Chega a ser engraçado como certas ideias são tidas como tão óbvias que ao serem minimamente questionadas você se arrisca a ser taxado como alguém de “capacidade cognitiva ímpar” por seus amigos ou família, mas com outras palavras.
Questionar o que é o tempo, se ele realmente existe é uma dessas questões que vão contra o senso comum. “É óbvio que ele existe” diria um, “existe passado, presente e futuro diria outro”, “você tem problemas” concluiriam.
Porém, o papel do tempo na física é uma das questões em aberto que mais incomodam os cientistas. Em nosso dia a dia, nós sempre experimentamos o tempo fluindo em uma direção, do passado em direção ao futuro. Einstein nos trouxe a noção que observadores com diferentes velocidade experimentam essa viagem para o futuro a taxas distintas , porém sempre na mesma direção.
Essa direção preferencial da natureza em relação ao futuro é chamada de “seta do tempo”.
Apesar do senso comum, é extremamente bizarro do ponto de vista científico, pois não há praticamente nada das leis da física que diz que o tempo deveria fluir dessa forma. Para todo efeito todas leis conhecidas são simétricas em relação ao passado ou futuro mas, aparentemente, a natureza não concorda, até mesmo em escala atômica.
O melhor argumento que temos hoje para justificar a seta do tempo é a Segunda Lei da Termodinâmica, aquela que fala sobre a entropia.
Ela nos diz que o Universo tende a desordem, que um omelete não voltaria a ser um ovo, ou que o chocolate quente não voltaria a ser chocolate e leite por espontânea vontade. Pelo menos não de forma espontânea.
Ainda que você conseguisse separar o chocolate do leite em escala atômica, a energia que você precisaria utilizar seria sido tirada de outro lugar, e acabaria aumentando a entropia do universo como um todo, apesar de ter diminuído localmente.
A Segunda Lei da Termodinâmica é tida como um dos pilares mais sólidos da Física, até que se prove o contrário.
É praticamente unânime que uma teoria que explique a seta do tempo terá algum envolvimento da entropia. Porém claramente essa não pode ser a história completa, já que essa explicação levanta uma outra questão ainda mais interessante.
Sabemos que o universo tende a desordem, ou – em “fisiquês” – equilíbrio, isso significa que a cada segundo ele se torna mais mais e mais desordenado. Afinal é exatamente isso que a Segunda Lei nos diz.
Agora, façamos um exercício e olhemos para o passado. Se a entropia está sempre aumentando, ontem ela era menor que hoje, que era menor que antes de ontem e aassim sucessivamente. Podemos seguir com essa lógica até o início do Universo. Chegando a conclusão que no seu início o Universo deveria seria absurdamente ordenado. Tão ordenado que seria difícil explicar o Universo observável que temos hoje.
Basicamente trocamos o problema de porque a Natureza prefere o futuro, pela origem do Universo… O que talvez não seja o melhor caminho para trabalhar a questão. Exatamente por isso muitos tentam explicar o problema da seta do tempo por outros artifícios por exemplo a gravidade.
Um trabalho recente da pesquisadora independente Joan Vaccaro busca outra abordagem, tentando mostrar que a seta do tempo pode emergir naturalmente a partir de teorias mais básicas (se é que podemos dizer isso), que tratam tempo e espaço de forma simétrica, ou seja sem nenhum sentido preferencial a priori, mas em algum momento a limitação emerge das equações.
Trabalhos posteriores devem focar em propor experimentos que possam provar a teoria da Dra Vaccaro.
Entender a natureza do tempo é complexo, em alguns momentos talvez até intimidador, mas é também entender quem somos, para onde vamos, e mais importante: botar um ponto final a discussão se é possível construir uma Tardis ou não…
PS: Sim, eu sei que alguns inclusive propõem que o tempo em si simplesmente não existe, mas isso é tema para outro artigo. ;)
Referências
Science Daily [1]
Inovação Tecnológica [1] [2] [3] [4] [5] [6]
Wired [1]
Science New [1]
Royal Society [1]
TED Radio Hour [1]
Imagens:
https://www.pexels.com/photo/fashion-wristwatch-time-watch-1252/