológicos não se limitam apenas aos aspectos da terra firme. A extração dessa matéria-prima em Maceió impacta diretamente os recursos hídricos locais. A intrusão – ou infiltração – de água salina nos aquíferos costeiros é uma preocupação, afetando a qualidade da água potável disponível para as comunidades locais. Além disso, os ecossistemas costeiros, ricos em biodiversidade, enfrentam ameaças significativas devido às mudanças na dinâmica dos sedimentos.
E não para por aí. A partir do momento em que esses riscos afetam recursos hídricos e físicos, afetam também a biodiversidade local e, consequentemente, geram graves impactos sociais. A extração intensiva de salgema muitas vezes leva ao deslocamento de comunidades locais, impactando economicamente as comunidades marisqueiras na região. interrompendo suas vidas e meios de subsistência tradicionais.
A complexidade dos riscos geológicos associados à extração de salgema destaca a importância de uma regulamentação eficaz e uma governança ambiental robusta. Maceió enfrenta o desafio de equilibrar o desenvolvimento econômico com a preservação ambiental e a proteção das comunidades locais. É crucial implementar medidas de mitigação, monitoramento contínuo e estratégias de recuperação para minimizar os impactos negativos.
A compreensão aprofundada dos riscos geológicos requer pesquisa científica contínua e monitoramento preciso. A colaboração entre instituições acadêmicas, agências governamentais e empresas do setor é essencial para avaliar os impactos em curso, identificar tendências a longo prazo e desenvolver estratégias adaptativas. Isso não apenas informará a tomada de decisões, mas também contribuirá para a inovação em práticas mais sustentáveis.
E assim sendo, quais seriam os papéis dos entes federativos no caso Alagoano? A Agência Nacional de Mineração (ANM) é o órgão responsável por conceder as licenças de exploração dos bens minerais e sua fiscalização em todo o território brasileiro. No caso, específico cabe à ANM monitorar como está sendo a evolução da mina durante toda a sua operação, se está sendo condizente com o programado, para diminuir os impactos na sociedade e se a continuidade desse processo pode levar a algum desastre.
Já o papel do Serviço Geológico Brasileiro (SGB) é fornecer todo o arcabouço de estudos de geologia, impactos de um possível desastre em grande escala, além do monitoramento das condições hidrológicas dos rios e mananciais que estejam sobre influência dessa atividade de extração. A investigação das causas desse evento em particular se deu através dos estudos dos geólogos da SGB, um ano após os primeiros tremores.
Esse acompanhamento e fiscalização se fazem fundamentais para evitar ou mitigar possíveis ocorrências como essa em Maceió, além de órgãos municipais e estaduais de fiscalização ambientais.
Diante dos desafios apresentados, explorar alternativas sustentáveis para a extração de salgema torna-se imperativo. Tecnologias inovadoras, como a recuperação de áreas degradadas e a exploração de métodos de extração mais eficientes e menos invasivos, podem ajudar a reduzir os riscos geológicos associados à atividade.
Investir na diversificação econômica também pode aliviar a dependência excessiva da mineração de salgema, além de uma profunda avaliação entre riscos e benefícios econômicos, levando-se em conta que os impactos de acidentes como esses não serão resolvidos a curto prazo e assistência a famílias impactadas nunca será proporcional ao impacto imensurável nas suas vidas.
A situação atual em Maceió e a preocupação geotécnica em relação à extração de salgema destaca a complexidade dos desafios geológicos que as comunidades enfrentam, principalmente nas áreas urbanas. A interconexão entre processos geológicos, impactos ambientais e riscos sociais destaca a necessidade de uma abordagem holística para enfrentar esses problemas. A busca por soluções sustentáveis, combinada com regulamentações rigorosas e monitoramento contínuo, é crucial para equilibrar o desenvolvimento econômico com a preservação ambiental e o bem-estar das comunidades locais.
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