– Edgardo, preciso que volte a vila e os avise. O restante da guarda precisa estar preparado, as outras pessoas precisam ser informadas sobre o que aconteceu com Evelina, sobre o que há nessa floresta, entendeu? – ordenava Álvaro Ferri, último guarda mais experiente da vila da Vigília.

– Mas podemos derrotar essa criatura.

– Não podemos correr esse risco, entenda o pedido do Ferri. Vá, amigo! A vila precisar saber sobre esse perigo, daremos uma vantagem a você, se passarmos por isto, vamos encontrar Evelina com certeza – Enrico concordava com a ideia.

Enrico mentia para seu amigo, não acreditava mais que a irmã estivesse viva. Dentro dele, uma tristeza, um sentimento de raiva e revanche crescia, não queria que isso impedisse sua concentração para a luta iminente.

A criatura ameaçava atacar, soltou um grande rugido e tentou correr na direção de Edgardo, mas foi impedida por Álvaro Ferri. O monstro rosnava enquanto mostrava os dentes, ameaçando o velho guarda. Assim, Edgardo correu em direção a vila desejando boa sorte aos amigos. O monstro quase ficou entre Álvaro e Enrico, tentou uma investida contra Ferri. Enrico tentou aproveitar uma abertura, mas o lobisomem esperava por esse movimento e aproveitou para atacar com o braço. Tamanha foi a força que jogou Enrico a alguns metros. Álvaro aproveitou o movimento para atacar a perna esquerda do monstro, uma estocada que fez o bicho berrar de raiva. A criatura, em fúria, segurou pelos braços o guarda, que se debatia, mas não tinha como fugir. Bastou uma poderosa mordida no pescoço para arrancar carne, músculos e ossos e deixar o corpo do pobre guarda inerte e sem vida.

A criatura virou-se para o próximo alvo, sua boca e presas estavam vermelhas de sangue. Enrico quase perdeu a razão tamanha a raiva que sentiu, mesmo assim, manteve a postura de combate e incitava a criatura a atacar. Quando o monstro investiu, Enrico deu um grito de raiva e aguardou o momento certo. Foi um golpe da direita para a esquerda na garra monstruosa da criatura, que ainda lançou para longe o escudo do guarda. Enrico respondeu com um golpe inesperado, mas, apesar de a criatura fazer uma rápida esquiva, acabou tomando um corte considerável no “braço” direito. A raiva tomou conta do amaldiçoado, que tentou uma mordida. Enrico desviou, mas as presas da criatura se engancharam na cota de malha do jovem. A criatura tentava morder, depois começou a sacudir a cabeça para se soltar do guarda. Enquanto ela tentava prendê-lo com os braços, Enrico foi mais rápido e aplicou um golpe forte, cegando um olho da criatura. A reação do bicho foi terrível. Tomada pela fúria, a criatura aplicou um golpe no peito de Enrico, sua cota de malha se partiu em pedaços, seu elmo caiu longe, Enrico voou e parou acertando uma árvore. Mal podia respirar, nem tinha forças para se levantar. O lobisomem berrava de dor e caminhou em duas patas com alguma dificuldade. Quando chegou perto de Enrico, levantou o corpo dele e disse:

– Humano, você não vai morrer tão fácil, vai sofrer ainda algumas horas, vou te desmembrar aos poucos seu desgraçado – as palavras nem soavam humanas parecia um rosnar.

Então, o jovem Enrico perdeu os sentidos por algumas horas. Quando acordou, estava deitado numa espécie de leito feito de peles, seu corpo estava pálido, não sentia dor e mal via alguma coisa a sua frente. Uma moça chorava deitada sobre seu peito, uma garota de cabelos loiros encaracolados e olhos verdes. Suas finas feições e beleza deixavam qualquer homem caído por ela na vila onde vivia, seu perfume era inconfundível. Sua irmã Evelina chorava, e vê-la bem e viva deixava o jovem muito feliz. Por pouco, Enrico não deixou que seu espírito caminhasse para junto dos antepassados.

– Enrico, você está muito ferido, não vai resistir… Ainda bem que você está consciente – várias lágrimas rolaram do rosto da jovem garota – Você precisa aceitar, é o único jeito de sair vivo. Você tem que se tornar um deles…

– Eu não…. Virar algo ass… Eveli… – as palavras mal saiam

– Não posso ficar só aqui. Estamos na vila deles, não me deixe só, por favor. Preciso de ti, por favor, meu irmão, por favor. Preciso que aceites, ele me quer como esposa…

Foi um pequeno momento de silêncio entre os dois, mas Evelina viu o olhar do irmão mudar, os olhos voltaram a desejar vida.

– Eu… aceito… – ainda com alguma força, agarrou o braço da irmã que chorou ainda mais…

– Desculpe-me por ser egoísta, por pedir isso a ti.

– Incrível, ele é bem resistente. Será um Filho da Noite? – indagava uma mulher que observava calada a cena.

– Isso nunca será um irmão meu. Faça. Será uma sombra. Aproveite enquanto essa carcaça ainda tem vida – o homem saiu do local bastante irritado.

– Evelina, precisamos tirá-lo daqui. Vamos levá-lo para o centro da vila para iniciá-lo – a mulher ergueu o corpo do guarda com facilidade.

– Vamos, não deve ter muito tempo, pode desmaiar a qualquer momento.

Bluma carregou o corpo de Enrico até o meio da vila. O jovem ainda matinha a consciência como muito esforço. Evelina segurava sua mão torcendo pelo irmão. Enrico foi colocado no meio da aldeia com várias pessoas ao redor, a mulher levantou o braço, e foi feito silêncio:

– Ele é um dos nossos! Um novo irmão para os sombras! – gritou a mulher morena para aqueles que estavam ali perto

Alguns riam debochando da situação, outros imitavam uivos de lobos, e vários outros apareceram para acompanhar o ritual. A mulher olhou para a Lua, curvou-se um pouco e começou a se transformar. Rapidamente a forma feminina mudava para uma criatura com pelos cinzentos, grandes caninos brancos, olhos amarelos e grandes garras. A criatura rodeou o corpo de Enrico. Evelina parecia paralisada ao presenciar a mudança. A criatura parou ao lado de Enrico.

– Então, meu jovem, deseja se juntar ao clã da sombra? Lembre-se está pedindo um presente da Lua, só ela decidirá se você tem o direito de receber. Qual a sua resposta? – perguntou a monstruosidade.

– Eu, Enrico… Rizzi – os olhos do guarda derramaram lágrimas – aceito a oferta, desej… Ser mais um de vocês – a voz do guarda falhava, poucos minutos de vida restavam para ele.

– Muito bem! – rosnava a criatura.

A criatura se posicionou sobre Enrico e mordeu o jovem na altura do ombro esquerdo, as marcas ficaram na altura do peito até chegar no ombro. Ele deu um enorme grito que pode ser ouvido por quase toda a aldeia. Gritava olhando para a lua, pedia por uma chance para salvar sua irmã e, antes de desmaiar, quando seus olhos já fechavam, eles mudaram do natural castanho para o amarelo da lua…