É comum imaginar que ao observar o céu estamos olhando para fora, já que estudamos um grande espaço vazio, ou aparentemente vazio, com corpos inalcançáveis, mas, graças às observações astronômicas, sabemos que nosso planeta e tudo presente é composto dos elementos existentes no universo. Dessa forma, estudar o cosmos é estudar a própria história da humanidade. Ao compreender isso, a curiosidade humana é despertada e consequentemente a ótica se tornou fundamental para aprofundar os estudos sobre nossa própria história. (NICOLINI, 1991)
Apesar de todo o desenvolvimento da espectrometria, inteligência artificial e outras tecnologias que permitiram a criação de grandes telescópios espaciais, os telescópios caseiros, montados com espelhos ou lentes e materiais facilmente encontrados, têm seu lugar na observação do espaço. Várias foram as descobertas feitas por astrônomos amadores. Além de ser divertido, tem a possibilidade de tirar fotografias incríveis.
A decisão de construir um telescópio é uma alternativa viável perante aos custos dos equipamentos de qualidade presentes no mercado. Porém, para tal tarefa, se deve inicialmente entender os tipos de telescópios e definir o que será construído, essa é a tarefa abordada nesse artigo.
Existem diversos construtores amadores no Brasil que são famosos no ramo, grupos para trocas de ideias, projetos e até “gambiarras’ perfeitamente funcionais. Com eles, a gente aprende que, com muito pouco dinheiro, se constrói equipamentos a nível de produtos importados, que seriam muito mais caros. Um termo muito comum é a sigla ATM (Amateur Telescope Making, em português: Fabricação de telescópios amadores), utilizado para designar o hobby e até os apreciadores da prática.
Para dar um gostinho, veja a fotografia cedida pelo astrofotógrafo Hélio Etchepare (fica um agradecimento). Ele também cedeu a imagem da capa dessa matéria.
Como um bom projetista, vou começar pelo projeto, estudar toda a parte teórica e compartilhar com outros que possam ter a mesma curiosidade, então esse será o primeiro de alguns textos. No decorrer de alguns artigos, irei descrever toda a teoria utilizada e o desenvolvimento do projeto. O que não falta é teoria, cálculos de distância focal, conceitos aplicados para a mais adequada captação de luz, a montagem adequada para cada tipo de observação, serão descritas as etapas do projeto, dos espelhos primário e secundário, tubo, suportes, oculares, focalizadores, etc. Por fim (se tudo der certo) será montado um protótipo.
Basicamente se encontram três tipos de telescópios, os refratores, os refletores, os combinados e mais uma super combinação que será explicada. (HOWARD, 1962)
Conforme demonstrado na figura 2, pode-se entender as diferenças básicas de cada tipo.
Refrator: A objetiva é uma lente acromática convexa, que desvia a luz diretamente na ocular.
Vantagens:
– Montagem mais simples
Desvantagens:
– Alto valor comercial da lente objetiva
– Comprimento do tubo
– Maior ocorrência da aberração acromática
Refletor, a objetiva é um espelho côncavo parabólico ou esférico que desvia a luz para um espelho secundário diagonal apontado para a ocular.
Vantagens:
– Tubo mais compacto que o refletor
– Menor custo de fabricação
– Montagem relativamente simples.
Desvantagens:
– Menor campo de visão em relação ao refletor
– Precisa de colimação
Cassegraniano, é uma variação do refletor, em que o espelho secundário é convexo e desvia a luz para um furo no centro do espelho primário, onde é posicionada a ocular.
Vantagens:
– Tubo mais compacto em relação ao Refletor
Desvantagens:
– Necessidade de fabricar ou adquirir um espelho convexo
– Maior custo de fabricação em relação ao refletor
– Maior número de peças
– É limitado aos diâmetros maiores.
Maksutov, é um equipamento combinado, é semelhante ao refletor – newtoniano ou cassegraniano, porém possui uma lente corretiva na extremidade distal, tal qual o refletor.
Vantagens:
– Maior nível de qualidade das imagens
– Pode ser ainda mais compacto
Desvantagens:
– Maior custo para fabricação
– Maior número de peças
– Valor comercial da lente objetiva
Com base nos dados acima, o tipo refletor apresenta uma boa relação custo benefício, conciliando qualidade na imagem, baixo custo relativo e possibilidade de montar um equipamento relativamente compacto.
Com essas informações, o tipo de telescópio já está definido, porém, outra parte fundamental é a ‘montagem’ na qual o equipamento será montado. O termo montagem é designado para descrever o alinhamento dos eixos da base que irá suportar o telescópio, podendo esta montagem ser chamada de equatorial ou altazimutal, cada uma com diversos tipos de construção. (MOURA, 2003)
Qualquer que seja a montagem utilizada, ambas trabalham com dois sistemas de eixos perpendiculares entre si, de maneira que seja possível apontar o telescópio para qualquer parte do céu. A montagem do tipo altazimutal possui um eixo primário e um secundário, se referem respectivamente ao movimento horizontal no ângulo de azimute e à variação de altura, inclinando o ângulo do telescópio verticalmente. Para deixar claro, azimute é o ângulo paralelo ao horizonte, contado a partir do norte no sentido para leste.
A montagem equatorial, assim como a altazimutal, possui dois eixos perpendiculares entre si, esta se difere da anterior, pois o eixo primário é posicionado paralelamente ao eixo da Terra, levando em consideração a latitude do local de observação. Dessa maneira, a montagem equatorial permite a inclinação do telescópio “seguindo” o movimento das estrelas movimentando apenas um eixo, ao contrário da altazimutal, em que para “seguir” o movimento de um objeto no céu, precisa de ajustes simultâneos nos dois eixos. (HOWARD, 1970)
Após considerações sobre as montagens, conclui-se que a altazimutal é vantajosa em relação à facilidade de utilização e portabilidade, já a equatorial permite um tempo de observação maior de um mesmo objeto com o mínimo de reajustes, sendo vantajosa para astrofotografia ou observações do céu profundo. Em relação a motorização de ambas as montagens, a equatorial também se torna vantajosa, já que se pode automatizar apenas um eixo, porém existe a desvantagem de fazer necessário um alinhamento preciso com o eixo da terra, levando em consideração a latitude do local de observação para usufruir do movimento mais simples. (MOURA, 2003)
Levando em consideração a possibilidade de astrofotografia, a maior gama de objetos capaz de alcançar e ainda o desavio oriundo da maior complexidade do projeto, a montagem que selecionei para o projeto é a equatorial. Existem diferentes tipos de construção para cada tipo de montagem, mas neste artigo, não serão abordados detalhes de cada tipo de construção, talvez no futuro.
Pela possibilidade de atuar também como uma montagem altazimutal, o projeto irá focar em uma montagem do tipo forquilha, acrescida de um terceiro eixo para inclinação do eixo primário em relação à latitude. Desta forma, fica definido que o objetivo do projeto será um telescópio refletor em uma montagem equatorial do tipo forquilha (igual a foto abaixo), utilizando materiais e ferramentas domesticamente acessíveis (diferente da foto abaixo).
Nos próximos textos irei apresentar os cálculos para definição de distância focal, definição dos espelhos, comprimento e as soluções caseiras para a construção de cada componente.
Referências:
BOCZKO, R. 1984. Conceitos de astronomia. São Paulo : Edgard Blücher Ltda, 1984.
CARLOS, João. 2015. Guia do Astrônomo Amador Iniciante – Telescópio e próximos passos. Astronomia no Vale do Aço. [Online] 11 de 03 de 2015. [Citado em: 12 de 11 de 2020.]
HOWARD, Neale E. 1970. Handbook for Telescope Making. Londres : Faber and Faber Limited, 1970. 0 571 04680 0.
MOURA, Marcelo Macedo. 2003. Altazimutal X Equatorial. Observatório Phoenix. [Online] 16 de outubro de 2003.
NICOLINI, JEAN. 1991. MANUAL DO ASTRÔNOMO AMADOR. São Paulo : Papirus, 1991.
SCHOOLPHYSICS. 2020. Telescope mountings. schoolphysics. [Online] 2020. [Citado em: 12 de 11 de 2020.]
TEXEREAU, Jean. 1984. How to make a telescope. Richmond : Willmann-Bell, Inc., 1984. 0943396042.