Seguindo com a série de entrevistas com pesquisadores brasileiros que estudaram fora do país, hoje vamos conhecer a pesquisadora PhD. Luiza Gomes e seu caminho das pedras para estudar nos EUA.
Olá, Luiza. Pode nos contas um pouco sobre você?
Meu nome é Luiza Gomes, sou de Florianópolis/SC, tenho 33 anos. Eu venho de uma família grande, cheia de tios, tias e primos que me ensinaram muita coisa na vida e até hoje me guiam e apoiam. Adoro animais, cachorro, gato, periquito, porquinho da índia, e, se pudesse, teria muitos. Eu não tenho muitos hobbies… Gosto de ler, ver filmes e essas coisas normais que todos gostam. Atualmente divido a minha vida entre trabalho, falar por WhatsApp com o meu namorado e com a minha mãe.
E sobre a sua formação acadêmica? Qual é a sua área e como chegou até lá?
Eu demorei muito tempo para decidir o que queria fazer da vida, trabalhei em várias coisas diferentes, call center, recepcionista de hotel, vendedora de praia, mas aos 21 anos decidi que queria fazer física. Foi um percurso difícil, pois, apesar da decisão, houve muitos momentos em que me questionei se era isso mesmo que eu queria, se essa profissão me daria um futuro e todas essas coisas que passam pela nossa cabeça enquanto estamos cursando a universidade.
Por algum motivo, talvez minha mãe, talvez meus amigos da faculdade ou até mesmo a minha força de vontade fizeram eu continuar e terminar o curso. Durante a graduação eu fiz muitos estágios na parte da educação e me apaixonei incrivelmente por divulgação cientifica e ensino não formal para crianças e adolenscentes. Trabalhei um bom tempo com isso do meio até o final da graduação. Quando me formei, eu acreditava que o meu caminho era na educação do ensino de física, então passei em um concurso para lecionar no laboratório de ciências de uma escola da prefeitura de Florianópolis.
Lá eu tive experiências maravilhosas! Pude trabalhar com crianças e adolescentes que mudaram meu jeito de ver o mundo e a ciência, além claro da oportunidade de montar um laboratório educacional do zero. Apesar de gostar muito do meu trabalho e do que eu estava criando e aprendendo, eu sentia diariamente que estava faltando algo no meu dia-a-dia. Foi então que tive a ideia de fazer a prova do mestrado do Bacharelado na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Para a primeira prova que eu fiz, não estudei nada e não passei, obviamente, mas aquilo despertou uma vontade em mim.
Então fiz as minhas contas, análise financeira e vi que eu poderia ficar sem trabalhar por um tempo, até o final do ano, e com muita coragem pedi demissão do meu emprego e decidi estudar para passar na prova de mestrado. A prova foi dois anos depois e consegui tirar um nota um pouco acima do mínimo e pegar a última bolsa da CAPES!!!! Um pouco antes de começar o mestrado, eu já comecei a procurar orientadores. Isso porque eu tinha uma ideia de que queria fazer algo voltado para aplicação médica ou biológica. Mandei alguns emails e para minha surpresa um dos professores mais renomados do meu departamento topou fazer um projeto comigo com aplicação na biologia. Lembro até hoje o quanto eu fiquei feliz e me senti orgulhosa por ele ter aceitado me orientar.
Em março de 2013 iniciei a minha carreira de pesquisadora teórica. O primeiro ano de mestrado foi um desafio aterrorizante e incrivelmente apaixonante. Eu tive que fazer disciplinas no nível de pós-graduação que eu não tive na graduação, por ter feito licenciatura. Foi muito difícil, mas aprendi muito nesse processo.
Como você se informou sobre essa oportunidade de estudar fora? Como foi o processo de inscrição/avaliação? Você recebeu financiamento? Como conseguiu?
No final do meu primeiro semestre como mestranda, meu orientador pediu que eu escolhesse um tema de uma lista para apresentar um seminário na disciplina dele e o resultado foi que eu gostei tanto que acabei usando esse tema para o meu projeto. Curiosamente o primeiro artigo que eu li sobre o assunto do meu projeto era do meu atual orientador. Lembro que na época fiquei encantada e cheguei a entrar no site do grupo de pesquisa dele e pensar “Nossa seria muito massa estudar lá”.
Um ano depois disso, por um destino da vida ou não, esse pesquisador estava visitando o Brasil e o grupo de pesquisa em que eu iria fazer o meu doutorado. Então eu mandei um e-mail despretencioso para ele, com a intenção de expandir o meu network apenas, sem nem pensar que era possível ser aluna dele. Ele perguntou se eu gostaria de conversar por skype, e marcamos um conversa.
Naquela conversa rápida, ele me perguntou se eu gostaria de aplicar para fazer o doutorado com ele na Rice University em Houston. Sem pensar muito eu disse SIM!!!! Aí comecei o processo de aplicação para a bolsa do Ciência sem Fronteiras. Depois de muito trabalho para escrever projetos, conseguir documentos e estudar/fazer provas, em janeiro de 2015 veio a resposta: eu havia sido aceita com bolsa integral pelo programa de doutorado do Departamento de Química da Rice University.
Eu não cabia em mim de tanta felicidade! Lembro inclusive que quando eu recebi a carta eu não entendi que eu tinha ganho a bolsa pela Rice. Lembro que eu sai incomodando todo mundo perguntando se eu tinha entendido certo, porque achava que só seria aceita se eu ganhasse a bolsa do Csf. Entretanto, para minha surpresa e felicidade eu fui aceita mesmo sem ganhar a bolsa do CsF. Um sonho realizado que eu nunca achei que seria possivel!!!
Como foi a experiência lá do ponto de vista acadêmico?
A vida acadêmica aqui não é muito diferente da do Brasil. Trabalha-se muito e acabamos vivendo mais dentro da universidade que fora dela. Uma das maiores diferenças que eu senti foi quanto ao ritmo das aulas e a forma de avaliação aqui. As aulas são curtas e poucas durante a semana, porém o número de atividades fora de sala que temos que realizar é bem pesado. Nas avaliações o maior desafio é o tempo e não a dificuldade das questões em si.
Outra diferença crucial, que torna o doutorado bem cansativo nos primeiros anos é a obrigatoriedade de trabalhar como Teacher Assistant (TA) por um número não menor que 3 semestres, mas que varia dependendo do departamento. Ser TA toma muito tempo, pois você acaba se envolvendo na correção e preparação de aulas por pelo menos 20h da sua semana.
Um aspecto diferente aqui, mas que também varia de acordo com cada departamento, pois pode ser obrigatório ou não, é que temos a oportunidade de participar de muitos seminários semanais com pesquisadores renomados de diferentes áreas além de inúmeras oportunidades para apresentar o nosso trabalho. Confesso que no início me incomodava com o número de seminários que tinha que ir (aproximadamente 20 apresentações por semestre), porém agora eu consigo ver a importância disso.
É fundamental para o nosso desenvolvimento como cientistas estar exposto a esse tipo de evento. Além disso, a Rice mantém uma rede de suporte para aluno se desenvolver e aprender o melhor possível. Ficam disponíveis para os alunos: centros de aprimoramento de escrita e apresentação oral; centro de aconselhamento de carreira; centro de desenvolvimento de novos líderes, entre outros.
E no dia-a-dia, pode nos contar como foi?
O dia-a-dia, como eu falei, antes pode ser bem parecido com a vida em um universidade brasileira. As obrigações básicas são as mesmas, ir as aulas, pesquisar, etc. Entretanto, no campus da Rice você tem a oportunidade de se envolver em atividades extra curriculares, como participar de grupos estudantis variados. A universidade estimula os alunos a participarem em atividades fora da pesquisa a todo momento, e disponibiliza maneiras diferentes que podes se envolver.
Quais as melhores coisas de ter estudado fora?
Acho que a melhor coisa de ter estudado fora foi conhecer e formar amizades com pessoas do mundo todo e estar exposta a tantas culturas diferentes em um só lugar. Isso acontece especificamente na Rice pois a universidade tem um campus bem “internacinalizado”. São mais de 70 nacionalidades diferentes presentes, isso é muito enriquecedor.
Além disso, passar pelo desafio de fazer o doutorado em um país diferente, em uma língua diferente traz desafios e superações diferentes que eu jamais teria oportunidade de passar caso decidisse ficar no meu país.
Uma das coisas que eu mais repito é que o meu crescimento científico aqui foi muito grande, mas nada comparado ao meu crescimento pessoal. Hoje eu posso dizer que me conheço muito melhor, sou mais empática, flexível, compreensível e aprendi como lidar com situações de estresse de uma maneira completamente diferente do que fazia antes de vir para cá .
Qual é a sua situação atual? O que vem pela frente?
Eu estou terminando meu doutorado agora. A defesa da tese foi no dia 2 de julho. O plano e a vontade é voltar para o Brasil, mas vai depender das oportunidades de emprego ou pós-doutorado. Estou atualmente escrevendo projetos para as agências de fomento do Brasil e espero que eu consiga a bolsa.