Olá beninês, como estamos? Continuem em casa, se puderem.
Qualquer um que já tenha estudado física moderna, por qualquer motivo que seja, sabe que a física, na virada do século passado, estava quase completa, ou, pelo menos, é o que grandes físicos achavam.
A mecânica, que até então não era chamada de “clássica”, junto à termodinâmica tinha dado ao mundo a revolução industrial, as máquinas a vapor, melhores moinhos, grandes engrenagens e sistemas complexos de máquinas que aceleraram a produção humana como nunca antes visto. Se colocarmos no time a mecânica estatística, conseguimos explicar os movimentos por todo o universo, do micro, como o movimento de partículas em certo líquido, ao macro, como a órbita dos corpos no nosso sistema solar. Com o eletromagnetismo, tínhamos a cereja do bolo. Unificamos a óptica, a eletricidade e o magnetismo. Finalmente, as cargas já não nos eram mistério, tão pouco as ondas que elas geravam. Conseguimos gerar grande quantidade de eletricidade, construímos a primeira hidrelétrica (1889).
Provaram do bolo.
— Que gosto estranho! Deve ter caroço nessa cereja.
As equações de Maxwell não casam com as regras conceituais da mecânica clássica.
— Olhem! Tem buracos no glacê.
Com tudo o que tínhamos, não conseguíamos explicar a radiação de corpo negro, nem o efeito fotoelétrico.
Façam mais glacê! Tirem o caroço dessa cereja! A nossa receita é maravilhosa, temos que fazer qualquer coisa para deixar o bolo perfeito. Tem que ter cereja! Tem que ter glacê!
Muitos físicos tinham a certeza que tinha caroço nas cerejas, mas eles nunca encontravam ou conseguiam tirar. Eles também culpavam a falta de glacê, mas, não importava o malabarismo que fizessem, sempre apareciam buracos no glacê.
O menino Albert gostava muito de cerejas, então decidiu confiar nelas, admitiu que a receita do bolo que estava errada, então, mudou a receita, fazendo ela se adequar ao seu gosto por cerejas. Albert Einstein confiou nas equações de Maxwell e tentou fazer com que a mecânica respeitasse as leis que o eletromagnetismo trazia, assim ele descobriu a relatividade (esse era o bolo bom para cerejas!). Nasceu a mecânica relativística, que diferia daquela que passou a ser a “mecânica clássica”.
Embora a relatividade tenha se mostrado um bolo muito bom, não só para quando se quer apreciar o gosto de cerejas, esse texto é sobre o que aconteceu com o glacê: O problema da radiação de corpo negro, que foi explicada por Planck, e o problema do efeito fotoelétrico, que também foi explicado por Einstein utilizando uma ideia parecida com a de Planck.
1.Receita do glacê: O problema da radiação de corpo negro
O problema da radiação de corpo negro foi resolvido por Planck e isso eu já falei, mas o que é um corpo negro? Um corpo negro é um objeto com a propriedade de absorver toda radiação eletromagnética à qual é exposto. Isso significa que, se você jogar luz num corpo negro, ele não vai refletir nada e a luz também não conseguirá atravessa-lo, por mais forte que ela seja. Isso aconteceria para qualquer onda eletromagnética (como raios-x, ondas de radio o seu wi-fi), por isso, não pense que qualquer objeto preto é um corpo negro. Objetos de cor preta refletem a radiação, mesmo que pouquinho, além de se permitirem ser transpassados por radiações fora do espectro visível (vulgo, cores do arco-íris). Contudo, um corpo com essas propriedades de absorção do corpo negro irradiaria calor, ou seja, para conservar a energia que ele absorve das ondas eletromagnéticas, ele teria que esquentar. Logo, embora ele não reflita nenhuma radiação, ele continuaria emitindo radiação, a dele próprio pelo fato dele esquentar.
O problema está nos dados da previsão teórica, muito bem embasados em toda física que se conhecia na época, não baterem com o que se encontrava quando se media a radiação emitida por um corpo negro. Podemos obter uma boa aproximação com uma cavidade, algum objeto com um buraquinho, de modo que a radiação (imagine luz) entre e tenha muita dificuldade de sair:
E como Planck resolveu esse problema? Bom, ele arranjou um problema para ele. Ele percebeu que os dados bateriam muito bem se radiação que foi absorvida pela cavidade, e ficou refletindo lá dentro, só assumisse alguns valores, valores discretos, não mais de forma contínua. Em outras palavras, isso implicaria que essas ondas eletromagnéticas (radiação) só poderiam ter valores de frequências determinadas, ou seja, a frequência da onda, assim como sua energia, não seria mais contínua e sim discretizada.
Isso também quantizou a energia das ondas emitidas pelo corpo negro, logo, a energia deveria ser uma grandeza quantizada, um múltiplo inteiro de um valor fundamental. Imagine que esse valor fundamental é 2, isso quer dizer que na natureza você só poderia encontrar valores de energia como: 4, 6, 22, 100. Nunca encontraria um 5 ou um 11, pois estes não são múltiplos de 2.
O problema era que Planck não aceitava esse resultado como um resultado físico, apenas um truque que a matemática tinha lhe permitido para poder obter um gráfico bonito. Mas, a despeito de sua crença, a natureza a provou errada. Planck sabia que esse ingrediente ajudaria a fazer um glacê melhor, só não aceitava que a solução viria de algo de valor tão simples heheheheh.
2.Receita do glacê: O problema do efeito fotoelétrico
Quanto ao efeito foto elétrico, qual era o problema?
Efeito fotoelétrico é o efeito de elétrons pularem superfícies metálicas quando se incide luz sobre elas, por isso o nome: foto: luz; elétrico: elétrons. Se a luz é uma onda, como manda o eletromagnetismo, e ondas são contínuas, os elétrons no metal receberiam a energia da onda eletromagnética (luz) de forma contínua. Ou seja, se a intensidade da luz for alta, muitos elétrons iram “pular” do metal rapidamente e suas velocidades seriam mais altas, e, se a intensidade a luz for baixa, a superfície metálica demoraria a emitir os elétrons (mas emitiria mais cedo ou mais tarde) e estes seriam ejetados com baixa velocidade. O problema é: isso não ocorre. Os experimentos mostravam que a velocidade com que os elétrons eram ejetados dependia somente da frequência (frequências diferentes = cores diferentes) e que, além disso, existiam uma frequência mínima (lembrem-se da equação, frequência mínima = energia mínima) para que eles fossem emitidos do metal.
Isso é o que leva Einstein a propor que a luz, quando interagia com os elétrons, vinha em forma de pacotinhos (vulgo fóton), da mesma forma que Planck fez. Por ela ser um conjunto de pacotinhos, cada pacotinho tem uma energia certa, dependendo de sua frequência (cor). Logo, se o pacotinho tem a energia mínima para fazer o elétron saltar, ele pula, do contrário, ele continua onde está.
Mas o elétron não pode acumular pacotinhos de energia e pular?
Não, ele não pode. Ele só consegue um pacotinho por vez, pois ele só interage com um fóton por vez. Logo, a energia, aqui também, é quantizada e pela mesma equação que Planck mostrou (aquela lá em cima).
Diferentemente de Planck, Einstein, de fato, afirmou que a energia era quantizada. Ele era muito mais jovem que Planck e não estava tão arraigado aos conceitos daquilo que viria a ser a física clássica. O menino Albert apostou no ingrediente novo para ajudar no glacê.
E assim nós tivemos o glacê para acompanhar o bolo, mas, mais uma vez, esse glacê não ia bem com aquele “bolo clássico”. O bolo ia muito bem sozinho, já o glacê (os princípios da quântica) revestiu e ajudou da base de muitos outros doces. Vieram outros confeiteiros como Bohr e Dirac. Este último, inclusive, tentou juntar o glacê com o novo bolo de Einstein, só conseguiu com uma parte, mas a quântica e a relatividade geral não se dão lá tão bem. Pelo menos, até um novo cientista propor e mostrar uma boa receita para unir esses dois sabores.
Bom, é isso pessoinhas, espero que tenham conseguido entender. Dúvidas? Pode mandar aí em baixo é sempre um prazer responder.
E, se tiverem mais perguntas, #desafioredatoresdeviante.
Tenham uma boa semana de Mecânica Quântica aqui no portal Deviante.