Recente estudo descobre importante declínio no número de trabalhos acadêmicos sobre ciência básica em revistas médicas consagradas nos últimos 20 anos.

Nos longos seis anos de formação médica no Brasil, a ciência básica é ensinada no início da faculdade – geralmente nos dois ou três primeiros anos – e forma a base para raciocínio clínico essencial na vida do profissional de saúde.

“Este rápido declínio nas publicações de ciência básica é capaz de afetar a compreensão dos médicos e seu interesse nos mecanismos básicos da doença e os tratamentos”, alertou Dr. Warren Lee, principal autor do estudo publicado na edição de fevereiro da FASEB Journal.

Perguntas como “Se o declínio continuar poderia a ciência básica realmente desaparecer das páginas de revistas médicas?”, preocupam médicos renomados como Dr. Lee, que além de liderar a pesquisa, é médico na UTI do Hospital St. Michael e cientista do Keenan Research Centre for Biomedical Science.

A ciência básica é a área de conhecimento que examina as células e moléculas para entender melhor as causas e os mecanismos da doença. Ela difere da pesquisa clínica, que inclui ensaios clínicos de medicamentos e estudos epidemiológicos.

Dr. Lee e sua equipe fizeram um levantamento no Pubmed, o principal banco de dados de pesquisa médica, para identificar artigos sobre ciência básica publicados no período de 1994-2013 nas revistas de maior impacto em especialidades médicas como a cardiologia, endocrinologia, gastroenterologia, doenças infecciosas, nefrologia, neurologia, oncologia e pneumologia.

inception

Um estudo sobre estudos. Parece “Inception”, mas as conclusões afetam a formação médica.
Fonte: https://www.drupal.org/project/inception

Enquanto não houve declínio em dois dos jornais (Diabetes Care e Journal of the American Society of Nephrology), nas seis revistas restantes, a quantidade de ciência básica caiu de 40 a 60%.

Os pesquisadores especulam que pode ser em parte devido ao fato de que os artigos de investigação clínica – aquelas com medicamentos, placebos e grandes populações – são citados por outros pesquisadores com mais frequência, aumentando ainda mais a importância do próprio artigo. O número de vezes que um artigo é citado contribui para o “fator de impacto” de uma revista que indica a sua importância relativa no meio médico. Acontece de forma semelhante quando um site indica outro site (ou o próprio) em seu post.

O afastamento da ciência básica de revistas médicas coincide com a ascensão de outras formas de pesquisas médicas, como a epidemiologia e educação, e mais recentemente, qualidade do atendimento e ética. Além disso, é perigoso, pois leva o médico a acreditar – e não questionar – em representantes de empresas farmacêuticas, quando estes abordam o profissional de maneira pouco científica.

retrovirus

Às vezes não é tão divertido assim, mas a ciência básica na formação médica é essencial para compreender doenças e tratamentos de forma adequada.
Fonte: http://dna-protein.blogspot.com.br/2011/10/virus-vs-retrovirus.html

O declínio dessas publicações preocupa o Dr. Lee, porque médicos em formação (residentes), com pouco contato com a ciência básica, vão considerar esta área do conhecimento irrelevante. Isso gera um ciclo vicioso, pois se os médicos residentes pensam que a pesquisa nesta área é desinteressante, não vão considerá-la como parte de seu treinamento. Pontua ainda o líder da pesquisa que, avanços científicos nos levam a uma medicina cada vez mais personalizada, onde os médicos serão capazes de compreender exatamente o que está errado com cada paciente e adaptar o tratamento individualmente (tudo a nível bioquímico ou molecular).  Mas tudo isso depende da compreensão da ciência básica de todos os mecanismos.

Somente com a ciência básica os pesquisadores – e consequentemente os pacientes – podem avançar com resultados promissores (e polêmicos): Como gerar um bebê com material genético de 3 pessoas diferentes  e Cientistas recebem autorização para alterar genes de embriões humanos

Fonte: Sciencedaily