Recentemente, presenciamos em São Paulo mais uma edição da Comic Con Experience, megaevento anual dedicado à cultura pop e aos quadrinhos. Foi minha primeira vez na convenção, e pude constatar com grande alegria o prestígio de que vêm gozando as Graphic MSP, selo de graphic novels da Mauricio de Sousa Produções publicado desde 2012. Tive a oportunidade de acompanhar o painel com Mauricio de Sousa e sua equipe, comprar alguns títulos que estavam faltando na minha estante, e até mesmo encontrar com alguns dos autores do projeto na Artist’s Alley. E tudo isso me fez refletir sobre o impacto que o selo vem tendo na minha vida literária nos últimos anos.
Meu primeiro contato efetivo com a coleção se deu há 2 ou 3 anos, quando entrei em uma livraria e fui inevitavelmente conquistado pela capa de Mônica – Força (2016). E, de cara, esse quadrinho já me contou muita coisa sobre a essência do projeto.
Primeiro, me disse muito sobre o que torna cada Graphic MSP única, diferente das demais. Afinal, a Mônica, retratada nessa publicação por Bianca Pinheiro, difere muito, em traço e em texto, da Mônica imaginada por Victor e Lu Caffagi na trilogia Laços (2013), Lições (2015) e Lembranças (2017), também parte do selo. Comecei a entender que as Graphic MSP eram uma forma de abrir a essência dos personagens clássicos de Mauricio de Sousa para que outros autores os desenvolvessem. Com isso, por vezes geravam a possibilidade de ganharmos mais de uma visão distinta sobre um mesmo personagem.
Segundo, e talvez mais importante, Mônica – Força também me disse muito sobre o que torna todas as Graphic MSP fundamentalmente semelhantes. Perceba a singeleza do título: Força. Uma palavra simples, que resume perfeitamente uma das características mais icônicas da personagem em questão. E que, no entanto, ganha um significado tremendamente mais profundo e tridimensional ao longo da história.
E eis aí a constante principal do selo Graphic MSP. Transportar os personagens que conhecemos tão bem para novos níveis de profundidade, permitindo que seus estereótipos floresçam e deem vazão a histórias e reflexões extremamente delicadas. Coisas que as revistinhas periódicas dificilmente comportariam. A sensação é quase como se os personagens de Mauricio de Sousa servissem como arquétipos, e a partir deles os diversos autores das Graphic MSP ganhassem permissão para criar pessoas reais.
Talvez o exemplo mais poderoso desse direcionamento seja Jeremias – Pele (2018), de Rafael Calça e Jefferson Costa. Nesta HQ vencedora do Prêmio Jabuti, o coadjuvante negro da Turma da Mônica se transforma na peça central de uma história que fala sobre racismo e discriminação, mas também sobre uma jornada de autoconhecimento e aceitação.
Posteriormente, percebi que dessa linha mestra da coleção deriva uma outra característica do selo, fundamental para torna-lo tão atraente e envolvente. Comecei a entender que a enorme diversidade de personagens criados por Mauricio de Sousa ao longo de décadas, somada à profundidade característica da coleção, permitia que as Graphic MSP cobrissem um leque gigantesco de gêneros narrativos.
É bem verdade que o forte dessas HQs está no drama, carro-chefe nas já citadas Mônica – Força e Jeremias – Pele, e presente em maior ou menor grau em tantas outras. Mas experimente ler Chico Bento – Pavor Espaciar (2013), e vai se deparar com uma qualidade de humor baseada em movimentos e expressões que chega a lembrar Charlie Chaplin. Leia o Astronauta de Danilo Beyruth, que está prestes a chegar ao 5º título, e encontrará histórias que mesclam ação e ficção científica de forma extremamente envolvente. E o que dizer de Bidu – Caminhos (2014), em que Eduardo Damasceno e Luis Felipe Garrocho praticamente transformam o cão azul em um Forrest Gump conforme ele narra sua jornada?
E, diante de tamanha profundidade e diversidade, finalmente entendi o peso que essa coleção assumiria nos meus hábitos de leitura. Assim como o mundo e as relações interpessoais têm uma tendência a se tornar mais complexos e cheios de nuances conforme passamos da infância para a idade adulta, também os personagens de Mauricio de Sousa vêm assumindo esse caráter conforme passam das revistinhas periódicas para os livros Graphic MSP.
Qualquer que seja a edição ou o personagem-foco, percebi que a sensação de ler uma HQ dessa coleção está muito relacionada a esse casamento de sentimentos: um retorno nostálgico aos personagens que nos marcaram na infância, e a partir disso o florescimento de reflexões extremamente pertinentes à vida adulta.
As Graphic MSP invariavelmente se apresentam como experiências emocionais. E invariavelmente se provam experiências transformadoras. Prepare os lenços e leia de coração aberto.
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O selo Graphic MSP é publicado desde 2012 pela Mauricio de Sousa Produções, e já conta com 25 títulos publicados, além de 4 anunciados para 2020.