Era final da primavera e o vento gelado do norte ainda soprava naquela região, Luca tinha viajado quase toda a primavera para chegar no norte do continente do lado ocidental, as chamadas terras livres ou terras dos bárbaros.
A pedido da Ordem, ele foi verificar um boato de certos comerciantes que tinham avistado uma caravana de homens das ilhas do sul vagando por aquele lugar. Eles não negociavam, nem queriam conversa, e os comerciantes eram impedidos de andar entre esses nômades. A Ordem gostaria de saber o que estavam fazendo ali, pois estavam muito distantes da terra deles.
Ao chegar no local indicado, Luca viu um grande descampado a perder de vista com apenas pequenos montes. Mais tarde, ele seguiu a dica de alguns viajantes que tinham avistado um assentamento de homens das ilhas perto do rio Dyg.
No dia seguinte, chegou no lugar descrito pelos viajantes. Havia um pequeno vilarejo que era acessado por uma ponte improvisada com dois homens que discutiam fortemente.
Quando avistaram Luca, eles interromperam a discussão para focar no visitante, porém o jovem tinha escutado um pouco, era algo sobre gastar toda a energia interna de uma vez, enquanto o outro achava interessante a ideia de não usar como uma explosão, e sim como um fluxo constante de energia. O jovem não entendeu, mas ficou ainda mais curioso sobre o assunto.
— Olá, rapaz! Eu me chamo Ganzouri, protetor sol de Erdeni — disse o primeiro guardião.
— Sou Naran, filho de Tömör, guardião-sol, você pode dar meia-volta. Não tem nada para ver aqui — avisou em tom mais severo que o segundo.
— Saudações, sou apenas um visitante em busca de conhecimento, gostaria de conversar apenas e trocar conhecimento. Não quero confusão — disse Luca começando a descer do cavalo.
— Sugiro não fazer isso, você está nos desafiando — disse Naran.
— Nós sabemos quem é, você tem ligação com magia, os símbolos que carrega indicam o caminho que segue — falou Ganzouri enquanto entrava em posição de combate.
— Calma, sou apenas um viajante, não quero confusão — disse Luca desistindo da ideia de descer.
— Nosso vilarejo não recebe visitantes para segurança do nosso povo, você não pode entrar, preciso que volte — explicou mais calmo Ganzouri.
— Eu gostaria de aprender. Meu mestre quis que falasse com o sábio daqui para aprender algo novo, conseguir mais conhecimento, disse que era importante — justificou Luca insistindo mais um pouco e conseguindo franzir as testas dos guardiões.
— Não somos uma escola, garoto. Estamos muito ocupados, último aviso, pode ir embora — falou Ganzouri.
— Chega, ele não vai ouvir a razão, precisa de uma lição — disse Naran correndo em direção a Luca numa arrancada surpreendente.
— Espere, eu gostaria de falar com o garoto — disse um senhor com voz rouca acompanhado de uma jovem garota.
Naran parou no meio do caminho fazendo a poeira subir para alívio de Luca, enquanto o senhor continuava a aproximar-se deles.
— Saudações, meu jovem. Ninguém pode entrar no nosso vilarejo, não queremos confusão, por isso decidimos nos estabelecer nas terras livres, longe da guerra que assola as nossas ilhas — falou o senhor.
— Como sabia que alguém de fora havia chegado na entrada do vilarejo? — perguntou Luca.
— Senti uma presença poderosa e fiquei surpreso ao ver alguém tão jovem com uma energia tão divergente. Sobre o que gostaria de conversar? — disse o senhor se sentando sobre uma pedra e convidando a Luca a fazer o mesmo.
Quando o jovem paladino se sentou, seus olhos começaram a brilhar e Luca entrou em um sonho sobre sua vila natal. Assim que voltou, o senhor parecia contente, enquanto que os outros estavam boquiabertos com o que tinham visto e escutado.
— Muito bem, meu jovem. Seu mestre é único, foi uma conversa bem interessante. Muito obrigado — disse o senhor se levantando.
— Odtti fará um treino contigo, você pode descansar do lado de fora sob vigia de Naran e Odtti — explicou o senhor.
— Quando estiver pronto, quero que vá embora amanhã antes do pôr do sol, entendido? — perguntou o senhor.
— Sim, entendido. E obrigado — Luca fez uma reverência que foi retribuída pelo senhor que começou a voltar para a vila.
Luca ficou acompanhado dos três que ficaram satisfeitos em atender o mestre, além de conversar um pouco sobre a vida nas ilhas e a guerra que tinha chegado lá. Luca contou sobre o seu treino na Ordem, além da experiência sobre seu mestre. Eles ficaram ainda mais admirados. Ganzouri pediu desculpas, tinha um compromisso e foi embora no fim da tarde.
A noite foi tranquila com um céu limpo e repleto de estrelas sem animais incomodando com uivos ou barulhos estranhos apenas o som do povo da vila e do rio. De manhã, Luca foi servido com um café típico do povo dali, feito por Naran. Odtti tinha se ausentado, mas voltou a tempo de tomar café com eles junto com um embrulho.
Depois de comer, eles conversaram por mais uma hora, então a jovem se levantou e pediu alguns minutos para ficar pronta para a demonstração. Ela abriu o embrulho que estava cheio de um material amarelo e fino. Luca foi em direção a ela, cheio de curiosidade para ver o que ela fazia, a moça entregou para ele um dos itens.
— Isso é papel? — perguntou ele.
— Sim, um tipo especial que é feito pelo meu povo — falou Odtti.
Luca examinou, era um material de muita qualidade, talvez durasse mais, porém não parecia ter nada de tão especial.
A moça começou a dobrar as folhas, ele jurava que as mãos dela soltavam algumas faíscas enquanto fazia aquilo. Primeiro, ela dobrou vários materiais de forma curva, então pegou um pedaço bem maior, passou um tempo e fez rapidamente algo que lembra um broquel. Os outros pedaços, ela foi encaixando no próprio corpo, então, em 5 minutos, ela disse que estava pronta para uma demonstração de combate. Isso deixou Luca bem surpreso.
— Ela está falando sério garoto, mas não vá machucá-la — avisou Naran.
— Hã… Tudo bem. Você tem certeza disso? — Luca respeitosamente ficou em posição de combate com sua adaga.
— Vai se arrepender de não usar sua espada — disse rindo fazendo uma reverência.
Odtti disparou em uma velocidade incrível. O primeiro golpe foi no pulso de Luca fazendo ele soltar a adaga, o segundo golpe, ainda com o “broquel”, pegou levemente no peito dele.
Luca ficou espantado com o que aconteceu, a velocidade dela era incrível. E agora estava desarmado. Ela tentou outra investida, Luca bloqueou os ataques para surpresa da moça, que ainda acertou um chute na coxa esquerda, mas o impacto contra proteção do jovem causou mais dor nela pela careta que fez.
Outra vez, ela avançou furiosamente. Foram vários golpes que resvalavam em Luca até que ele acertou a ponta do pé na coxa esquerda de Odtti, ela, ao mesmo tempo, acertou a face do jovem que ficou tonto e vendo estrelas.
Ela não conseguia mais manter a base de ataque e ele ainda estava tonto, mas Naran decidiu interromper.
— Bem… Podem considerar um empate? Claramente os dois não podem mais continuar isso, concordam? — sugeriu (em tom de ordem) com um belo sorriso no rosto.
— Concordo, já é o suficiente e minha perna está doendo bastante! Eu espero que tenha gostado da demonstração do nosso estilo de luta? — perguntou Odtti fazendo uma reverência com bastante dor.
— Sim… Eu preciso de um pouco de ar, seu golpe foi… devastador — disse Luca que sentou aonde estava.
— A propósito, o que você fez com esse papel? Parece que dei um golpe em metal — perguntou Luca ainda zonzo.
— Não posso explicar como a gente faz, mas posso dizer que a ideia desse material é atingir a rigidez do ferro com a leveza do papel, pegue isso — disse ela pegando com alguma dificuldade um pedaço que tinha guardado.
Odtti, mais uma vez, moldou o material fazendo algumas faíscas criando um protetor de peito básico, depois entregou a Luca.
— Tome, pode usar embaixo da sua proteção, não vai incomodar, nem criar um peso extra, é um presente do nosso povo — a jovem entregou o item ao jovem paladino.
— Muito obrigado, eu gostaria de tratar seu ferimento, se você permitir antes de eu ir embora — pediu Luca de forma amistosa e foi retribuído com dois sorrisos.
Precisou de alguns minutos para tirar a dor e deixar a perna de Odtti no caminho de ficar boa, ele ainda comeu com os dois mais uma vez. Quando terminou, ainda conversou um pouco enquanto arrumava seu cavalo. Ele desejou sorte à vila e foi retribuído com o mesmo desejo. Assim, partiu o jovem paladino dali conforme combinado, para nunca mais voltar sem convite.