Não importa sua condição social, salário e nem a cidade que você mora: os preços estão ficando mais caros para todo mundo. A inflação de 2021 ficou em 10,06%, muito por conta de um movimento global de inflação depois do pico da pandemia de Covid. Para se ter ideia, o índice de preços subiu 5,8% nos EUA – o maior índice desde 1982. O problema é que, por aqui, não parece que a situação está sob controle.
O Banco Central começou uma subida mais forte de juros em meados do ano passado e esperava-se que os efeitos já pudessem ser vistos. Mas os quatro primeiros meses de 2022 trouxeram ainda mais inflação. Nos últimos 12 meses terminados em abril, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) está em 12,13%.
Se analisarmos os componentes do índice medido pelo IBGE, os principais vilões ficam mais evidentes: alimentos e transportes puxam a fila nos últimos dois meses.
Dados: IBGE
Assim como no IPCA, há mais de um vilão nessa história sem final feliz. Podemos apontar três grandes movimentos com impacto nos preços:
- O carrego inercial da inflação do ano passado.
- O conflito entre Rússia e Ucrânia.
- A política zero-Covid na China.
A inércia mantém a inflação subindo
Historicamente, o Brasil é um país com inflação inercial, isto é, os preços sobem hoje porque subiram no passado, e os de amanhã vão subir porque subiram hoje. Esse ciclo vicioso foi o que causou a hiperinflação dos anos 1980 – mas hoje em dia acontecem em uma escala muito menor.
Ainda assim, muitos produtores e prestadores de serviço viram o preço de seus insumos aumentarem na pandemia sem poder repassar aos clientes, e agora estão tirando um pouco do atraso. Não podemos culpá-los, a vida está realmente bem cara e não repassar aumentos pode levar um negócio à falência.
Para evitar que a roda perversa continue a girar, o Banco Central intervém com juros e outras medidas para tentar acalmar a economia. Mas isso não está funcionando porque os dois próximos fatores – internacionais e fora do alcance de Brasília – estão pesando demais.
O conflito Rússia e Ucrânia
Além do óbvio desastre humanitário que um conflito dessas proporções causa no mundo, o impacto econômico está sendo muito forte em diversas frentes. O mercado de alimentos europeu está sofrendo um enorme choque, com a falta de produtos e subida de preços. As sanções estão impactando negócios em todo o mundo. E no Brasil, não faltam consequências.
Por aqui o maior impacto está sendo o preço do petróleo e seus derivados. Sendo a Rússia um dos maiores produtores do mundo, o embargo internacional forçou o preço da commodity para cima. A consequência local é aumento vertiginoso nos combustíveis (como nossa matriz de transporte é extremamente dependente do sistema rodoviário, todos os produtos dependem direta ou indiretamente do petróleo) e dos fertilizantes. Também fomos afetados pelo preço do trigo, muito consumido no pão nosso de cada dia, mas um insumo praticamente todo importado.
Nem mesmo a queda do dólar nos primeiros meses do ano (que já se reverteu), conseguiu amenizar a subida de todos esses insumos.
E a cereja do bolo: Política zero-Covid na China
Em 2021, já era esperada uma pressão inflacionária de ordem global. Isso porque a balança de oferta e demanda estava desequilibrada. Durante o fechamento da economia, houve queda na produção de itens e gargalhos logísticos – o que fez com que vários produtos desaparecessem das lojas.
Mas não foi só isso. Como já citei neste texto o consumo das família sempre tem um pico após crises, como a que vivemos em 2020. O movimento foi aprofundado pela renda extra da classe média global que não podia mais gastar com viagens e outras atividades fora de casa, e que foi parcialmente revertida para consumo de bens. Somando a isso o gargalo logístico por conta de fechamentos em todo o mundo e já sabíamos que conforme as restrições sanitárias fossem removidas, o consumo retornaria e os preços seriam pressionados.
Contudo, a lógica econômica ditava que, junto com o consumo, uma boa parte da produção também seria retomada e o ajuste de preços seria mais razoável. O que ninguém esperava é que a China implementasse medidas tão restritivas que se chamam “zero-covid”, pressionando novamente o lado produtivo, e isso está derrubando o dominó global ao manter as fábricas e portos fechados.
Talvez o fato de o mundo inteiro estar sofrendo com a inflação deveria nos consolar, mas, na realidade, não. As expectativas eram de que, em 2022, o Brasil já conseguisse fechar com inflação de cerca de 6% – mas já passou dos 4% em apenas 4 meses. Analistas de mercado já falam em IPCA em dois dígitos novamente para este ano.
E tudo isso embrulhado para presente em um ano eleitoral com recessão e pouca recuperação do mercado de trabalho. Talvez exista uma luz no final do túnel, mas pelo o que podemos ver, esse túnel vai além de 2022.