Chegou a vez dos alucinógenos!

Muito bem querido leitor, chegamos à quarta e última parte deste guia! Se você não leu as demais partes, recomendo que leia antes de prosseguir (Parte 1/ Parte 2/ Parte3).

Bom, vamos finalizar esta série com as Drogas Perturbadoras. Drogas perturbadoras do Sistema Nervoso Central são aquelas que não são estritamente depressoras ou estimulantes e que frequentemente provocam alterações na forma como nosso cérebro percebe a realidade. Nesse contexto, temos a maconha e as drogas alucinógenas (como o LSD, DMT – principio ativo do chá do Santo Daime, Psilocibina, etc).

É importante ressaltar que a maior parte das alucinações produzidas por essas drogas é diferente dos surtos psicóticos que podem surgir com o excesso de drogas estimulantes. Em geral, essas alucinações provocadas por drogas alucinógenas diferem de uma alucinação psicótica pelo fato de que, na psicose, o individuo não diferencia alucinação de realidade, enquanto que, no caso das drogas que estudaremos hoje, o indivíduo consegue entender que os efeitos que está experienciando são alucinações que diferem da realidade e que estão sendo causados pelas drogas que fez uso.

Obivamente temos que começar aqui falando do jogo que mais faz referências a cogumelos alucinógenos: Super Mario! Não é a toa que o lugar se chama Reino do Cogumelo (risos).

Vamos começar com o power-up do cogumelo vermelho.

Cogumelo vermelho: Power up que faz o Mario crescer

Repare o quão semelhante ele é com o cogumelo Amanita muscaria.

Cogumelo alucinógeno Amanina muscaria.

A substância ativa é a muscarina, capaz de estimular receptores muscarínicos, que são receptores geralmente ativados por um neurotransmissor chamado Acetilcolina. O excesso de ativação desse receptor pelo princípio ativo do cogumelo pode levar à alucinação. Interessantemente, doses elevadas podem levar à micropsia ou macropsia. Micropsia é sentir que você está menor que o seu ambiente e macropsia é se sentir maior que o ambiente. Curioso né? Então talvez o Mario não cresça quando come esse cogumelo, mas ele experiencia a Macropsia, achando que está maior em relação ao ambiente. Quem também passa por esses efeitos é a Alice, no livro Alice no País das Maravilhas. Ela experimenta tanto a micro quanto a macropsia.

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A Macropsia do Mario

Embora interações com receptores muscarínicos possam provocar alucinações, a maioria das drogas alucinógenas provoca seus efeitos por meio de receptores de serotonina, em especial o subtipo 5-HT2A (esse nome faz alusão ao “verdadeiro” nome da serotonina – 5 –hidroxi-triptamina). O LSD é uma dessas drogas serotoninérgicas, apresentado de diversas formas. Como é muito potente (uma pequena dose provoca efeitos intensos e duradouros), quando distribuídos em cápsulas, temos a impressão de estarem vazias, de tão pouca droga que é necessário colocar ali. Outra forma na qual é distribuído é por meio de soluções que são ‘pingadas’ em pedaços de papel. Após secar, temos um papelzinho impregnado com LSD que, quando colocado na boca, irá ser absorvido. Sendo assim, sempre foi muito comum impregnar o LSD em selos postais, como este aqui

Selo postal americano

Não por acaso, muitos destes selos possuem desenhos bonitinhos, incluindo “estrelinhas”. E quando o Mario entra em contato com uma estrelinha o que acontece? Distorções visuais de cor (ele fica piscando colorido), distorção na percepção de tempo (ele muda seu ritmo de corrida), distorções auditivas (a musiquinha muda). Então talvez esses sejam os efeitos do LSD sobre nosso bigodudo favorito.  Só teria um problema nessa comparação: os efeitos do LSD são duradouros enquanto o efeito da estrelinha do Mario acaba muito rápido.

Mario sob efeito do LSD

Já que estamos falando do Mario, vamos viajar um pouco mais: outra substância alucinógena (com ação em receptores de serotonina) é a psilocibina, geralmente presente neste cogumelo aqui:

Cogumelo produtor do alucinógeno psilocibina

Porém, algumas pessoas acabam querendo obter este efeito, mas não sabem reconhecer direito a espécie de fungo e acabam usando este outro cogumelo aqui, Galerina marginata.

Galerina marginata, cogumelo tóxico

O problema é que este é um cogumelo tóxico, que inibe a síntese de RNA, podendo provocar intoxicações graves. Sabe quem é muito parecido com ele? Isso mesmo, o Goomba. E de fato, quando o Mario encosta em um Goomba, ele pode morrer.

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Mario intoxicado por Galerina marginata

Essas informações, somadas com a florzinha de fogo (flor da papoula) que abordamos na parte 2, nos mostram que os jogos do Mario possuem uma farmacologia rica e peculiar. Por este motivo, criei uma camiseta bem nerd sobre isso, que você pode conferir CLICANDO AQUI.

Bom chega de falar de Mario né?

Em Max Payne temos a droga Valkyr, que faz o personagem se sentir em um jogo de computador. Da mesma forma, Jason, em Far Cry 3 utiliza alucinógenos em alguns momentos do jogo. No recente Far Cry 5, temos a bênção, que parece exercer seu efeito por meio da inalação próxima às plantações e por via oral em contaminação da água. Em Skyrim, temos o Skooma, que promove distorções visuais. Em Uncharted 3, temos um alucinógeno que faz Drake ver soldados normais como soltados-demônio. Em Witcher II, temos uma poção visionária que gera efeitos semelhantes à micropsia. Na série Batman Arkham, é possível conferir a toxina do medo do espantalho que induz flashbacks traumáticos, além de distorcer o ambiente. Enfim, todos esses efeitos psicodélicos associam-se de alguma maneira às drogas citadas acima, provavelmente via receptores de serotonina.

Para fechar essa parte, podemos citar GTA V, no qual em determinado momento Michael começa a alucinar (dissociação com a realidade) após beber soda com cetamina (ou ketamina). A cetamina é um anestésico geral muito útil na medicina humana e animal. Mas como efeito adverso pode provocar algum grau de alteração na percepção de realidade. Por esse motivo, existe muita venda ilegal da droga.

Michael alucinando com aliens após uso de cetamina

 

Conteúdo bônus

Saindo um pouco das chamadas drogas de abuso, ou seja, aquelas que geralmente são ilícitas e possuem, em maior ou menor grau, a possibilidade em causar tolerância e dependência, gostaria de traçar mais alguns paralelos com outras drogas e medicamentos.

No clássico Duke Nukem, é possível utilizar os Esteróides. Hormônios esteróides são aqueles que derivam do colesterol. No dia a dia, costumamos associar essa nomenclatura aos anabolizantes esteróides, que são análogos à testosterona e seus derivados. Em Duke Nukem, esta droga provoca aumento de velocidade e foco. Esses efeitos seriam mais característicos do uso de estimulantes, conforme vimos na parte 3 deste guia. A substância Venom, utilizada pelo Bane em Injustice, que o faz aumentar sua massa muscular, tem uma boa relação com os esteróides anabolizantes.

O ainda não lançado We Happy Few nos apresenta uma pílula que faz o jogador perceber o mundo de forma mais positiva. Aqui podemos traçar o paralelo com a Fluoxetina (Prozac), antidepressivo que, na década de 70, foi considerado a droga da felicidade. Obviamente sabemos que os antidepressivos são ferramentas fundamentais para o tratamento da depressão, mas nem de longe são capazes de tornar as pessoas artificialmente felizes.

Em Bioshock temos o ADAM que confere vários “poderes” ao jogador. Para fazer um indivíduo ganhar novas características como ocorre no jogo, seria necessário modificar o funcionamento de suas células por meio de uma terapia genética, epigenética ou talvez com células troncos.

Para fechar, um jogo de super nintendo bastante curioso: Capitão Novolin, um super-herói diabético que combate inimigos doces-vivos. Foi produzido pela mesma empresa que vende o medicamento Novolin, que é uma marca de insulina. A insulina facilita a captação de glicose pelos tecidos, processo anabólico crucial para nosso correto metabolismo energético.

A insulina é necessária para nosso herói Capitão Novolin enfrentar os doces

E dessa forma fechamos o nosso Dossiê sobre drogas nos games.

Vejo vocês nos próximos textos!