Sim, caros leitores, estou de volta para mais uma divagação. Em meu último texto apresentei a crise existencial na qual a física teórica passa atualmente e isso me fez lembrar de um velho conto:

Alice (Armandinho) andava por aquele bosque, quando se deparou com o Gato de Cheshire sentado num galho de árvore.

– Gatinho de Cheshire – começou ela meio insegura – Por favor, pode me dizer qual o caminho para eu sair daqui (obter uma teoria mais fundamental que o modelo padrão)?

– Depende muito do lugar para onde quer ir (se você prefere supersimetria, dimensões extras, etc..).

– Ora, não me importa o lugar. (só preciso de um sinal da natureza para onde seguir)

– Então não importa qual caminho seguir.

Antes de seguir para qualquer caminho, vamos primeiro entender como chegamos na árvore do Gato de Cheshire (bóson de Higgs). O método utilizado para detectar coisas tão pequenas quanto partículas elementares é, historicamente, fazer coisas (átomos, protons, elétrons) se colidirem. Há alguns anos, assisti a uma palestra sobre isso e o professor fez uma analogia ótima sobre a lógica por trás desse método:

“Imagine que somos pessoas curiosas e gostaríamos de saber do que é constituído um carro, uma vez que sabemos como ele funciona na teoria. Qual é o método mais razoável de se fazer isso? Pegamos dois carros iguais, digamos dois Camaros amarelos (que estava em moda na época), colocamos um contra o outro e depois da batida vemos o que saiu dali.

Se colocarmos os dois para bater a 10 km/h, o retrovisor vai sair voando, logo, detectamos que Camaros amarelos tem retrovisores. Ao aumentar a velocidade (energia), temos acesso a constituintes cada vez mais internos do carro, a 50km/h sai o radiador; a 100 km/h , a vela do motor; a 150 km/h detectamos um parafuso que estava atrás do transformador. Aliás, isso é outro fator interessante, sabendo como o objeto sai depois da colisão, temos informação de qual sua massa e de qual lugar de dentro do carro ele saiu”.

Veja que isso é exatamente o que acontece em aceleradores de partículas como o famigerado LHC (Grande Colisor de Hádrons). Porém, queremos detectar coisas muito menores que peças de carros, como o Higgs, o que faz com que ele funcione com uma energia muito maior que a da escala de uma batida de carro. Fazendo uma conta rápida e simplificada, gasta por segundo em energia elétrica a mesma quantidade de energia de 20 Camaros amarelos batendo a 300 km/h.

Pausa para a curiosidade inútil do dia: um dos experimentos que fizeram parte da descoberta do Higgs se chama ALICE (A Large Ion Collider Experiment).

E assim, em meio a batidas e explosões, chegamos ao gato Cheshire, mas o caminho que vou seguir a partir daqui será decidido no próximo texto, espero que eu não perca a cabeça ao final dele.


Armando Fernandes da Silva Físico, apreciador do caos e lider da gangue dos niilistas.