Eu preciso confessar para você que eu não gosto de falar sobre jejum, nem no meu programa na rádio, nem nas redes sociais. Isso, porque as pessoas são muito imprudentes – se eu escrevo um texto, por exemplo, explicando-o, e começo com algo do tipo: “Gosto do jejum porque…”. As pessoas já vão concluir que eu sou a favor dele e sairão praticando de qualquer jeito, sem se importarem com todo o conteúdo que vem depois. Ou, até com uma possível frase que poderia estar linhas depois dessa primeira, dizendo algo como: “(…)porém não indico que as pessoas façam jejum, e etc…”. Mas aqui no Portal Deviante é diferente. Vocês estão aqui para ler todo o conteúdo e, mais que isso, para questioná-lo, debatê-lo. E é por isso que eu amo todos vocês, viu?
Então vamos lá! Vou começar lembrando a vocês que as pessoas fazem jejum a séculos e séculos, afinal, existem inúmeras religiões que adotam essa prática. Ou seja, não existe moda nisso, o que acontece é que hoje já se tem muita informação sobre os benefícios e falta de benefícios dele na literatura científica, e, com a facilidade de acesso a essas informações, as pessoas estão tomando consciência disso. Consequentemente fala-se mais sobre jejum!
Jejum intermitente consiste em, basicamente, não comer por um período limitado de tempo. Pode ser 12, 16, 18, 24, 36 horas ou mais. O padrão mais utilizado é o 16/8. Ou seja, você faz a janela de alimentação de 8 horas ativas do seu dia, como, por exemplo, de 12:00 horas às 20:00 horas, e ao fechar a janela você entra em um jejum de 16 horas. Vale lembrar que consumir água, café sem açúcar e chás não quebram o estado de jejum.
Primeiramente, para aderir a essa estratégia, é preciso um ajuste prévio na alimentação. Para fazer jejum de forma natural, sem sentir fome, é importante que se tenha uma alimentação saudável e baixa em carboidratos (já falei sobre essa estratégia aqui, caso queiram saber mais). Isso já faz com que a pessoa naturalmente sinta menos fome.
Ao fazer o jejum, o seu corpo começa a queimar a energia armazenada (glicose e gordura). Se você queimar toda a glicose, você começa a queimar a gordura também.
Para entender este processo de armazenamento, basta usarmos como exemplo o momento em que éramos homens das cavernas, pois existiam dias durante o inverno em que não havia comida, e as pessoas simplesmente não comiam. É isso! Nossos corpos viviam da comida armazenada. É para isso também que serve a gordura – ela é energia alimentar armazenada para usar quando você não tiver comida. Então, se você sempre tem comida, nunca queimará aquela gordura.
Apesar de tudo isso fazer muito sentido, eu ainda não encontrei na literatura estudos que mostrem que a prática do jejum seja mais eficaz do que a mudança correta da alimentação, o déficit calórico, e a prática de atividade física para a perda de peso (se vocês conhecerem estudos assim, me mandem, por favor) .
Sim, é possível perder peso com jejum intermitente, claro. Afinal, se você tiver consciência e não sair compensando o tempo não alimentado, no momento de comer, haverá déficit calórico e o mais óbvio é que ocorra a perda de peso na maioria dos casos. Só que não precisa do jejum para fazermos esse déficit, entendem? Dá pra conseguir os mesmos resultados comendo bem.
Mas não podemos negar que existem outros benefícios mais interessantes do jejum intermitente. Um deles é o controle de doenças como a diabetes tipo 2, osteoporose, Alzheimer e outras. Vale lembrar que nesses casos é ainda mais indispensável o acompanhamento do nutricionista.
Há quem acredite que o jejum pode ser ruim para quem tem gastrite, por exemplo, ou pode ser prejudicial para praticantes de atividades físicas. Isso não é verdade, simplesmente porque a gastrite é uma inflamação na mucosa do estômago causada justamente pela alimentação errada. Então, se você diminui a ingestão alimentar, pode até vir a diminuir o problema. Claro, o mais importante não é a quantidade, é a qualidade, pois, se a pessoa tem gastrite, deve evitar alimentos inflamatórios. Quanto aos praticantes de atividade física, é importante que eles saibam que o que vai determinar os seus resultados é o que eles comem nas refeições que fazem, e não se comem de 3 em 3 horas, ou não. Além disso, a prática de jejum estimula a produção do hormônio do crescimento (GH), que é responsável pela densidade óssea e também pela hipertrofia.
Além desses efeitos, os estudos sobre jejum têm mostrado fortes relações do jejum intermitente com a expressão de alguns genes, em especial de fatores como a SIRT-1 e CPT-1 (dentre vários fatores), que são genes envolvidos com aumento da capacidade antioxidante e oxidação de gorduras. Estudos recentes têm associado maior expressão desses fatores em alguns tipos de jejum intermitente, como por exemplo o de 12 horas. Como resposta ao estímulo de fatores específicos vindos destes jejuns, estudos apresentam diversos resultados como a maior oxidação de gordura, diminuição de LDL colesterol, redução dos níveis de insulina, modulação da inflamação, etc.
“Mas e aí, nutri? O que você acha sobre isso?”
Não nego os benefícios do jejum intermitente, em especial, gosto dele para controle de inflamações crônicas. Mas de uma maneira geral, acho desnecessário abrir mão do prazer que é comer, em busca de vantagens que podemos ter comendo. Prefiro que os meus pacientes comam e comam felizes, afinal, se alimentar vai muito além de gerar energia ao corpo. Comer é um ato cultural e social que envolve fatores tanto físicos como psicológicos. Então, não gosto de abrir mão dessas experiências diárias, para ficar contando ansiosamente as horas do jejum. Claro, essa é apenas a minha preferência pessoal… Cada um tem a sua, certo?
Para quem também é feliz comendo, e quer ser feliz comendo de forma saudável, corram lá no meu Instagram, que tem muitas receitinhas com gosto e com nutrientes! Até a próxima!