A utilização da tecnologia para melhor desempenho é uma crescente nos esportes profissionais principalmente após a segunda guerra mundial quando diversos esportes se tornaram profissionais. Este fator é mais evidente em esportes em que o praticante necessita de um equipamento para a prática como o automobilismo e vela.
No caso do automobilismo podemos ver essa influência da tecnologia do equipamento comparando pilotos entre diferentes escuderias. Tomamos como exemplo o caso de Ayrton Senna e Nigel Mansell entre 1987 e 1992. Nos anos de 1987 e 1992 Mansell superou Senna em número de pole positions e vitórias enquanto entre 1988 e 1991 foi Senna o dominou. Nos anos em que Mansell se saiu melhor, a Williams dominou o campeonato por equipes e teve seus dois pilotos na dianteira da disputa individual. Nos anos em que Senna foi melhor que Mansell, foi a vez da McLaren estar a frente na disputa por equipes. Ainda que possa haver argumentos de qual piloto era de fato o melhor atrás do volante, é inegável a influência do equipamento disponível no resultado das corridas.
Em outros esportes essa influência não é tão evidente. O tênis talvez seja um destes casos. Ainda que pareça claro que a raquete influencia o desempenho do atleta, isto não parece ser uma vantagem com relação a outros atletas uma vez que jogadores profissionais de elite possuem recursos para adquirir o melhor equipamento disponível. No entanto, na prática cada advento tecnológico influencia de forma diferente dependendo do estilo de jogo, preparo físico, entre outros fatores específicos de cada atleta. Por vezes, novos produtos na verdade parecem atrapalhar alguns jogadores. No entanto, caso bem utilizado e aliado com uma boa estratégia, um advento tecnológico pode catapultar o desempenho de um tenista.
Um caso clássico na história do tênis é caro a nós brasileiros: a conquista de Gustavo Kuerten, o nosso Guga, em Roland Garros em 1997. O manezinho da ilha (a forma como chamamos naturais de Florianópolis-SC, sua cidade natal), então número 66 do mundo, surpreendeu até os entendidos de tênis, eliminando três ex-campeões de Roland Garros no caminho.
O que explicaria o sucesso repentino? Como um jogador que nunca havia ganho um título no circuito profissional do nada desbanca ex-campeões? Talento? Inspiração? Sim, sem dúvida houve uma boa dose de ambos, mas só isso explicaria como Guga colocou todos os adversários contra as cordas? Não, a tecnologia das cordas que utilizava, incipiente na época, reconhecidamente o ajudou na caminhada como ele mesmo já afirmou diversas vezes.
As cordas no tênis são o análogo do “acerto do carro” na Fórmula 1 da mesma forma que o carro e as raquetes são análogas. A Figura abaixo mostra esquematicamente a disposição das cordas. Via de regra, jogadores escolhem o material da corda e com que tensão ela tem que ser encordoada. Porém, como nos carros de Fórmula 1, os detalhes podem ser importantes e outros tipos de acertos são executados. Não é incomum tenistas colocaram cordas verticais (eixo Y) e horizontais (eixo X) diferentes e também com tensões diferentes.
Em uma primeira vista, parece que a física das cordas não parece difícil. Quando um tenista rebate a bola, as cordas fazem um “vai e volta” no eixo Z da figura acima. Quanto menor a tensão das cordas (mais frouxas), mais elástico será o impacto da bolinha com a raquete e portanto maior força é transferida para a bolinha possibilitando golpes mais potentes. Por outro lado, aumentando a tensão nas cordas, perde-se, portanto, potência.
Então jogadores colocam cordas bem frouxas para rebater com maior velocidade, certo? Não é bem assim. Esse ganho de velocidade ocorre com uma perda de controle sobre os golpes. Este ganho de controle já é mais difícil de explicar e medir. Potência de golpe podemos medir com base na velocidade da bola, mas como eu meço a precisão de um jogador?
Alguns estudos apontam que ao impactar com a bolinha de tênis, as cordas também movem lateralmente e esse movimento lateral é mais inconsistente (ou diferente a cada golpe) quanto menor a tensão das cordas. Voltemos a figura acima, quando rebatemos a bola esperaríamos apenas um movimento no eixo Z, o movimento de “elástico”. O movimento lateral seria as cordas verticais (paralela ao eixo Y) mover no eixo X (analogamente as cordas horizontais no eixo Y). Este movimento lateral, por consequência, altera o efeito e a direção da bola. Portanto, uma vez que com cordas mais frouxas esse movimento lateral é mais inconsistente, há uma perda de controle quando a tensão nas cordas reduz. Em resumo, os jogadores devem buscar um ajuste de cordas que tenha um bom balanço entre potência e controle
O material das cordas também tem influência. Na época, a grande maioria dos jogadores utilizavam cordas de tripa natural. O nosso manezinho, no entanto, utilizava cordas de poliéster que era uma novidade na época. Uma das vantagens das cordas de poliéster era sua durabilidade que por si só não é uma grande vantagem para tenistas profissionais. Afinal, eles possuem múltiplas raquetes e o custo de encordoamento é relativamente barato para eles. De qualquer maneira, a combinação das propriedades da corda utilizada e do estilo de seus golpes tornou-se uma arma para o jogo de Guga. Por motivos que ainda não eram conhecidos na época, os golpes de Guga aliava potência com top spin (rotação para frente da bola) que fazia seus golpes “pesados” inclusive para os campeões da época. A vantagem das cordas de poliéster parece ser uma combinação de diversos fatores incluindo não mover lateralmente e baixo tempo de impacto com a bolinha. Combinado, estes dois fatores permite o jogador imprimir mais “efeito” na bolinha e utilizá-los a seu favor sem perda significativa de potência.
Com ajuda desta tecnologia, Guga bateu três ex-campeões – Muster, Kafelnikov e Bruguera para se tornar o primeiro brasileiro campeão de Roland Garros. Foi o motivo único de sua vitória? Claro que não. Ainda que alguns jogadores quiseram banir cordas de poliéster no circuito, outros jogadores profissionais passaram a usá-las também. Guga ganhou Roland Garros ainda outras duas vezes com seus oponentes tendo a oportunidade de utilizar as mesmas cordas – e eu acompanhei cada ponto daquelas vitórias!
Portanto, certamente adventos tecnológicos podem ter seus impactos no jogo de tênis como Alberto Berasategui pontuou em uma entrevista concedida à casa de aposta esportiva Betway comentando sobre a rivalidade atual entre os tenistas Roger Federer, Rafael Nadal e Novak Djokovic. Nesta entrevista, ele comentou de outro advento tecnológico recente no tênis: o apontamento eletrônico de quando uma bola foi dentro ou fora. Berasategui toca em um ponto importante. Na última final de um torneio importante entre Roger Federer e Rafael Nadal (Aberto da Austrália de 2017), o título de Roger Federer foi confirmado por este tipo de tecnologia. Em outra partida prévia, no torneio de Cincinnati em 2013, viu-se que o ponto que decidiu a vitória de Rafael Nadal contra o mesmo Federer foi uma bola de Nadal que saiu por milímetros – e a partida não finalizaria naquele momento.
Portanto a análise de Berasategui é certeira. Berasategui afirmou que Djokovic (17 títulos) possivelmente ultrapassará Roger Federer (20) e Rafael Nadal (19) em títulos de Grand Slam ao final de suas carreiras. Só o tempo irá dizer se ele está certo. E será que outro advento tecnológico terá papel importante na disputa? Quanto a outros eu não posso afirmar, porém posso afirmar com certeza que as cordas de poliéster é uma arma que Rafael Nadal usou com maestria para conquistar seus 12 títulos de Roland Garros na sua coleçã. Com uma combinação de técnica de golpe, força e talento, aliado com as cordas de poliéster, ele produz um poderoso forehand com uma rotação (“top spin”) incomparável com qualquer outro tenista profissional. O golpe com 5000 revoluções por minuto cria grandes dificuldades para o backhand de Roger Federer e auxiliou nas suas 6 vitórias sobre este tenista nas quadras de saibro de Paris. Será que as cordas de poliéster ajudará Nadal a levar mais canecos de Roland Garros? Não sabemos, mas você pode apostar no resultado das próximas partidas e torneios.
Referências
Lindsey, Crawford, “String Movement and Spin”, Site Tennis Warehouse
Goodwill, Simon, “Does Higher String Tension Give More Control and Spin?”, Tennis Industry Magazine, Issue of January, 2005.
Figura do esquemático das cordas adaptado de Paul Zarda
Foto do Guga retirado de um post da Tennis Magazine em francês e do site Tennis Buzz.
Este texto é uma parceria com a Betway