Continuando minha inglória missão de levar notícias tristes para todos. Sinceramente acho que com esse tema passou o tempo de meias verdades ou histórias pela metade para atenuar nossa culpa. Depois de concluirmos que o ano passado (2015) é, mais uma vez, o mais quente da história – e de termos projetado que 2016, surpresa, quebrará esse recorde, pesquisadores do Instituto Potsdam para Pesquisa em Impacto Climático afirmam que há apenas 0,01% de chance que isso tenha acontecido por conta de variações climáticas naturais.

Fonte: cliamatecentral.org

Lista de outubro/2015. 2016 já tem a expectativa de ser ainda mais quente. A Organização Meteorológica Mundial afirma que 15 dos 16 anos mais quentes registrados aconteceram depois dos anos 2000. Você consegue ver algum padrão aí?

Uma explicação sobre causas naturais e antrópicas (resultantes da atuação humana)

Os (poucos) cientistas que ainda advogam que mudanças do clima são causadas por ciclos naturais apontam que a Terra já foi mais quente e/ou fatores como a atividade solar, a atividade vulcânica, variabilidade natural da temperatura dos oceanos (como o El Niño) seriam mais preponderantes nesse ciclo que a atividade humana. O que tais hipóteses falham em explicar é:

  • Ciclos de Milankovitch: era uma vez um sérvio que, vivendo no pacato império Austro-Húngaro do entreguerras, conseguiu se tornar matemático, astrônomo, engenheiro, geofísico e… climatologista. Olhando o movimento, inclinação e outras características de nosso querido planeta, Milankovitch determinou um padrão climático que, dentre outras coisas, conseguia estabelecer longos ciclos de “eras do gelo”. Seguindo sua hipótese, a Terra, nesse momento, deveria estar esfriando, e não esquentando. E assim o estava até padrões pré-industriais, quando a lógica se inverteu.
Fonte: http://www.climatedata.info

Veja no gráfico que estávamos começando a descer…

  • Impressões do carbono: há três isótopos diferentes na atmosfera. O Carbono 14 (14C), 13C e 12C. O de 14 é raríssimo e a proporção na atmosfera entre o de 13 e 12 é mais ou menos 1/99. Contudo, o carbono encontrado em plantas (e lembrando que petróleo/gás são, em essência, plantas muito, muito antigas – e não dinossauros) é ainda mais “leve”, sendo essa proporção cerca de 2% mais leve que na atmosfera. Ou seja, a partir de paleoclimatologia (se não sabe o que é isso, mais uma vez, ouça esse excelente podcast) é possível medir a proporção desses isótopos ao longo do tempo e verificar, por exemplo, que há uma mudança de 0,15% a partir de 1850 – em comparação, nos 10 mil anos anteriores, a mudança teria sido de 0,03%. Logo, o carbono na atmosfera é antrópico.

“One ring to rule them all”… não, pera

  • Taxa de O2 na atmosfera: outra forma bem interessante de chegar a essa conclusão é ver a taxa de O2 na atmosfera. Ora, a combustão fóssil necessariamente utiliza o O2 para ocorrer; cruzando a concentração dos dois gases nos últimos anos, há fortes indícios que demonstram a causalidade de aumento CO2 e da diminuição do O2 na atmosfera e nos oceanos terem a mesma causa, além de qualquer ciclo natural.
  • Velocidade de aquecimento: a Terra já foi mais quente e já foi mais fria. Ninguém disputa isso. Mas o ponto é que, com exceção de eventos catastróficos (estou falando aqui de uma mega erupção vulcânica ou um meteoro), nenhuma dessas vezes foi tão rápido quanto agora. Sim, a inferência direta a isso é: nós somos um evento catastrófico.

Oi. Meteoro atingindo a Terra.

Essas são algumas das muitas explicações possíveis para refutar tais hipóteses. Isso quer dizer que já sabemos tudo sobre mudança do clima, que os modelos climáticos são infalíveis e a destruição e um reino de caos é tudo que nos resta? Não, claro que não. A infalibilidade é algo inerente às religiões, não à ciência, e muita, muita água ainda passará por baixo dessa ponte. Previsões serão frustradas e números ajustados. Não se surpreenda se os climatologistas forem ridicularizados por falta de evidência/previsão/conspiração ou seja lá o que for. A ciência tem de ser submetida a um recorrente teste de si para que possa, de fato, nos aproximar das muitas verdades do mundo.

Mas o que podemos concluir com as informações que temos, com os modelos que utilizamos e com o conhecimento que acumulamos é que o mundo está ficando mais quente e a interferência humana nesse processo é uma verdade. Dezembro passado, representantes de todos os países do mundo concordaram com essa verdade e, ainda que não tenham avançado muito em propostas de superá-la, estabeleceram metas ambiciosas para serem nosso norte.

A responsabilidade humana sobre o clima está dada. Ações individuais pouco importam se comparadas ao todo (“Por que você está reclamando do meu carro quando aquele caminhão emite muito mais poluição?!”), mas não nos esqueçamos de quem constitui e para quem servem Estados, empresas e instituições: nós, indivíduos.