Shinji Mikami estabeleceu as bases do gênero survival horror quando lançou o primeiro Resident Evil (claro que também devemos dar crédito a Alone in The Dark que pavimentou o caminho antes), porém ele também foi o responsável por mexer nessas bases e evoluir o gênero lançando Resident Evil 4 em 2005. Inicialmente o título saiu com exclusividade para o Nintendo Game Cube, mas posteriormente foi portado para diversos consoles e dispositivos que hoje já deve até existir uma versão até para Smart TVs.
Controlando o agente especial Leon S. Kennedy, somos levados até uma área rural da Espanha atrás da filha do presidente dos EUA, que foi sequestrada por uma seita misteriosa. O game deixou de lado os famigerados zumbis contaminados com o T-Virus e nos apresentou inimigos sobre o controle de parasitas conhecidos como “Las Pragas”. E você sabia que muitas características encontradas nesses parasitas são reais? Será que existe algum parasita que pode mudar o comportamento de um humano ou até mesmo controla-lo? Responderemos essas e outras questões ao longo do texto. Portanto racione muito bem sua munição e itens pois hoje balançaremos a franja falando sobre Resident Evil 4 e parasitas.
O desenvolvimento do game iniciou-se em 1999 e passou por quatro versões de testes (inclusive uma que resultou no primeiro Devil May Cry) até chegar em sua versão final como nós a conhecemos hoje. Porém uma coisa que não mudou foi o protagonista, Leon S. Kennedy. O enredo se passa 6 anos depois do incidente em Raccoon City, onde Leon, em seu primeiro dia de trabalho como policial, enfrentou, ao lado de Claire Redfield, os zumbis gerados pelas experiências da empresa farmacêutica Umbrella Corporation. Promovido a agente especial, Leon parte para uma zona rural da Espanha seguindo pistas que podem revelar o paradeiro de Ashley Graham, filha do presidente americano que foi raptada.
Durante o game é revelado que Ashley foi sequestrada por uma seita que utiliza parasitas para controlar seus seguidores. O plano era infectar Ashley e devolve-la a seu pai, assim o presidente também seria infectado e poderia ser controlado, e, por consequência, os líderes da seita teriam domínio sobre o mundo. Claro que no final Leon impede que isso aconteça, salvando Ashley e acabando com a seita, graças também a ajuda da misteriosa Ada Wong e do cientista Luis Sera.
Como já mencionado antes, o game deixa de lado os zumbis gerados por vírus e nos apresenta inimigos infectados por parasitas, os “Las Plagas”. Esses parasitas infectam pessoas e animais através de ovos, que depois de eclodirem e atingirem a maturidade se alojam no sistema nervoso central do hospedeiro, que perde a consciência e o controle do seu corpo, podendo receber ordens de uma outra variação geneticamente modificada do parasita, denominado de “Plaga Controladora”.
Os “Las Plagas” podem garantir maior força e resistência aos seus hospedeiros, além de gerar mutações nos mesmos. O parasita pode até mesmo tomar o lugar da cabeça do hospedeiro! Nessa fase ele desenvolve uma espécie de chicote com uma lâmina na ponta, a qual é usada para atacar e se defender. Em um estágio mais avançado, o parasita pode se desligar do hospedeiro e agir de forma independente. No nosso mundo, vários parasitas possuem características como essas e, assim como no game, infectam tanto humanos como animais. Logo conheceremos alguns deles, mas antes vamos entender o que é um parasita.
Parasitas são organismos que vivem associados a outros animais, dos quais retiram o meio para sobreviver, normalmente prejudicando o organismo hospedeiro, esse processo é chamado de parasitismo. São os causadores de muitas doenças infecciosas em animais e plantas. Um exemplo bem conhecido entre os humanos é a tênia ou “solitária”, verme que se instala no intestino delgado e que pode causar desnutrição, entre outros males.
Recentemente um parasita ficou bem conhecido na cultura pop, isso por causa do game The Last of Us da produtora Naguhty Dog, que utilizou como inspiração o fungo Ophiocordyceps unilateralis na criação dos inimigos. Esse fundo, na vida real, “infecta” formigas e depois de tomar o controle da mesma, a faz vagar sem rumo, para fora da segurança do grupo. Quando a formiga morre, o fungo, em menos de 24 horas, se prolifera pelo cadáver e libera esporos pelo chão que irão contaminar novas formigas. Na história de The Last of Us, os fungos passam a infectar humanos transformando-os em zumbis (estaladores), o que quase causa a extinção da humanidade. Foi um conceito bem trabalhado no game, mas vamos seguir adiante, até porque The Last of Us rende um texto só para ele.
Assim como os “Las Plagas” em Residente Evil 4, diversos parasitas têm como “modus operandi” infectar o hospedeiro e depois controlar suas funções motoras para que possam se reproduzir e iniciar um novo ciclo. O Paragordius tricuspidatus é um verme que pode atingir até 15 centímetros quando adulto, mas para chegar a essa fase ele precisa de um grilo ou gafanhoto como hospedeiro. A larva do verme é ingerida por algum inseto que depois servirá de alimento para o grilo ou gafanhoto, então o verme começa a se desenvolver. Porém, a última etapa de seu desenvolvimento ocorre na água, ambiente não muito frequentado por grilos ou gafanhotos. Assim o verme altera funções do sistema nervoso central do inseto, fazendo-o saltar para qualquer porção de água que esteja próxima. O inseto morre afogado e o verme sai para água, onde irá se reproduzir.
Outros parasitas podem até causar alterações no organismo do hospedeiro, esse é o caso do crustáceo marinho Sacculina, que ataca caranguejos. A Sacculina fêmea entra no corpo do caranguejo através das fendas de suas garras, depois descarta mais de 90% do seu próprio corpo e se ramifica no interior do hospedeiro. Se alimentando dos nutrientes do caranguejo, o parasita chega a fase adulta. Depois de encontrar um macho e se acasalar, a Sacculina obriga o caranguejo a cuidar de suas milhões de larvas, isso se o hospedeiro for uma fêmea, se o hospedeiro for macho o parasita provoca uma transformação que o torna uma fêmea, ele se torna infértil, seu abdômen cresce, seus órgão sexuais encolhem e suas garras param de crescer.
Diversos chefes no game sofrem mutações quando Leon os enfrenta. Existem parasitas que realmente fazem isso com seus hospedeiros, mas essas mutações não trazem nenhuma vantagem, pelo contrário, atrapalham. Ribeiroia é um verme que infecta rãs e provoca deformações em seus membros ou até mesmo cria novos pares de pernas. Isso faz com que os hospedeiros se tornem alvos fáceis para seus predadores, facilitando o transporte do parasita de um lugar para o outro.
Em humanos, parasitas também podem causar mudanças comportamentais como é o caso da Taenia solium. Suas larvas podem entrar no corpo humano geralmente através da ingestão de carne de porco contaminada, mas frutas e verduras mal lavadas também podem ser um meio de contaminação. Depois que caem na corrente sanguínea, as larvas podem se alojar em qualquer parte do corpo do hospedeiro, porém é no cérebro que elas causam o maior dano, doença chamada de Neurocisticercose. Depois de morrerem, as larvas se calcificam transformando-se em cistos que causam paralisia de um segmento do corpo, convulsões, meningite e alterações comportamentais. Já houve casos em que o indivíduo contaminado se tornou extremamente violento e antissocial. Devido a isso, muitas vezes a doença é confundida com outros transtornos mentais. A melhor maneira de se diagnosticar a Neurocisticercose é através de Tomografia Computadorizada e Ressonância Nuclear Magnética. O tratamento geralmente é feito através de cirurgia, onde os cistos são retirados.
O Toxoplasma gondii é um parasita bem conhecido que causa a toxoplasmose, transmitida pela urina de gatos. Ratos contaminados pelo Toxoplasma gondii sofrem alterações, às vezes permanente, em seus cérebros que os fazem perder o medo de gatos e até mesmo se sentirem levemente atraídos pelos felinos, transformando-os em presas fáceis e renovando o ciclo de vida do parasita.
A toxoplasmose também atinge humanos, cerca de um terço de todo a população mundial está contaminada com o parasita. Esse nível de contaminação para um parasita que atinge o cérebro já é bem preocupante, mas mais preocupante ainda são os resultados de alguns estudos que mostram que talvez exista uma ligação entre o parasita e suicídio. Por enquanto os resultados ainda não são conclusivos, mas já sinalizam um alerta.
E por hoje é só. Resident Evil 4 é um excelente game que influenciou a indústria dos games em vários aspectos e, se você ainda não jogou, recomendo que o faça o quanto antes. No futuro, os primeiros games da série também podem render um texto, fazendo um paralelo com o vírus da raiva principalmente. Espero que tenham gostado, como sempre críticas, sugestões e elogios são bem vindos. Até a próxima.
Fontes: REVIL, Mega Curioso, Hypescience, Galileu, Resident Evil Wiki, Neurocirurgia, Scientific American Brasil e BBC Brasil.