Com a crescente preocupação com a redução de emissão de carbono na atmosfera, os carros elétricos estão despontando como alternativa mais ecológica. Mas será que são mesmo?

Falando do carro em si, a principal diferença entre o carro movido a combustão interna e o elétrico é, obviamente, o combustível. Enquanto os automóveis movidos a combustão interna possuem um tanque para armazenamento de combustível (que na grande maioria das vezes são combustíveis fósseis, com poucas exceções, como o etanol no Brasil), os carros elétricos possuem uma bateria, geralmente de íons de lítio.

Essa “pequena” diferença faz com que carros elétricos sejam:

  • Mais silenciosos (ponto positivo, ao menos para mim);
  • Menos poluentes, já que não há queima de combustível e nem emissão de CO2 (ponto super positivo);
  • Mais caros (ponto negativo);
  • Mais demorados para abastecer, podendo a recarga variar de meia a uma hora em postos próprios ou até 8 horas em casa (ponto negativo).

Eu não vou me estender aqui falando da eficiência de um carro elétrico porque este não é o meu intuito, mas quero citar uma matéria de 2016 que compara o custo para um Nissan Leaf e um Ford New Fiesta rodarem 150 km. Segundo a matéria, para rodar essa distância, o Nissan Leaf gastaria 18 kW e o Ford Fiesta, 13,6 litros de gasolina. Adaptando os cálculos da revista para valores tarifários mais recentes e correspondentes a Jundiaí (cidade onde eu moro), na semana entre 10 e 16 de dezembro de 2017, quando a gasolina custava em média 3,937 R$/L e a energia 0,466 R$/KWh, eu teria um gasto de, aproximadamente, R$ 8,39 a mais na minha conta de luz ou R$ 53,54 nos postos de combustível jundiaienses. Bem barato esse carro elétrico, não é? Porém, ainda temos o problema da autonomia e da falta de infraestrutura nas cidades e estradas para que um carro desses possa se popularizar de vez (os locais para abastecimento, especialmente em estradas, ainda são poucos). Sem contar o preço altíssimo para a compra do veículo. Aqui no Brasil, por exemplo, não se encontra um modelo que custe menos que 100 mil reais.

Mas o que eu gostaria mesmo de falar é sobre o que move esse carrinho bacana e amigo do meio ambiente. É possível ser tão amigo assim consumindo energia elétrica? O aumento do consumo de energia nos traria alguma consequência? E será que o carro elétrico nunca vai ser considerado emissor de carbono mesmo?

Se nos basearmos na média de consumo energético de um carro elétrico, temos que o gasto de energia poderia aumentar em 40% no Brasil se mais de 90% da população aderisse a esse tipo de veículo. Então seria necessário que aumentássemos também em 40% a produção energética do país para que não fosse necessário algum tipo de importação, certo? Guardemos essa informação para reflexões mais adiante.

Ainda nos baseando na média de consumo energético de um carro elétrico juntamente com o percurso médio do brasileiro, o incremento na conta de luz mensal seria de aproximadamente R$ 60,00, o que seria benéfico para o bolso do proprietário, como já comparamos acima. Mas esse valor só vai ser verdadeiro se estivermos com a bandeirinha verde. Vocês lembram que temos cores diferentes de bandeira na nossa conta de luz? E, mais importante, vocês lembram o que significam as benditas das bandeiras? Se não lembram, a figura abaixo vai ajudar a lembrar:

Bandeiras tarifárias utilizadas na cobrança da nossa energia elétrica (Fonte: CPFL)

Ou seja, quando estamos com pouca chuva e o nível dos reservatórios está baixo, usinas termelétricas são acionadas para economizar água. Para seu funcionamento são usados combustíveis como carvão, gás natural, óleo combustível e diesel. Ou seja, há um aumento da emissão de carbono para a atmosfera com a ativação dessas usinas. Então, o veículo movido a essa energia produzida de maneira poluente, já não pode ser considerado um veículo 100% não poluidor, não é mesmo?

Pois é exatamente a essa conclusão que se vem chegando no mundo todo. Em países como a China, em que a maior parte da energia elétrica é gerada da queima do carvão mineral, o carro elétrico pode ser considerado mais emissor de CO2 que os movidos a combustão. Em contrapartida, em países abastecidos por energias tidas como limpas, como é o caso da energia nuclear na França, os automóveis elétricos emitem realmente zero.

Mas que beleza! Então é possível que essa nova tecnologia seja realmente benéfica? Claro que sim, mas não isoladamente. Diversos países da Europa apresentaram metas ambiciosas para reduzir as emissões de carbono drasticamente nos próximos anos e uma das medidas citadas foi justamente a adoção de carros elétricos e proibição de carros com motor a combustão em poucos anos (Holanda e Noruega pretendem abolir esses carros até 2025, enquanto Alemanha e França estabeleceram prazos até 2030 e 2040, por exemplo). Porém, como eu disse, esta foi UMA das medidas, e com ela já vem o problemão da geração de energia. Se ela não for limpa, ainda teremos emissão de gases poluentes.

O mesmo dilema precisa ser estudado no Brasil, afinal, a maior demanda energética que eu citei lá em cima pode significar mais uso das fontes de energia poluidoras como as usinas termelétricas, caso não se invista em energia limpa.

E o que é energia limpa? Ao contrário do que se possa pensar, energia limpa não é aquela que não gera impacto (infelizmente ainda não desenvolvemos nenhuma desse tipo), mas é aquela cujo impacto sobre a natureza é menor, não contribuindo para a poluição em nível global. No próximo texto eu vou abordar direitinho todos os tipos de energia conhecidas como limpas e explicar qual o nível de impacto de cada uma, bem como o que os países estão fazendo para deixar de usar fontes de energia não renováveis e ainda sim aumentar sua produção energética, de forma a suprir a nova demanda que está surgindo com os automóveis elétricos.

Antes de finalizar, gostaria de lembrar de um problema muito grande e que não pode ser ignorado nos carros elétricos: a bateria. Sim, o coração desse veículo é uma fonte de poluição e possui vida útil relativamente curta se compararmos com quanto tempo geralmente dura um carro. Mas é claro que um tema tão importante não ficaria só com um parágrafo ao final do texto, né? Aguardem os textos seguintes porque ainda teremos bastante discussão sobre essa tecnologia por aqui.


Bruna Santos Biotecnologista, mestre em microbiologia do solo, que tem vontade de ser agrônoma, mas que está virando engenheira química. Apreciadora de cultura inútil, amante de filmes musicais e grande observadora do comportamento de seus dois cãezinhos. Não consegue fazer faxina sem ouvir um podcast.