Se você está lendo este texto é porque provavelmente não recebeu sua carta para ingressar na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, mas isso não quer dizer que não possa ser um aluno aplicado como a Hermione Granger ou um verdadeiro membro da Corvinal.

Por isso, da próxima vez que alguém disser que você já é muito grandinho para gostar de Harry Potter aproveite este texto para explicar a complexidade e genialidade dessa saga maravilhosa e como ela é importante tanto para o campo da psicologia (algo que trataremos em outro momento), quanto para que as gerações consigam fazer paralelos com acontecimentos da história mundial. Bora descobrir mais sobre essa chuva de referências?

Quem é fã já está ligado que a autora dos livros, J.K. Rowlling, morou em Portugal durante um bom período de sua vida, o que fez com que muitas referências à Terrinha ficassem evidentes na trama. Um grande exemplo é um dos quatro fundadores de Hogwarts, Salazar Sonserina, seu nome é uma referência direta a António de Oliveira Salazar, ditador que governou Portugal de 1932 a 1968.

Então vamos conhecer alguns fatos sobre António Salazar: inspirado na onda autoritária e nacionalista da época, ele pegou firme no uso de propaganda e repressão em seu governo. Também criou a Censura e fez questão de assegurar a doutrinação das massas portuguesas “no melhor estilo” fascista, se apoiando sempre na doutrina social da Igreja Católica. Sem contar que ele pegou pesado no nacionalismo econômico e tomou medidas de protecionismo e isolacionismo de natureza fiscal, tarifária e alfandegária; não somente para Portugal, mas também em suas colônias. Em 1936 apoiou Franco na Guerra Civil Espanhola estreitando os laços entre Portugal e Espanha. Já durante a Segunda Guerra Mundial, apesar de explicitamente se mostrar simpático ao fascismo italiano, preferiu ficar em cima do muro pendendo um pouco mais para o lado da Inglaterra. Eeeee Portugal… sempre saindo pela tangente, não é mesmo? xD

E não é só o ditador português que serviu de referência do período da Segunda Guerra Mundial, tanto Grindewald quanto Voldemort trabalhavam com ideologias muito semelhantes ao nazismo alemão. Durante a saga, fica claro que ambos, inspirados em Salazar Sonserina, pregam a hegemonia bruxa, somente a elite bruxa chamada de “puro sangue” deveria ter o privilégio da educação e do poder.

Vamos focar então nas semelhanças entre Lord Voldemort e Adolf Hitler: ambos vieram de origem humilde e tinham grande determinação e principalmente ambição. Os dois pontos mais fortes que demonstram similaridade são o desprezo por aqueles que consideravam inferiores (trouxas e judeus), tendo como objetivo maior a limpeza étnica e o uso da propaganda como forma de dominação e doutrinação.

O sistema de identificação: “puro-sangue”, “mestiço” e “sangue ruim” é quase que idêntico ao utilizado pelos nazistas, que classificavam a população não somente entre não-judeus e judeus, mas também outras categorias dentro da comunidade judaica para determinar o nível de “contaminação” do sangue. Tanto na série de livros quanto no mundo real o cidadão era obrigado a assinar um registro que declarava sua condição.

Uma atrocidade difícil de imaginar que aconteceu, mas que é muito importante ser lembrada para que não se repita nunca mais. O que torna ainda mais brilhante ainda a trama, pois podemos entender melhor o terror do holocausto e a importância da criação do Estatuto Internacional de Direitos Humanos.

Inegavelmente, outro ponto de semelhança entre Hitler e Voldemort é a oratória, com discursos poderosos e atraentes eles guiaram legiões de pessoas que acreditavam que o problema estava no próximo. Sem contar a utilização de um símbolo para unir todos os seguidores e demonstrar unidade como a suástica e a marca negra, que inspiram medo aos que são perseguidos.

A escravidão é tratada nos livros de forma profunda ao mesmo tempo em que não é destacada como um assunto de importância, isso porque no mundo bruxo a escravidão é vista de forma natural, comum, poucos parecem se importar com a situação degradante dos elfos-domésticos, a não ser Hermione. No segundo livro, Harry Potter e a Câmera Secreta, somos apresentados a um novo personagem, Dobby, um elfo-doméstico que depois descobrimos pertencer à família Malfoy.

Durante toda a história diversas civilizações fizeram o uso de escravos, aqui no Brasil, infelizmente, não foi diferente. Durante todo o nosso período de colonização os produtos agrícolas compraram africanos vendidos pelos ingleses para trabalhar sem nenhum tipo de direito, sempre de forma degradante e exaustiva. Tudo isso era visto de forma normal na sociedade e nosso país demorou a pôr um fim à escravatura. Aliás, a deposição da monarquia deve-se muito à libertação dos escravos, já que a aristocracia viu com maus olhos a perda de mão de obra barata.

Assim como na saga muitos ainda vivem em condições análogas à escravidão e após libertos muitos não tinham como se sustentar sem políticas de apoio. Um desfecho não muito feliz, porém, muito real. No site Potterish tem uma matéria muito interessante que fala mais sobre os elfos-domésticos que você pode ler aqui.

Faltou alguma informação? Tem algo legal para acrescentar? Comenta aí. ;-)

Aproveite também para ouvir os episódios de #Contrafactual sobre Harry Potter!

Contrafactual #29: E se Voldermort tivesse vencido?

Contrafactual #26: E se Voldemort tivesse escolhido Neville?

 


Giovanna Prado

Jornalista, procrastinadora experiente, adoradora de Jane Austen, apaixonada por ciências apesar de não entender badalhufas, em um caso sério com a história e com a música, notoriamente conhecida como a Ovelha Negra da família.