Talvez seja só uma grande coincidência, mas passados alguns meses do filme estrelado por Matt Damon, pesquisadores da NASA uniram-se com cientistas do Centro Internacional de La Papa (CIP; ou em bom português, Centro Internacional da Batata), sediado no Peru, e estão conduzindo uma série de experimentos para testar se e quais tipos de batatas podem ser realmente cultivadas em Marte como fonte de alimento para os futuros colonizadores do planeta vermelho.
O estudo começou em janeiro e os cientistas esperam ter os primeiros resultados dentro de três meses, segundo informa o porta-voz do CIP, Joel Ranck. Nesta primeira fase, os pesquisadores estão estudando clones de uma variedade chamada LTVR (Lowland Tropic Virus-Resistant), que como o nome diz, é uma variedade resistente a vírus de terras baixas tropicais, como os vírus PVY, PVX e PLRV, que são bastante comuns neste tipo de cultura. Mas esta variedade não foi escolhida somente pela sua resistência a doenças virais comuns; ela também tem outras características que a tornam interessante numa perspectiva de viagem espacial: leva entre 90 e 100 dias para estar pronta para o consumo, pode produzir tubérculos mesmo em altas temperaturas e é bastante resistente à seca.
Os clones desta variedade de batata estão sendo plantados em amostras de solo provenientes de Pampa de La Joya, que é uma das regiões do deserto do Atacama. Este deserto é o local mais seco da Terra, espalhando-se por 105 mil km² entre Chile, Bolívia e Peru. Um dos principais cientistas responsáveis pelo experimento, o peruano Julio Valdivia-Silva, diz que os solos do Atacama têm muito em comum com os de Marte. “Ambos possuem níveis extremamente baixos de matéria orgânica e níveis altíssimos de materiais oxidantes. Por isso, os solos do Atacama têm sido usados como análogos aos solos marcianos em diversos experimentos”, diz Julio.
Além desta primeira fase, o experimento terá outras duas fases. Na segunda etapa, os pesquisadores tentarão congelar as batatas obtidas, já que a viagem a Marte pode durar até nove meses e neste tempo é interessante que as batatas possam ser transportadas sem germinar. Com estes testes, os cientistas podem determinar se será possível levar as batatas congeladas até Marte, revivê-las e plantá-las assim que chegarem, de modo satisfatório.
Já na terceira fase do experimento, os cientistas do CIP tentarão cultivar as batatas no interior de CubeSats no espaço.“Nós queremos investigar como elas crescem dentro de uma atmosfera controlada. Uma das características mais importantes de Marte é sua baixa pressão atmosférica e para que possamos estudar como as plantas reagem nestas condições, precisamos de um ambiente confinado nestes moldes, como o que temos dentro dos CubeSats” contou Valdivia-Silva.
Para esta terceira parte da experiência a intenção é aumentar a amostragem contando com a ajuda de pesquisadores e estudantes em várias universidades ao redor do mundo. A ideia é que os estudantes de diversas localidades preparem os CubeSats com os substratos e as batatas a serem cultivadas. Melissa Guzman, pesquisadora da NASA Ames Research Center na Califórnia, coordenará os esforços nos Estados Unidos. Segundo ela, “o que queremos é que os estudantes usem os CubeSats para compilar dados que possam ser comparados com o que obtivermos no Peru. É muito excitante pensar que batatas possam ser uma das primeiras refeições dos futuros astronautas em Marte”.
Todavia, nem tudo é sobre o planeta natal do Ajax. Os cientistas acreditam que as informações obtidas com este experimento poderão fornecer dados igualmente valiosos para que enfrentemos os problemas com o cultivo de batatas aqui mesmo na Terra, incluindo os efeitos causados pelo aquecimento global. Na fala de Joel Ranck, “Nossos cientistas aqui no CIP já descobriram que certas condições climáticas extremas diminuem a viabilidade destas culturas. A batata é uma fonte de alimento altamente nutritiva e pode salvar muitas pessoas de morrerem de fome. Somente no Peru, nós temos 4.000 diferentes variedades de batata. É irônico que tenhamos que olhar para Marte para entendermos nós mesmos, mas mesmo assim não deixa de ser interessante”.
Portanto, aos futuros felizardos (ou não) escolhidos para viajarem a Marte, não esqueçam o sal e o ketchup. Já que é para comer batatas, que sejam pelo menos bem temperadas.
Fonte: Scientific American, Marte