Alex não acreditava no que tinha acontecido, seu poder tinha sumido e não conseguia mais usar. Cabisbaixo, olhava para os próprios pés enquanto o carro chacoalhava. Estava sendo levado no banco de trás de uma viatura. Pedira ajuda na estrada, depois que escapou e um casal de idosos o socorreu levando o garoto para a delegacia próxima. O delegado de lá entrou em contato com a capital que enviou três viaturas para buscá-lo. Agora, estava voltando para casa, mas não estava feliz, ainda se culpava demais pelo que acontecera.
– Como fui fazer aquilo? Não deveria ter perdido o controle – pensava muito triste.
Fora acordado de seus pensamentos quando uma multidão cercou as viaturas antes de entrarem na delegacia. Dezenas de repórteres queriam as imagens do menino que tinha sido sequestrado pela manhã numa ação ousada de quatro criminosos.
Dentro do local, encontrou a mãe e a irmã e choraram de felicidade por algum tempo. Alex ficou quase três horas na delegacia contando como conseguiu escapar sem tocar no assunto do seu poder. Um grupo de policiais foi enviado ao local do cativeiro, mas ninguém foi encontrado lá, o local ficou isolado.
Alguns dias depois, um grupo de pessoas usando ternos pretos apareceu para investigar relatos curiosos dos policiais. Analisaram principalmente o buraco na estrutura onde supostamente Alex tinha sido mantido e uns resquícios de sangue em outro local.
Longe dali, o chefe do sequestro, conhecido como Primo, depois de ficar uns dias sumido esperando a poeira baixar, apareceu para conversar com Marcelão. O chefe tinha muita confiança no Primo, pois qualquer um que chegasse com uma história maluca dessas com vacilo de pegar a criança errada, já tinha sido eliminado há algum tempo.
– E então, Marcelão? Como vamos fazer? – perguntou Primo.
– Como assim? Quer ir atrás desse moleque? Tá doidão mesmo? Fazer outra cagada? – respondeu perguntando bastante irritado
– Se a gente pegar esse moleque, vão fazer uma confusão e vão chegar em mim! Eu não quero ir em cana! Tão pouco deixar de encher os meus bolsos com as bocas que tenho! – gritou ainda mais exaltado.
– Tô fora dessa merda, isso só dá trabalho e o povo da TV fica em cima. P@#%#&@! – não parava de gritar com o Primo.
– Essa sua informação sobre esse moleque vai valer uma grana no futuro, vamos esperar um pouco para soltar, beleza? – “sugeriu” essa ideia.
– Claro, claro. Vou ficar calado, só falei para “tu” – concordou imediatamente Primo.
– Quem sabe esse moleque atrapalha a concorrência ou acaba morto. Se o garoto vacilar, ainda tenho a chance de mandar um Vader, né? Que tu acha, hein? – falou Marcelão coçando a barba e rindo.
– Esse Walter é um matador seu? Eu tenho um conhecido no interior que manja bem do serviço – disse Primo com um sorriso perverso.
– Cala boca, caba burro! Tem cultura não! Vaza logo daqui, tenho o que fazer! Estamos combinados, boca calada sobre isso com a galera, valeu!? – ordenou Marcelão bem irritado.
– Sim, chefe! Tô saindo! – Primo concordou desaparecendo o mais rápido possível.
Alguns dias depois, Alex estava voltando para a escola, ficou uma semana sem pisar lá. Ficou conversando com os amigos pelo smartphone da mãe e ganhou o triplo de créditos no jogo para felicidade dele. A mãe pensava que Alex estava chateado pelo que tinha acontecido, talvez traumatizado, mas o garoto estava triste porque não conseguia usar seu poder. Marquinhos era o único que Alex confiou para contar seu segredo, mas ainda não conseguiu convencer o amigo.
No dia da volta, foi recebido com muitos sorrisos e abraços por funcionários, professores e amigos. Durante a aula, seus amigos e outros colegas perguntavam como tinha sido, como tinha escapado. Usou a mesma história que contou na delegacia, aproveitou um remendo na parede para fazer uma abertura e escapar. Os bandidos estavam comendo e discutindo, não notaram a fuga dele. No recreio, não teve tempo para conversar com os amigos, muitos estranhos queriam saber tudo sobre o acontecimento.
Naquele dia, Marquinhos tinha convidado Alex para almoçar e passar o dia na sua casa, já estava tudo combinado entre as mães. A família de Marquinhos tinha um pouco de culpa, já que o alvo dos sequestradores era ele.
Durante o caminho para casa, conversaram bastante sobre o que tinha acontecido, algumas vezes eram interrompidos pela mãe de Marquinhos.
– Tá, acredito um pouco mais em você, essa sua história de fuga é estranha – disse Marquinhos cochichando.
– O delegado realmente acreditou nisso? – perguntou falando bem baixo.
– Como assim? Não quis contar que fiz um buraco para fugir, não sei o que pode acontecer se descobrirem sobre meu poder. Vai que desapareço e fazem testes em mim – explicou Alex.
Depois que almoçaram, Marquinhos estava ansioso para ver o que Alex poderia fazer.
– Vamos lá fora! Que tal você tentar levantar o carro da mamãe? – perguntou Marquinhos.
– Acho que vou destruir o para-choque ou amassar o carro, vamos pensar em outra coisa, tá bom? – sugeriu Alex desanimado por achar que nada daria certo.
– Que tal… Aquela pedra grande ali. Não sei que graça minha mãe vê nisso no jardim – sugeriu o amigo apontando.
Alex se posicionou, colocou as mãos em volta da grande pedra, fez força, mas nada aconteceu, além de ficar mais frustrado.
– Vamos, Alex! Você consegue! Pensa que você ainda está em perigo! Tenta ficar com medo, talvez isso tenha acordado algo em você! Vamos lá! – sugeriu Marquinhos empolgado.
Alex pensou em tudo que aconteceu. No medo que sentiu, lembrou da angústia de não saber se iria viver, lembrou do local, do cheiro, do medo. Ele agarrou a pedra com muita seriedade e nada aconteceu outra vez. Sentou na grama frustrado com aquilo.
– Cara, faz igual aos filmes e aos desenhos! Usa a sua raiva! Lembra de tudo e explode! Você vai conseguir! Vai! – Marquinhos tentou animar o amigo ainda empolgado.
Lembrou da raiva que sentiu quando foi levado e espancado, lembrou da mãe e da irmã chorando. Sentiu a raiva crescer no peito e fervilhar na cabeça, agarrou aquilo com ímpeto enquanto tentava levantar, lembrou outra vez das bofetadas que tomou, nada aconteceu…
– Droga! Droga! Que #@$#@! – reclamou Alex muito frustrado.
– Você não se enganou? Tipo será que a estrutura não estava frágil e fácil de… – Marquinhos tentou considerar.
– Eu sei o que fiz! Estava todo machucado e fiquei bom, joguei uma rocha grande contra os bandidos… – respondeu bem irritado.
– O que vocês dois estão fazendo? – perguntou Arthur, irmão mais velho de Marquinhos.
Arthur estava se preparando para ir a faculdade quando viu o que os dois estavam fazendo, não escutou a conversa, mas entendeu o queriam fazer.
– Para mover isso aí, vocês precisam fazer uma alavanca! – explicou o jovem indo para dentro de casa.
Os dois ficaram surpresos, mas Alex logo voltou a ficar chateado.
– Não entendo! Parecia tão natural! Porque não funciona agora? – Alex se perguntava sentado no chão.
– Talvez fosse o momento de medo com outras coisas misturadas, mas não tem como você usar isso para manifestar sua força – explicou Marquinhos.
– Já pensou? Seu apelido seria “garoto angústia” – disse Marquinhos rindo, conseguindo uma cara séria de Alex.
– Ah! Esquece isso! Penso em algo em outra hora, melhor fazer a tarefa de casa – sugeriu se levantando.
– Depois a gente vê algum filme, que tal “Star Trek”? – perguntou Marquinhos, conseguindo outra cara bem séria de Alex.
A tarde passou bem rápido, a mãe de Marquinhos tratou Alex com muita atenção, mas ele não tirava da cabeça a frustração de não conseguir usar seu poder. No final da tarde, Arthur deixou Alex em casa e perguntou sobre o que tinha acontecido, Alex novamente contou o mesmo que tinha falado na delegacia e na escola. Arthur também achou a história estranha, mas não passou muito tempo pensando nisso.
Durante a noite, Alex ainda estava muito distraído, sua mãe e sua irmã estavam preparando o jantar, estavam fazendo um sanduíche bem temperado com carne. A mãe dele olhava para o garoto de tempos em tempos, ria e voltava a preparar a comida com a filha.
Agora estavam jantando, Alex ainda estava perdido com seus pensamentos, Renata perguntava sobre a tarde e ele respondia sem dar muita atenção, terminou de jantar e estava tomando o restante do suco quando notou que as duas não paravam de rir.
– Qual é a piada? Vocês não param de rir – perguntou o garoto contrariado.
– Consegui! E aí? Estava mais gostoso? – perguntou Jéssica bem animada ao filho.
– O que? O sanduíche? Estava… – ele parou de responder quando começou a se sentir muito bem.
– Sua irmã teve a ideia, já está na hora de você comer mais verduras e legumes. Temperamos a carne com espinafre, gostou? – pergunta Jéssica super feliz.
– Eu… Eu preciso mostrar a vocês como escapei de verdade, olhem! – disse Alex agarrou a mesa de jantar de madeira maciça pelos lados.
Fez isso com cuidado, mas acabou marcando os lados causando algumas fissuras. Depois o garoto ergueu aquilo com todo cuidado deixando a irmã e a mãe boquiabertas.