Imagine a seguinte situação:
Você foi adicionado a um grupo do WhatsApp de ex-alunos da faculdade. Empolgado, viu que conseguiria interagir com os amigos que fez ao longo desses 4 anos. Mas essa é a mesma empolgação dos outros 33 participantes do grupo, que querem saber o que aconteceu com as pessoas que não mantêm contato por algum tempo. Sua ida para o trabalho ficou bem mais interessante, pois você está se divertindo com as mensagens de seus amigos e relembrando situações que aconteceram tempos atrás. Depois de chegar ao trabalho e ter que participar de uma reunião meio longa e pouco produtiva, você resolve abrir o grupo para saber o que aconteceu durante a sua ausência. <ironia on> Nada de mais, apenas 150 mensagens não lidas nesse período! <ironia off> Como você percebe uma discussão interessante logo nas primeiras mensagens, resolve arrumar forças para ler tudo o que foi enviado. Descobriu que não explicaram bem uma situação que aconteceu na famosa choppada da turma e se pergunta: “Será que vale a pena retomar um assunto discutido 2h atrás? Sem contar que quando uso aquele recurso de resposta a mensagens, o WhatsApp sempre se perde e rola a tela para a última mensagem enviada. Melhor deixar para lá…”. 15 minutos depois e trabalho concluído! A empolgação das pessoas parece ter diminuído, com mensagens chegando com um pouco menos de frequência. Bom porque você precisa resolver alguns problemas no trabalho que vão ocupar a tarde toda. Quando finalmente sai do trabalho, você abre o grupo, que tem 120 mensagens não lidas, e percebe que um amigo resolveu voltar a falar da choppada…
Soa semelhante? Bem, foi o que aconteceu no grupo criado para os novos colaboradores do Portal Deviante. Passado o momento de apresentações (e alguns “choques” sobre ser possível convidar pessoas para um grupo via email e áreas de interesse desconhecidas pelos demais participantes), outras ondas de mensagens surgiram quando resolveram polemizar sobre a existência ou não de montanhas no Brasil (obrigada, Fencas!) ou possíveis alternativas que servem de dicas para um novo Contrafactual sobre Harry Potter…
Essa dificuldade em gerenciar a quantidade de informação produzida está causando a chamada sobrecarga de informação, citada em muitas notícias como o mal do século XXI ou um potencial risco para o nosso cérebro e infoxicação. A sobrecarga de informação ocorre quando a quantidade de entrada para um sistema excede sua capacidade de processamento. Ou seja, a quantidade de informação disponível é tão grande que nós, com um processamento cognitivo limitado e disponibilidade para realização de diferentes tarefas cada vez mais reduzida, temos dificuldade em lidar com elas. E lidar aqui não é só para consumir a informação disponível, mas também tomar decisões e/ou gerar novos conhecimentos a partir delas.
De fato, a quantidade de informação produzida e consumida por nós é muito maior do que a disponível para nossos pais ou avós. Por exemplo, em 2001 a revista Veja publicou uma matéria sobre o assunto, passando dados como:
- uma edição do New York Times contém mais informação do que uma pessoa comum teria acesso durante toda sua vida no século XVII;
- anualmente é produzido 1,5 bilhão de gigabytes em informação, o que dá em média 250 megabytes de informação para cada habitante do planeta;
- existem mais de 2 bilhões de páginas na internet, com estimativa de crescimento para quase 3 bilhões até o final daquele ano;
- existem mais de 100 emissoras de TV no ar, em diversas línguas e especialidades diferentes;
- americanos compram uma quantidade superior a 1 bilhão de livros por ano.
Isso há quase duas décadas, quando muita gente ainda se comunicava através de internet discada e não existiam smartphones, Facebook, WhatsApp, Skype, Netflix, Kindle, Spotify, Podcasts! Para 2017, existe uma previsão de que vamos gerar mais dados ao longo de 365 dias do que nos 5000 anos anteriores. Esse enorme volume de informações disponíveis demanda uma ação interdisciplinar, fazendo com que economistas, psicólogos, neurologistas, cientistas da computação e entusiastas de outras áreas se mobilizem para propor soluções que nos permitam lidar com a sobrecarga gerada. Grupos de pesquisa no assunto estão sendo criados, dada a complexidade do tema.
Do ponto de vista da computação, pesquisas em Big Data e Visualização de Informação tentam propor soluções computacionais que automatizem ou facilitem a gestão e uso de grande volume de informações. Além disso, pesquisas em Colaboração, seja no estudo de sistemas colaborativos, interfaces ou análise de redes sociais, tentam compreender a interação humana e como ela pode ser apoiada e compreendida através de programas e/ou aplicativos. Na nossa situação, como você encontraria uma informação se ficasse ausente do grupo durante um dia inteiro (alô, 700 mensagens não lidas na sua caixa de entrada!)? E mesmo se acompanhasse o grupo a todo momento, como compartilharia em outro grupo aquela mensagem superengraçada, mas que deve ter sido mandada lá pelas 8h da manhã? E a separação das mensagens de seu interesse daquelas discussões que você não está envolvido? Seria possível utilizar outras formas de apresentação da discussão que facilitariam o entendimento do que foi e está sendo discutido (RIP criação de ramos de resposta do Google Wave. Você só era muito evoluído para as pessoas de 2009)? Que limitações o aplicativo que uso possui, me dificultando ou impedindo de interagir adequadamente com meus amigos? Tem muita gente da Computação trabalhando para responder essas e outras perguntas.
Mas a pergunta que não quer mesmo calar é: E você, já conseguiu achar aquela mensagem interessante no meio de tanto bom dia no grupo da família? Eu a perdi no momento que fechei meu WhatsApp para escrever esse texto…
Bruna Diirr Doutora em informática, amante de tecnologia, livros policiais e séries, “pouco” viciada em joguinhos de raciocínio lógico e vídeos de maquiagem, além de ferrenha defensora de que sem colaboração a ciência não vive.