Imagine que você está em uma praia. Imagine-se tomando uma água de coco gelada, ouvindo o som das ondas se quebrando, vendo os guarda-sóis coloridos fincados na areia branca, sentindo a brisa refrescante trazendo o cheiro salgado de mar… espera, o mar tem cheiro?
Este cheiro de maresia característico que você sente quando está na praia não é da água do mar, nem dos peixes. O culpado é um composto de enxofre, o dimetilsulfureto, substância volátil liberada por bactérias, fitoplânctons e algas marinhas e que possui um papel importante na saúde dos oceanos.
Como todos os compostos que contém enxofre em sua composição, o dimetilsulfureto possui, em grande concentração, um cheiro desagradável, mas ele é muito importante na cadeia alimentar marítima, atuando como sinalizador para muitas espécies e, quando liberado na atmosfera, auxilia na formação de nuvens sobre os oceanos.
Essa substância de aroma ímpar é produzida por microorganismos que vivem nos oceanos e que utilizam enzimas específicas para processar dimetilsulfonopropionato, um antioxidante que remove outras moléculas reativas, e osmólito intracelular, que regula o balanço da pressão osmótica do meio intra e extracelular, mantendo o sal marinho do lado de fora da célula, e preservando a estabilidade conformacional de proteínas.
A produção de dimetilsulfureto é ativada principalmente quando o organismo sofre estresse por radiação UV. Esses microrganismos são a maior fonte natural de dimetilsulfureto, produzindo mais de 100 Gg (100 gigagramas) por ano.
Além disso, o dimetilsulfureto é a principal fonte de enxofre na forma reduzida no ciclo do enxofre. De forma similar ao ciclo do carbono, em que as plantas processam o CO2 produzido pelos animais, os compostos de enxofre são consumidos e produzidos num equilíbrio delicado.
Diversos grupos de seres vivos aprenderam que o dimetilsulfureto é um sinal de “comida por perto” e são atraídos por ele. Espécies de peixes são capazes de perceber o cheiro do dimetilsulfureto, que indica a presença de plumas de fitoplânctons das quais os peixes se alimentam. Aves marinhas, por sua vez, aprenderam que o dimetilsulfureto pode atrair cardumes de peixes e anuncia a hora do almoço.
Na atmosfera, o dimetilsulfureto é rapidamente oxidado para dióxido de enxofre (SO2) e sulfatos (SO4-2), formando aerossóis que agem como núcleo de condensação, onde as gotículas de água se juntam para formar nuvens, alterando a reflexão dos raios solares e contribuindo para o controle de temperatura do planeta.
Devido ao fato de que o dimetilsulfureto é um gás estufa negativo, o seu potencial para contrabalançar o aquecimento global está sendo estudado pela área de pesquisa “conexão alga-nuvem” numa tentativa de reverter ou pelo menos reduzir as mudanças climáticas. Uma intervenção desse tipo é arriscada, já que ainda não se conhece completamente esses ecossistemas.
Então da próxima vez que você estiver de férias na praia, lembre-se dos fitoplânctons e das algas unicelulares que tornam o planeta Terra habitável por nós, humanos.
Referências
Alcolombri, Uria; et. al. Identification of the algal dimethylsulfide–releasing enzyme: A missing link in the marine sulfur cycle. Science. Vol. 348, Issue 6242, pp. 1466-1469. 2015.
Sun, J; et al. The abundant marine bacterium Pelagibacter simultaneously catabolizes dimethylsulfoniopropionate to the gases dimethyl sulfide and methanethiol. Nature Microbiology. Vol 1. 2016.