O título ficou bem bucólico, né? A mulher do campo… Uma imagem de Renoir, tal e coisa.
Mas não, vamos falar da mulher produtora rural.
Existe uma campanha da ONU, Mulheres Rurais, que aponta cada um dos problemas sofridos por essas mulheres, levanta soluções e traça políticas públicas de valorização desse trabalho e consequentemente, dessas pessoas.
De acordo com a ONU, 25% da população mundial são formados por mulheres que vivem e trabalham nas áreas rurais. Aqui no Brasil, 14 milhões de mulheres, de acordo com o Censo Rural de 2006, moram e trabalham na área rural. São responsáveis pela produção de 45% de todo alimento plantado e colhido no país. (Um novo censo agropecuário está sendo finalizado no momento, com previsão de publicação dos resultados em julho de 2018).
As mulheres do campo, ou mulheres rurais estão por todos os setores: estão no campo, nas lavouras, comunidades quilombolas e indígenas, nas reservas extrativistas e são protagonistas da agricultura familiar. Elas estão assumindo cargos de Empresas Agropecuárias, destacando-se em posições de comando, engenheiras, médicas veterinárias, empresárias, líderes rurais. Além disso, protagonizando e assumindo o comando na Agricultura Familiar.
Atente-se aqui para a importância da Agricultura Familiar no Brasil: “constitui a base econômica de 90% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes; responde por 35% do produto interno bruto nacional; e absorve 40% da população economicamente ativa do país. Ainda segundo o Censo, a agricultura familiar produz 87% da mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz e 21% do trigo do Brasil. Na pecuária, é responsável por 60% da produção de leite, além de 59% do rebanho suíno, 50% das aves e 30% dos bovinos do país. A agricultura familiar possui, portanto, importância econômica vinculada ao abastecimento do mercado interno e ao controle da inflação dos alimentos consumidos pelos brasileiros.” Essas informações e outras, você encontra aqui no site do Governo Federal
Nos últimos anos, as mulheres rurais foram incentivadas a oficializar o seu protagonismo através de políticas públicas que as colocaram a cargo diretamente da renda: Programas e linhas de crédito rural específicos para mulheres agricultoras. Antes coadjuvantes nas decisões de investimentos em suas propriedades rurais, passaram a ter possibilidade de decidir onde, quando e como aplicar o dinheiro em suas propriedades.
Uma situação que particularmente eu observei bastante durante vários anos, era que, para se aposentarem anteriormente, deveriam comprovar que eram produtoras rurais. Mas como fazer isso se nunca nenhum documento saiu em seu nome? A propriedade da terra geralmente é em nome do marido, as notas fiscais de compra e venda de produtos são em nome do marido. Consegue observar aí a dependência do marido até na hora de se aposentar, depois de anos e anos trabalhando de sol a sol?
Agora elas fazem as negociações, abrem contas em bancos, definem e direcionam projetos.
Exemplos eu tenho de sobra, mas vou generalizar aqui: Produtora chega no escritório sem saber como são os procedimentos legais para ter uma criação de bovinos; tem ideia das doenças, porém não sabe da burocracia pois tudo isso ficava a cargo do marido (que vinha para a cidade sozinho resolver essas questões enquanto ela ficava lá na roça tomando conta da família, da casa e da roça). Sabe que agrotóxico é tóxico para a família dela, porém não sabia dos detalhes.
Chegando no escritório, ela logo se pronuncia e deixa essas limitações bem claras. Bom, elas fazem isso porque tem abertura para tal, pois somos quatro mulheres atendendo também (duas técnicas administrativas, uma técnica agrícola e uma médica veterinária). E ao repassar as informações, compartilhar experiências e organizar as ideias, essas produtoras rurais, além de continuarem fazendo um trabalho fabuloso na produção direta como já vinham fazendo há tempos, agora passam a desenvolver um trabalho excepcional na administração rural e na qualidade da saúde do rebanho, do ambiente e da família, garantindo a segurança alimentar e nutricional da sua família e de toda a população que consome aqueles produtos.
Ainda estamos em luta por direitos e espaços para a mulher rural por todo o mundo.
Aqui no Brasil, temos a Marcha das Margaridas. O intuito da Marcha das Margaridas é ser “um grande momento de animação, capacitação e mobilização das mulheres trabalhadoras rurais em todos os estados brasileiros, além de proporcionar uma reflexão sobre as condições de vida das mulheres do campo e da floresta.” e você pode ler mais nas Margaridas aqui.
No início do ano, num Congresso da ONU, a representante brasileira Ministra Fatima Pelaes discursou nas Nações Unidas durante a abertura da 62ª Sessão da Comissão sobre o Estatuto da Mulher, CSW. Pelaes anunciou o lançamento do Ano da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (Cplp) por uma vida livre de violência contra mulheres e meninas como representante do Estado que preside Cplp. Ressaltou a importância das políticas voltadas às meninas e mulheres do campo e trabalho conjunto para educação dos meninos e homens do campo nos países lusófonos.
Já falei disso anteriormente lá nos primórdios do Spin de Notícias, o Spin 29 sobre a Peste dos Pequenos Ruminantes (PPR). A PPR é uma doença que atinge as criações de caprinos (cabras e bodes) e ovinos (carneiros e ovelhas) e atinge diretamente na autonomia das produtoras rurais. Por serem animais de pequeno porte e de mais fácil manejo, mulheres por todo o mundo são responsáveis por esses rebanhos. Se algo atinge esses rebanhos, atinge diretamente a vida dessas famílias e mulheres rurais. Por isso, um trabalho muito árduo para a erradicação dessa doença é essencial para a emancipação dessas mulheres. Veja só como tudo é muito interligado!
Com esses exemplos, mostro que a luta pelo fortalecimento das Mulheres no campo e do campo, das Mulheres Rurais, é uma luta por todo o planeta e em benefício de toda a população mundial pois envolve além delas diretamente, suas famílias, produção de alimentos, segurança alimentar e nutricional, entre outros fatores tão ricos a um desenvolvimento sustentável.