Na normatização brasileira, existem diversos trechos falando das obrigações de uso dos famosos equipamentos de proteção individual (vulgo EPIs). Para quem ainda não entrou no mercado de trabalho ou trabalha em escritórios, esses equipamentos são aquelas proteções todas que vemos as pessoas usando em vídeos de indústrias ou construções, como capacetes, óculos de proteção, luvas, etc. Entretanto, o que ninguém fala muito é como podemos fazer para eles serem mais confortáveis, duradouros e eficientes. Então eu juntei algumas dicas que dou nos meus treinamentos.

A principal norma que fala diretamente de EPIs é a NR-6 (Norma Regulamentadora 06), disponível com todas as NR no site do Ministério do Trabalho, mas ela é de pouca utilidade para os usuários. Ela determina algumas coisas importantes, como quais as obrigações da empresa, quais as obrigações do colaborador e quais as do fabricante.

Como boa parte dos trechos voltados ao colaborador nessas normas, acaba sendo atestado o óbvio e o bom senso. Os EPIs devem ser usados corretamente, apenas para as funções que foram estabelecidas. Devem ser mantidos em bom estado de conservação e trocados em caso de desgaste ou dano.

Muitas empresas fazem estudos se as trocas estão sendo muito frequentes. Eu mesmo já fiz alguns deles com respiradores e luvas em obras, até para achar quais marcas valiam mais a pena serem compradas (isso é papo para um outro dia), mas nunca vi uma que recusasse a troca de um EPI ou sua adequação. Ou seja, já entrando no “prato principal” dessa discussão, a minha primeira dica é:

  • Troquem seus EPIs sempre que precisarem!

Os EPIs só cumprem seu papel corretamente se estiverem em boas condições

Não há motivo ou justificativa para se usar um EPI completamente sujo, ao ponto de não poder ser limpo e higienizado, muito menos de usar algum com defeito apenas para parecer que ele está durando mais tempo. Cansei de pegar gente trabalhando com luvas furadas ou se coçando por conta de um cinto de segurança que está soltando fiapinhos e irritando o pescoço.

Sério gente! É obrigação POR LEI dos empresários darem boas condições de trabalho. Tudo que eu falar aqui que podem fazer é por ser um direito de cada um. Infelizmente é muito difícil mensurar (eu tentei, mas preciso melhorar o método de análise ainda) o ganho de produtividade de um carpinteiro ou um armador de obra que trabalha com EPIs de primeira linha em relação a outros que trabalham com EPIs ruins, desconfortáveis ou sujos.

Como engenheiros, supervisores, líderes ou donos de empresa, temos que entender que um EPI ruim atrapalha muito e pode causar o pior cenário possível, o NÃO USO do EPI. Alguma hora eu volto aqui falando de EPCs e o mundo mágico onde o EPI se torna desnecessário.

Acabei divagando… retornemos ao assunto desse texto.

Outra coisa que a NR6 traz no seu Anexo I é uma lista pura e simples de tipos de EPIs, fala de tipos de capacetes, tipo de luvas, tipos de respiradores. Aí eu pergunto: Isso é útil para o colaborador? Não muito, infelizmente. A maior parte das pessoas não se dá ao trabalho de ler qualquer norma ou lei, então eu sempre fico surpreso (e ganho meu dia) quando alguém me questiona se não seria mais útil se proteger dessa ou daquela forma, de modo que nós da área de segurança temos um outro papel mega importante e que também é um dever: precisamos ensinar os times a usar e cuidar de seus EPIs, assim como sua real utilidade e função.

Eu sempre gosto de dar tudo o que eu puder de dicas sobre isso. Aproveito não só os treinamentos previstos, mas também nos DSS (diálogos semanais de segurança) que as obras fazem e quando vejo algo a melhorar nos canteiros. Mesmo sendo mais especializado em Construção Civil e Mineração, escolhi algumas aqui que são as mais comuns e servem para outros tipos de empresas também.

Não precisa inventar. Água e sabão são mais que suficiente na maioria dos casos.

  • Lavem seus EPIs com frequência

Nós lavamos nossas roupas sempre. Sapatos e até bonés. Qual a justificativa para ser diferente com nossos EPIs? Parece algo óbvio, mas é raro ver pessoas que têm esse cuidado. Capacetes e botas imundos são uma constante nas indústrias mais pesadas (construção, mineração, siderurgia, etc). A pessoa chega para trabalhar com o uniforme impecável, cheirando a desodorante ou perfume, tendo tomado banho antes de sair de casa… e me veste a porcaria de um capacete que está mais marrom que o balde de suco do Chaves!

O impressionante é que, a maior parte dos EPIs pode ir na máquina de lavar. Basta colocar dentro daqueles sacos de lavagem para roupas delicadas. Lavar os cintos, balaclavas, carneiras de capacete, aventais de serralheria ou carpintaria, junto com o uniforme não só ajuda o seu bem estar, mas também ajuda a consumir água de modo eficiente, uma vez que a máquina de lavar rodará cheia ao invés de pela metade.

Partes metálicas e plásticas, como o casco do capacete, protetores auriculares (protetores de ouvido) do tipo concha ou as botas, precisam só de um pano úmido com detergente. Os protetores auriculares do tipo plug, de introduzir na orelha, devem ser higienizados TODOS OS DIAS!

E vale lembrar: Não usar álcool para limpar seus EPIs, normalmente eles ressecam e estragam mais rápido.

Com certeza, após poucas semanas, você vai ver como é muito melhor colocar um EPI limpo do que um sujo. Além de ajudar muito a prevenir algumas irritações de pele.

Capacete deve estar na cabeça. Não adianta fazer gambiarras.

  • O boné por baixo do capacete é uma péssima alternativa

Aproveitando o gancho de higiene e limpeza, quero falar de outro ponto comum em minhas andanças: usar boné ou chapéu por baixo do capacete.

Ao perguntar sobre o motivo de fazer isso, tive duas respostas principais (e uma bizarra que eu conto depois): Não querer sujar/amassar os cabelos e não gostar da sensação da carneira na cabeça. A bizarra foi uma pessoa me dizer que era para ele sempre estar “estiloso” e “diferenciado” da galera (ele não só usava o boné por baixo, mas o fazia virado para trás) para ser lembrado pelos empregadores e chamado para outras obras.

Enfim… Abordando a primeira resposta. Amassar os cabelos é algo que acontece mesmo de boné, então o argumento cai por terra, já o sujar é algo que eu entendo. Eu mesmo suo bicas dentro do meu capacete e meu cabelo fica nojento, então a minha carneira costumava estar sempre desagradável ao toque por estar úmida e tals. Para contornar isso eu sempre recomendo uma higiene mais constante do capacete, diária se der, e também pedir ao encarregado de comprar os EPIs que compre aquelas toquinhas descartáveis. O cento delas é super barato e ela consegue absorver boa parte da umidade proveniente do suor, além de que conserva o cabelo também. Por ser fininha, eu garanto também que o calor dentro do capacete não vai mudar muito.

Vale ressaltar um problema comum em obras e mineração que deve ser combatido veementemente, a “zoeira” dos companheiros. Essa solução da toquinha é bem legal, mas se a galera começar a tirar sarro daqueles que prefere usar, a solução fica impossível de ser implantada.

A segunda resposta: Um desconforto com o EPI é algo natural e vamos nos acostumando, mas ele estar no ponto de tirar a atenção, aí tem algo errado. A primeira coisa que eu sempre faço quando alguém me questiona sobre isso é ver se o tamanho da carneira está ajustado direito. É comum ver capacetes caindo ou rostos marcados na testa e pescoço por estarem com a carneira e a jugular (a tira de tecido que vai atrás do queixo) apertados demais. Dar atenção para ajudar um colega assim é algo rápido e fácil de fazer e minimiza muito o desconforto.

Se não der certo isso e a pessoa ainda estiver muito incomodada, vale verificar se a troca das carneiras plásticas pelas de tecido não é uma opção. Ou talvez até ver se a qualidade da plástica não é baixa demais. Pegam a mais barata que vem cheia de rebarbinhas e pontas que pinicam. Não é um custo absurdamente caro e já resolve.

Usar o boné embaixo é uma violação do uso correto do EPI, já que ele é feito para ficar na nossa cabeça diretamente e não sobre outra superfície. A aba do boné sempre impede que o capacete se encaixe direito, tendo mais risco de cair ou obrigando a jugular a ficar ainda mais apertada.

Na falta de cores distintas, nada que um nó num dos lados não resolva.

  • Identifique cada lado do seu protetor auricular.

Apesar de termos dois ouvidos, em teoria, iguais, o que acontece com um não tem que acontecer com o outro. Sendo assim, é sempre muito arriscado para quem usar protetor plug não saber qual ponta vai em qual orelha.

Existem muitas marcas de protetores que têm duas pontas com cores diferentes, uma laranja e uma verde, por exemplo. Aí é só a pessoa decorar que o verde é sempre do lado esquerdo ou direito, mas é ainda maior a quantidade de protetores que tem as duas pontas da mesma cor. Minha dica, nesses casos é bem simples: basta dar um nozinho no cordão perto de uma das pontas. Isso evita que, em caso de estar com um ouvido infeccionado, as bactérias passem de um lado para o outro.

Além de que esses protetores se deformam ligeiramente depois do primeiro ou segundo dia de uso, se acomodando melhor no ouvido. Se ficar trocando de lado todo dia, ele vai estar sempre deformado “errado” e nunca vai ficar tão firme e tão agradável no ouvido quanto deveria.

Numa escala muito menor, mas ainda assim, podemos ter isso em protetores do tipo concha (aqueles que parecem um headset), então é legal fazer uma marca neles também para saber o lado.

Aproveitando que estamos falando disso, vou reforçar que higienizar o protetor auricular toda vez que usar é uma ótima prática. E que passar saliva ou enfiar o protetor na boca antes de usar (sim, já vi isso alguma vezes) não é o que eu chamaria de higienizar, mas sim fazer uma lambança de bactérias.

Por último nessa rodada, mas não menos importante:

Ninguém merece dormir com queimaduras de sol.

  • Passar protetor solar mais de uma vez por dia mesmo em dias nublados

Parece até um conselho de mãe, mas é algo muito importante. A primeira coisa é que toda empresa cujos funcionários trabalham “ao ar livre”, seja tempo integral ou parcial nessas condições, precisa fornecer, como parte dos EPIs, um estoque ilimitado de protetor solar. Isso é usualmente feito de duas maneiras: dando bisnagas individuais (muito comum em mineradoras e na agricultura) ou ter uma bisnaga gigante que fica liberada para todos pegarem (mais comum em obras e indústria). Seja qual for a forma, não é para existir a desculpa de “estou sem protetor para passar”.

A segunda coisa é algo que talvez já tenham escutado, de que o protetor aguenta um certo período ou quantidade de radiação solar antes de perder o efeito. Sendo assim é uma ótima prática, sempre que for ao banheiro ou sair do almoço/lanche, passar mais uma camadinha de protetor. Normalmente não se demora mais do que 4 a 5 minutos, então não há atividade que será atrasada de verdade por conta disso. E não custa nada pedir para colocarem um espelho perto de onde está a bisnaga, que sempre facilita e agiliza podermos nos ver enquanto passamos protetor.

A terceira coisa é que temos de passar protetor mesmo nos dias nublados. O mormaço queima a nossa pele e o protetor ajuda com isso. Locais muito quentes e litorâneos sofrem ainda mais desse risco. Vale o cuidado para poder dormir gostoso a noite sem ter que ficar se contorcendo na cama pois a nuca e o rosto estão ardendo.

Mesmo com as dicas, todo dia tem alguma história nova para contar

Enfim… essas são algumas dicas que eu costumo dar em meus treinamentos. O grande objetivo disso é tornar possível o uso de EPIs do modo correto e o tempo todo que for requisitado.

Existem ainda muitos assuntos que poderiam ser abordados com dicas e boas práticas. Quais EPIs você usa? Quais gostaria de saber mais sobre? Deixe aqui nos comentários que vamos explicando tudinho.

Abraços e fiquem seguros!