Não só o treinamento faz um bom soldado. Em campo, seu equipamento tem de ser tão bom quanto às instruções que recebeu no quartel e centros de treinamento militares. Desde de épocas antigas, os primeiros soldados sempre buscaram os melhores equipamentos e armas para sobreviver às guerras. Aqui mostraremos exemplos de equipamentos do exército inglês desde o século XI até os dias atuais.

Devemos lembrar que equipamentos padrão para soldados só existiriam a partir do Século XVII, com o Exército do Novo Tipo, na Inglaterra. Alguns equipamentos que veremos abaixo não eram para todos os soldados, por isso fique atento ao texto explicativo.

Para facilitar nossa lista de materiais bélicos dos soldados, focaremos na evolução do exército inglês e suas etapas, desde a invasão normanda em 1066 até os combates atuais.

Todas as fotos mostradas aqui são de autoria de Thom Atkinson, um fotógrafo britânico que documenta o equipamento militar britânico ao longo de 1000 anos de História. Sua série de fotos, intitulada “Inventário dos Soldados”, captura em fotos de alta qualidade os equipamentos medievais e modernos da Grã-Bretanha.“A Inglaterra passou muito de sua História lutando contra outros países” falou Atkinson.

 

1- SOLDADO NORMANDO NA BATALHA DE HASTINGS, 1066

Durante o século X e XI, os exércitos da Europa Ocidental sofreram muita influência nos seus estilos de luta e equipamentos de dois lugares diferentes: dos guerreiros nórdicos da Escandinávia e dos cavaleiros francos. O exército normando era como uma mistura dessas duas táticas de guerras diferentes (luta de parede de escudos e cargas de cavalaria), somando à uma arma pouco conhecida e com um futuro devastados, as primeiras balestras (ou bestas – crossbows). O exército de invasão de Willian o Bastardo consistia em unidades de cavalaria armadas com lanças, escudos e armaduras de cota de malha, apoiadas por infantaria similarmente armada e arqueiros com bestas.

Abaixo vemos um “kit” com todos os equipamentos que um soldado a pé ou um cavaleiro normando carregaria ao campo de batalha. Perceba o jaquetão de couro que seria vestido embaixo da cota de malha. Também veja que não só a espada, mas machados, adagas e lanças eram armas muito usadas na época

Kit soldado século XI – por Thom Atkinson

 

2- CAVALEIRO CRUZADO, 1244

Esse equipamento já é específico para um cavaleiro montado inglês durante as campanhas medievais do século XIII. Perceba a diferença entre os capacetes desse século com os das guerras dos séculos X e XI. Perceba também a maior quantidade de protetores de couro, camadas extra de proteção, para evitar ferimentos com flechas e dardos de bestas, que evoluíram bastante em formato, perfurando até as melhores armaduras.

Houve uma grande mudança nos elmos e nas armas também. Os elmos estão quase totalmente fechados, com protetores frontais muito melhores que os de 200 anos atrás. Uma capa e uma túnica colorida seria colocada em cima de toda a armadura, para destacar a heráldica e os símbolos do cavaleiro, destacando seu status de nobreza em campo.

Kit de armas e armaduras para cavaleiros montados, Século XIII – por Thom Atkinson

 

3- Arqueiro inglês na Batalha de Agincourt, 1415

Aqui temos outro exemplo de equipamentos feitos especialmente para uma classe de soldados, nesse caso os famosos arqueiros ingleses. Por não terem status de nobreza e virem das camadas mais baixas da sociedade inglesa, os arqueiros ingleses não tinham um equipamento padrão, variando de feudo em feudo, dependendo de quanto o nobre feudal estaria dispostos a pagar para armar seus arqueiros. O único equipamento padrão para todos era o famoso Arco Longo Inglês, com suas origens no país de Gales.

Perceba que em termos de armadura, a maioria dos arqueiros estavam apenas equipados com um gibão (jaqueta) reforçado de couro e um bacinete (elmo) de metal. Raramente os arqueiros usariam cota de malha, uma vez que precisavam ser mais móveis e leves em campo de batalha.

Kit de arqueiro inglês da Batalha de Agincourt, 1415 – por Thom Atkinson

 

4- CAVALEIRO INGLÊS DA GUERRA DAS DUAS ROSAS, BATALHA DE BOSWORTH, 1485.

A Guerra das Rosas foi uma das maiores e mais violentas guerras civis ocorridas nas ilhas britânicas. Foi tão sangrenta que ela mantém o título de conter a batalha mais sangrenta da história inglesa. Em apenas 1 dia de combate, durante a Batalha de Towton em 1461, aproximadamente 28 mil ingleses morreram, comparando com a segunda mais sangrenta dos ingleses, a batalha do Somme, na Primeira Guerra Mundial, onde no primeiro dia morreram 20 mil soldados.

O cavaleiro abaixo usa as famosas armaduras completas de chapas de aço, as armaduras góticas dos anos 1400 – 1500 (as famosas “full-plated armors” dos jogos de RPG), uma tentativa de evitar ferimentos de flechas e dardos, que furavam constantemente as cotas de malha. Perceba também que os soldados nessa época preferem armas com pontas afiadas e pesadas (como martelos, machados, maças, acha d’armas), armas que pareciam mais abridores de lata gigantes, justamente para furar os peitorais de aço, atingindo em cheio o inimigo.

Kit de cavaleiro inglês da Guerra das Duas Rosas, Batalha de Bosworth, 1485 – por Thom Atkinson

 

5- ARCABUSEIRO INGLÊS, CONFLITOS RELIGIOSOS EUROPEUS, 1588

Na época do reinado de Elizabeth I, a Inglaterra passou a ter um papel maior nas guerras e conflitos na Europa Continental. Foi nos anos 1580, por exemplo, que o Rei Filipe II da Espanha prometeu invadir a Inglaterra e a transformar novamente em um país católico (lembrando que fora o Pai de Elizabeth, rei Henrique VIII, que havia transformado a Inglaterra num país protestante).

Foi durante os anos 1530 – 1640 que vemos a difusão das primeiras armas de fogo portáteis funcionais e a criação de táticas e tropas especializadas apenas nessas novas armas. Assim nasceu o arcabuseiro, os soldados treinados apenas em manusear o Arcabuz, o primeiro modelo de mosquete fabricado em grande quantidade e difundido por toda a Europa. Aqui vemos um período de transição entre as táticas medievais e as táticas de guerra em linha de fogo dos anos 1700. Esse período será conhecido como “Período da Pique e do Tiro”, onde existiram dois tipos de soldados de infantaria principais: O Piqueiro, portador de uma pesada e comprida lança, que protegeria os arcabuseiros das cargas de cavalaria; e o arcabuseiro, incumbido da missão de fazer chover “fogo e metal” sobre o inimigo.

Kit de equipamentos de um arcabuseiro inglês, anos 1580 – Por Thom Atkinson

 

6- SOLDADO DO EXÉRCITO DO NOVO TIPO, GUERRA CIVIL INGLESA, 1642 – 1649

Juntamente com as novas táticas militares envolvendo apenas tropas com armas de fogo, surgiu um novo tipo de soldado: o soldado profissional. Aquele que faria do Exército e das guerras sua profissão, e ganharia um salário (o soldo) em troca desse serviço. O principal marco para a História do soldado profissional foi a Guerra Civil Inglesa, onde as forças parlamentaristas de Oliver Cromwell criaram o “New Model Army” (Exército do Novo Modelo), onde os soldados não mais seriam convocados por seus senhores feudais e lutariam por eles, mas sim seriam convocados para defender seu país, sua pátria, em troca de um salário. Foi juntamente com o exército do Novo Tipo que um novo uniforme padrão foi criado, uma túnica vermelha, que se tornaria o principal símbolo dos soldados ingleses dos anos 1700 – 1800, os “Casacos Vermelhos”

Kit de mosqueteiro parlamentarista da Guerra Civil Inglesa, 1642 – 1649, por Thom Atkinson

 

7- SOLDADO BRITÂNICO DOS ANOS 1700 – BATALHA DE MALPLAQUET, 1709, GUERRA DE SUCESSÃO ESPANHOLA

Com a chegada dos anos 1690, uma onda de mudanças chegou à Europa e suas colônias. Agora a Inglaterra era conhecida como “A Rainha dos Mares”, com um vasto império comercial e territorial, indo das Américas até a Índia.

Nas Relações Internacionais, os britânicos tiveram uma participação muito mais ativa, principalmente depois da Guerra Civil Inglesa e da Revolução Gloriosa de 1688.

De 1701 a 1714, honrando suas alianças com países protestantes europeus e sua rivalidade antiga com a França, a Inglaterra se envolveu na Guerra de Sucessão Espanhola, quando dois pretendentes ao trono espanhol chamaram todos seus aliados e parentes. Foi uma verdadeira guerra de interesses, que atingiu não só a Europa, mas como as colônias no Novo Mundo e na África. Foi essa guerra que preparou o mundo para a “verdadeira primeira guerra mundial”, a Guerra dos 7 Anos (1754 – 1763).

Juntamente com esse novo ar internacional, uma nova arma foi criada e aprimorada, o mosquete de pederneira (um mecanismo muito mais eficaz do que o arcabuz de barbante – que usava um barbante incandescente para atear fogo a pólvora), e um novo soldado inglês nascia, um que iria lutar tanto na Europa quanto nas colônias, o famoso “Casaco Vermelho”.

Kit de soldado inglês da Guerra de Sucessão Espanhola (1701 – 1714), por Thom Atkinson

 

8- SOLDADO BRITÂNICO DAS GUERRAS NAPOLEÔNICAS (1814 – BATALHA DE WATERLOO) E DA GUERRA DA CRIMEIA (1853 – BATALHA DO RIO ALMA)

Com as guerras napoleônicas, o mundo veria o gênio militar de Napoleão à todo vapor e a ascensão britânica a status de potência mundial. Pouco mudaria entre as Guerras Napoleônicas e a Primeira Guerra Mundial na parte tática militar, já em tecnologia seria outra História. Durante os anos 1840 – 1850 vemos o desenvolvimento das cápsulas de percussão (que substituiriam o sistema de pederneira nos mosquetes, tornando as armas de infantaria mais rápidas de carregar e mais precisas), assim como a alma raiada das armas (tornando o tiro e o projétil mais estáveis em voo). Porém pouco se mudou no equipamento militar dos soldados, apenas as fardas de diferentes unidades eram de cores diferentes, mas a base dos equipamentos continuou a mesma.

Equipamento militar de um soldado de linha britânico durante a Batalha de Waterloo – 1814, por Thom Atkinson

 

Equipamento de um atirador leve britânico durante a Guerra da Crimeia (1853 – 1854), por Thom Atkinson

 

9- SOLDADO BRITÂNICO DA PRIMEIRA GUERRA, BATALHA DO SOMME, 1916

Com a Revolução Industrial e novas armas e tecnologias, como a metralhadora, o fuzil de ação por ferrolho, revólveres e pistolas, a quantidade de tiros dado por um soldado aumentou consideravelmente, porém as táticas continuavam as mesmas desde a época de Napoleão, com tropas marchando e fila em campo aberto, sem contar as cargas de cavalaria. Isso mudaria completamente com a Primeira Guerra Mundial, uma guerra onde o encontro de táticas arcaicas com equipamento moderno mancharia a terra de sangue numa quantidade nunca antes vista na Europa.

Apesar de estarem melhor preparados para uma guerra moderna, com equipamentos modernos, os britânicos sofreram com os mesmo generais arcaicos que os franceses e alemães tinham. Isso aumentou a quantidade de baixas acontecidas na Batalha do Somme, uma batalha onde as tropas tinham pouca mobilidade e seus comandantes pouca visão estratégica para tomar as trincheiras inimigas.

O Fuzil padrão britânico da época era o Lee-Enfield SLME, que tinha capacidade de segurar 10 tiros antes de uma recarga completa. A cada tiro, o soldado deveria levantar e puxar uma alavanca (ferrolho), para liberar o cartucho usado e colocar o seguinte em posição de fogo. A introdução de um capacete de aço, para proteger de estilhaços, para todas as tropas, só ocorreria nos fins de 1915.

Equipamento de um soldado britânico durante a Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918), por Thom Atkinson

 

10 – Paraquedista Britânico, Dia D, 1944, Segunda Guerra Mundial

As lições aprendidas com tanto sangue durante a Primeira Guerra Mundial não foram em vão. O Reino Unido liderou o treinamento e o desenvolvimento de novas táticas militares para englobar as novas tecnologias (como submetralhadoras, metralhadoras leves, tanques, aviões e desembarques anfíbios). Tanto que os precursores da tática “blitzkrieg” eram oficiais do exército britânico que, durante as décadas de 1920 e 1930 influenciariam vários militares alemães, principalmente o general Heinz Guderian, a implementar a “Guerra Relâmpago”.

Em 1944, a maré da guerra virava completamente: do leste, os alemães experimentavam derrota atrás de derrota por um exército vermelho revitalizado e com mais tanques e tropas do que eles; a Itália já havia sucumbido à uma invasão aliada e estava dividida (O norte ainda sob domínio de Mussolini, e o sul totalmente liberado e ajudando os Aliados). Assim, era uma questão de tempo que uma invasão aliada ocorresse na França.

A Operação Overlord foi a maior invasão anfíbia e aérea da História, contando com o ataque coordenado das Marinhas aliadas, da Aviação e das tropas de desembarque terrestre. E aqui entra o paraquedista, um novo tipo de infantaria, levemente armado, mas pronto para causa o maior estrago possível atrás das linhas inimigas, destruindo ferrovias, rodovias, controlando pontes e destruindo armazéns de munição e combustível.

Kit de equipamentos de um paraquedista britânico, 1944, por Thom Atkinson

 

11- Soldado da engenharia, Conflitos no Oriente Médio, anos 2000 – 2010

Assim, chegamos ao soldado moderno. As lições da Segunda Guerra foram aprendidas e agora temos um soldado “completo”. Cada soldado tem que carregar seu equipamento para sobrevivência em campo além de arma, munição, e equipamentos específicos para o trabalho desempenhado pelo soldado, nesse caso um engenheiro sapador de campo (com suas cargas de demolição e ferramentas)

Kit de engenheiro-sapador britânico, anos 2000 – 2010, por Thom Atkinson

 

Esse grande projeto fotográfico mostra as excepcionais similaridades e diferenças entre os vários equipamentos dos soldados durante a História. Espadas se tornaram armas de fogo, elmos se tornaram máscaras de gás. Apesar de visivelmente e mecanicamente as ferramentas e armas dos soldados se modificaram, as necessidades sempre continuaram as mesmas, sobreviver em campo e matar o inimigo. “O fato de que muitos equipamentos continuaram seguindo uma certa lógica é mais interessante do que a mudança total nesses equipamentos” afirma Atkinson, que se referiu ao detalhe que em todo equipamento mostrado aqui, sempre se encontra objetos do dia a dia, como uma colher por exemplo.

 

Texto adaptado do side The Vintage News (Clique aqui para ler a notícia original, em inglês)